O filho de uma mulher estéril
                                            (Joanina)


          1. Zacarias rezava no Templo, queimando incenso, quando o anjo apareceu, e disse: "Não temas, Zacarias, pois a tua oração foi ouvida. A tua mulher Elisabete dará à luz um filho para ti, e tu lhe dará o nome de João."
          2. Assim começa a história do nascimento de São João Batista, o Precursor. História que é contada por São Lucas, meu evangelista preferido.
          Não tenho muita certeza, mas me parece que Lucas é o único evangelista a narrar o nascimento do filho de Zacarias e Elisabete, ou Isabel como muitos preferem chamá-la.
          3. Está no Terceiro Evangelho que coube ao anjo Gabriel comunicar a Isabel e a Zacarias que Deus, atendendo o desejo do casal, lhes daria um filho; e que João seria o seu nome. A notícia era boa, mas deixou os dois visivelmente perturbados...
          4. No primeiro momento, diz a Bíblia Sagrada, Zacarias não acreditou no que Gabriel lhe comunicara. Atordoado, teria dito ao anjo: "Mas como isso pode ser possível? Tanto eu como a minha mulher somos velhos."
          5. Não consta que o virtuoso sacerdote tenha confiado ao emissário do Divino o que, para mim, seria o mais importante, ou seja, que Isabel, sua digníssima esposa, era estéril.
          6. Como não ficar, o justo Zacarias, assustado ao receber notícia tão estranha e preocupante?
          Deus que me perdoe, mas sempre considerei a reação do velho Zaca uma reação lúcida, lógica e sincera.
         7. Por isso, nunca concordei com o castigo que lhe foi aplicado; considerei-o, desde sempre, exacerbado. Vejam: impuseram-lhe uma mudez que durou até o dia do batizado do seu filhote. Pode uma coisa desta?
          8. Quanto a Isabel, não menos surpresa deve ter ficado ao ouvir de Gabriel que ela seria mãe. O certo é que, apesar de velha e estéril, Isabel engravidou; e deu à luz o santo dono da festa mais barulhenta e mais alegre da Igreja Católica. 
          9. Muito bem. Num desses papos joaninos com amigas maduronas, veio à baila a esquisita gravidez de Isabel. De uma delas ouvi sentidas queixas por não ter parido, por ser estéril. Mágoa que disse carregar "desde novinha"; agravada, ressaltou, com a sua chegada à confraria das coroas.
          10. Sabedora de que, nas horas vadias, perambulo pelas páginas do Novo Testamento, a amiga me interpelou a respeito da maternidade de Isabel, que achara maravilhosa mas "extremamente estranha".
          11. E fez a pergunta: "Como pôde isso acontecer, pô? Esteril? E eu aqui megulhada nessa frustração insana, apesar de ter transado a vida toda, alimentando o desejo de parir pelo menos um filhinho..."
          Não tive como consolar a irresignada coroa. e muito menos como justificar a gravidez de Isabel.
          12. Despedi-me dela com a frase que a gente usa quando não se consegue explicar o inexplicável: "Para Deus, nada é impossível."
          Mas sem lhe revelar que a sua (dela) indagação é a mesma que me atormenta nas noites de são-joão.
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 20/06/2016
Reeditado em 20/06/2016
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