"No débito,por favor".
Quando eu era criança,achava que ser mãe era a única ocupação das mulheres, até o dia em que li um gibi da Turma da Mônica,no qual havia uma tirinha, em que as mães de cada personagem iam trabalhar.Cada uma com sua pasta de trabalho nas mãos, suas roupas elegantes, seus cabelos presos e sapatos de salto alto. Essa tirinha, me fez entender ,o que hoje chamamos de “empoderamento feminino”.
Calma caro leitor,esse não é um texto feminista, é um texto que versa sobre o mundo da mulher, que por sinal,por anos foi castrado por uma sociedade patriarcal. Ops! É ,ele é um “texto feminista”.
Acredito,que não há um papo de mulheres, em que não conversam sobre o assédio do colega de trabalho, as indiretas de cunho sexual do patrão, as tentativas de justificar estupros,em função da saia pequena ou do decote “ousado”. Conversas sobre o fato de haver mulheres em obra de construção civil, gerentes,psicólogas, mestres de obra, motoristas de transporte público, e tantas outras profissões que eram consideradas “profissões masculinas”, mas que hoje, estamos provando que pode ter, também, a participação feminina.
Entre tantos assuntos que proseamos, tenho certeza que o melhor de todos,é aquele que surge no fim da conversa, o pagamento da conta! Como assim? Vamos um pouco mais fundo nessa questão. Imagine essa cena:
Uma mulher levanta-se ,às seis horas da manhã, provavelmente,não querendo acreditar que está com as unhas descascadas e que é bem possível que sua menstruação lhe dê “bom dia”. Pois bem, ainda assim, ela se levanta, toma seu banho, durante esses momentos que ela tem – sozinha – lembra-se de suas tarefas: levar o filho na escola, fazer compras no supermercado, visitar a mãe, fazer a janta, revisar a aula do filho, cuidar do marido, limpar a cozinha , e dormir. É uma cena bem comum,sim.
Agora,imagine, que essa mulher,ao invés de seus “fazeres domésticos” , tem uma empresa para lidar,ou quem sabe está indo para mais um dia de trabalho como motorista, de repente ela tem uma grande obra de construção que precisa ser concluída. Quem sabe ,seus alunos estão ansiosos por sua aula. Pode ser que sua palestra,como “coach”, fará uma grande diferença na vida de alguém que tem um sonho ,mas,não tem coragem de apostar nele. Pode ser que essa mulher, seja imbatível na arte de “fechar” um contrato,uma venda,um imóvel, um financiamento no Banco. Talvez ,ela seja a melhor na limpeza de uma casa, e por isso resolveu limpar a casa dos outros, e leva sua vida com muito orgulho,sendo faxineira, diarista, empregada, mesmo sabendo, que ao chegar em casa, ela terá que fazer o mesmo serviço , ela não sem importa, porque sabe que isso é o seu sustento.
E o que essa mulher quer,afinal de contas? Simples,ela quer ser valorizada, não apenas por saber que é tão capaz quanto um homem, de chefiar uma casa, uma empresa, um país, enfim, de chefiar a sua própria vida.
E o que isso tem a ver com o fato de pagar a conta ,no fim da noite? Independência!
Já reparou que é cada vez mais comum, por exemplo, um barzinho ,ou restaurante, com uma presença forte de mulheres? Repare bem, mesas ficam floridas nos fins de tarde, com a presença feminina, nos encontramos após um dia de trabalho, ou um dia árduo de estudos, há aquelas que se dão um descanso dos filhos,da rotina de mãe/esposa, há aquelas que rezam pra bater o ponto na trabalho,só pra chegar a tempo do primeiro brinde. Para as que apreciam uma cerveja,não há nada mais prazeroso do que limpar o espuma com a língua. Por fim, aquelas que se satisfazem com um suco, ou a carne , a caipirinha, o amendoim, não importa.
O importante é , que no fim da semana, elas estão ali, com ou sem a permissão de uma sociedade(ainda)conservadora. Com ou sem um “corpo padrão”, em função de sua genética , ou pela opção da maternidade,ou por não ligarem para padrões ,que não definem quem elas são. Mesmo que não tenham mais os seus vinte anos, ou as certezas de um grande amor. Ainda que sejam mães solteiras, mulheres divorciadas,viúvas ou deixadas por seus companheiros,por motivos injustificáveis. Ainda que tenham muitos leões para domar e muitas serpentes para driblar.Ainda que no fim do dia, sua mente esteja mais cansada que o seu coração. Ainda que sua alma esteja mais calejada que os seus pés. Ainda que a sua maquiagem não esteja impecável,ou que seus sapatos tenham sido trocados por tênis usados. Ainda que seja só um “corpo”, sentado na mesa,lembrando de suas obrigações para mais uma semana de labuta. Ainda assim…
Porque ,no fundo, não importa o quanto ainda tenhamos que lutar, o primeiro passo foi dado. Quando mulheres entraram para a história,queimando seus sutiãs em atos públicos, ou sendo queimadas vivas naquela fábrica. Quando foram à luta, por direitos de voto. Quando decidiram ser escritoras,artistas, quando decidiram ser protagonistas do primeiro beijo na TV, do primeiro nudismo nas praias, e tantos outros exemplos de coragem e sede de mudança.
Quando,enfim, decidiram ser protagonistas e escritoras de suas próprias vidas. Foi nesse momento ,que aprendemos o quanto é bom pagar a nossa conta!
“Ei garçom! Mais uma rodada,por favor”.
Luciana Tapajós.