Pormerones /cap VII

 9:20hs. De volta a Rua da Abolição, não parava de pensar naquela manhã quase, surreal, diferentemente de qualquer outra já vivida. 

 No cruzamento entre a Glicério e Uruguaiana, resolvi deixar o restaurante para depois e segui direto para a Tv. Jorge Norton, que fica numa curta distância à pé daquele ponto.

 Uma rua em especial que ficou conhecida pelos amigos daquela época, como, Rua Antiga, por se tratar de uma pequena travessa constituída por paralelepípedos e de ser o ponto de encontro da turminha. 

 Localizada no coração de Campinas entre as ruas Dr. Quirino e Luzitana.

 Ao deparar-me com aquela visão, desoladora, nada condizia com o lugar em questão, a casa onde morei, a casa da Luciana (Lú), do Marcel, Sidney, já não existe mais, só o que restou foram as pedras daquele velho chão em que passavamos todas as tardes brincando de Taco (Bets), entre tantas outras. 

A única que continuavade de pé, intacta, era onde André (Bibi) morava, também pudera, não iriam destruir um prédio para construir outro. 

Passei para a calçada oposta a que estava, buscando uma melhor visão.

 Olhei para a janela do quinto andar...Nada é fácil de entender, teimoso que era, André, continua a jogar as pedrinhas do seu aquário, tentando acertar as pessoas que passam em baixo.

 Acho que ele ainda não aprendeu com o último castigo dado por sua mãe, Dna. Cidinha, que lhe rendera, uma semana sem descer para brincar.

 As brincadeiras em certo momento ficaram chatas, até o Taco estava sem graça, mesmo tendo os outros amigos para brincar, parecia que algo nos faltava, faltava o amigo André, a amizade daquela turma era forte e verdadeira,

 É penoso pensar que se acabou o que ali existia, mas não uma história de encantos, sonhos e alegrias de uma criança que ficará guardada por toda vida.

E, só quando então, assim chegar, saltando da memória, estes bons momentos de pura ingenuidade e da inocência de um bem querer, deveras, cairá as lágrimas a escorrer pela face, agora um tanto sombria, de saudades deste lugar em que o tempo sepultou.

Negar, negar já não posso, pois tomado pela ardência do fogo da alma a dor desta lembrança, é por essas e outras, que a vida vale cada segundo.

 Distanciando-me daquele local que agora, tampouco sem graça, sem crianças a brincar ao sol, aquele mesmo sol de antes, tentando aquecer as sólidas e frias torres de concreto, continuei meu caminho em direção ao restaurante.

A cidade está toda florida, Campinas também é chamada atualmente por seus conterrâneos de 'A Cidade das Flores', e a espécie que mais se encontra são os Ipês.

'Seus nomes tanto científico quanto popular, vem do tupi-guarani: ipê, que significa  Árvore de casca grossa.'

E é nesta época do ano, que as flores coloridas dão o ar de sua graciosidade embelezando e exalando seus perfumes pelo caminho por onde passo. 

 Passando em frente ao Mercadão Municipal, já havia me esquecido de como é imenso este lugar, além de sua arrojada construção arquitetônica, abriga dezenas de mini-lojas de produtos alimentícios nacionais e importados.

Quantas coisas não se encontram neste lugar, são tantas as especiarias e de iguarias infinitas que, para alguns, é considerado um santuário de exóticos sabores e de finos paladares.

 A qualquer hora do dia, ferve de pessoas como fosse um formigueiro, mais ainda num sábado, todos tentam aproveitar ao máximo enquanto a cidade esta aberta. 

 Le Bistrot, de fronte a entrada principal, um grande luminoso traz o nome do restaurante, caminhei até o balcão onde uma moça de touca e avental pulia os talheres e cristais.

- Olá, bom dia! Disse amigavelmente.

- Bom dia, em que posso ajuda-lo! Disse ela prestativa.

- Por favor, gostaria de falar com a...

   Enfiando a mão no bolso, retirei um pedaço de papel em que Hosni, havia  escrito alguns dados sobre o restaurante.

  - É... Sra. Julie Marston, por favor!

  - Ah, sim, só um minutinho, se quiser aguardar naquela sala, fique à vontade!

  A moça, apontou-me em direção a uma pequena sala com uma mesa de madeira oval e algumas cadeiras bem confortáveis. 

 Acomodado, esperei quase vinte minutos, agora sei por que das cadeiras tão confortáveis!

  Tamborilando os dedos à mesa e com os joelhos que não paravam quieto, surgiu por detrás pedindo desculpas por aquele atraso.

  Estendendo a mão, se apresentou como sendo Julie Marston, proprietária e chef de cozinheiro. 

Levantei-me, e, de igual gesto, apresentei-me. 

  De estatura mediana, corpo bem franzino que parecia que ía se quebrar, como um Bibelo, uma boneca de porcelana de tão delicada que é, olhos claros, cabelos curto escuros, usava um jaleco de um tecido grossíssimo, colarinho alto, sem falar que haviam mais botões naquela vestimenta, que no próprio uniforme de um soldado britânico. 

  Diferentemente de sua aparência delicada, seu aperto de mão continha todos os traços de uma mulher forte e determinada. 

   No final daquela entrevista, que não durou mais que o tempo por espera-la, ficou bem claro que a necessidade por alguém já experiente era de extrema importância para o cargo em questão, mas que, se realmente tivesse interesse em aprender aquele ofício, talvez, teria uma chance num outro restaurante que tinha em sociedade.

  Obviamente aceitei tal proposta.

  Pegou uma caderneta e um lápis, fez algumas anotações, entregou-me e delicadamente disse:

  - Segunda-Feira, procure pelo Sr. Marcos Villela, neste endereço.

Peguei o papel e agradeci gentilmente.

 Ela sorriu, desejou boa sorte e se foi.

 Até que não fora de tudo um mal. 

 Pensando bem, Hosni, com certeza havia falado a meu respeito, aquela pequenina moça, nem se quer tutibiou em dar referência de trabalho de um estranho para um conhecido, afinal, Campinas não é nenhuma Bastos, onde todo mundo se conhece e que se indica.

   O mais importante, é que tinha conseguido uma chance de emprego, e já estou prevendo um longo sábado e domingo de ansiedade.

-Continua-