Deleito

Oh, papel em branco, porque me torturas, queria ver-te espraiado de belas palavras. Metáforas, hexâmetros dactílicos, versos alexandrinos, quiçá, ao meu desejo, o belo e sublime tomassem a ti, como Febo agarrastes a sua amada.

Eu lamento minha falta de figuras literárias, formei-me na dor e não possuo nenhum título de literato. Apenas sou uma mosca, apesar de voar sobre a carne fétida, ainda assim sou uma mosca. Esta não deseja ser nada mais que já é. Ser esquecida sua sina, tornar-se pó. Sua alma flutua, ela possui adornos muito belos, é grande, bela cercada de lodo e podridão. Mas, quanto mais busca o belo e sublime, mais se enterra no lodo, acostumando-se com ele.

Vi-me doutor sentado atrás de uma irrequieta mesa de mateira, com belos pés, cercado com os melhores e únicos companheiros agradáveis: os livros. No entanto, encontro-me em mesa torpe, sujo de pó de giz e circundado por corpos vazios, que, somente, sabem serem corpos.

A animosidade, introjetada em invólucros vazios, é regurgitada na forma de egocentrismo exacerbado, Narciso ficaria admirado com as novas gerações. O falo perdido, o totem caído e o anjo impelido para o progresso. Este é inevitavelmente o retorno do regresso, o presente é a ponte irreversível ao futuro, não menos doloroso e mórbido, pois, já no início, nascerá de ventre podre.

Encontrei a paz na própria dor de viver, a felicidade estranha-me de mim mesmo. Acostumei-me a permanecer na devassidão de meu subsolo, entrares aqui, não queiras e nem me perturbe para que saí. Nas minhas últimas viagens conheci a Rússia do século XIX, a Irlanda e suas masturbações, caminhei por Paris e por suas perversões. Vi mulheres tisicas verterem sangue, como as fontes de fogo ao descer a estrela da manhã.

O trabalho sustenta o corpo e degrada alma, sair do subsolo não é mais necessário aqui encontro tudo que eu preciso. Atualmente, devorei um Joyce. Estou alimentando-me de papéis, procura encher o corpo vazio de vida, a alma se desprendeu de suas raízes e paira no ar, poucas vezes atentando-se aos problemas profanos. Ela é o Nume, A Moratia, ao mesmo tempo, a ave de Minerva.

Os civilizados matam-se como animais ferozes, os bárbaros fazem amor. Quero afundar-me, ainda mais, no pântano de nossa humanidade, daquele lugar rir de todos, a minha luz brilha somente para mim, por isso somente em mim e para mim ela é luz. Não procurem a sabedoria onde ele migrou, saiu do cerne de nossa civilização e retornou para casa. Roma caiu e com os seus escombros fomos esmagados, o carpinteiro ilegítimo armará outra cavalo de Troia, a cultura Grega embarcar na Stultifera navis.

Poetas cantaram os tempos de fezes, eu já estou mergulhado nele, olho o de dentro, do seu ventre ao seu exterior. Eu lhes apresento todo meu sofrimento, a torpeza das moscas que flutuam pela Razão.