O PÃO nosso de cada dia, nos dai hoje.

“O PÃO NOSSO de cada dia, NOS DAI HOJE”. Não são palavras do autor desta obra intitulada “Sem Título”. Isso mesmo, o título da obra é “Sem Título”.

Do jeito como muitas coisas desaparecem e nunca mais voltam em certos países de certas Áfricas, não quero imaginar para quando está reservado o próximo encontro entre o pão e o miserável cidadão.

O pão, em nossa humilde opinião, deveria ser um amigo de todos, um membro de todos os modelos de família, um ser sempre presente dada a sua importância, mas também sempre humilde e pronto para ser desprezado dada a sua abundancia.

“Quem não gosta de um pão quentinho logo pela manhã? O pão é em muitos lugares do mundo usado como sinonimo de vida e de trabalho, alimento do corpo e da alma. É parte da cultura de muitos povos e acarreta um significado muito importante em várias religiões.” Mas para certos países, o pão é hoje apenas sinonimo de muito trabalho, muito suor mesmo.

É que o pão miraculosamente mudou de regime. Enquanto ontem, o menino que mesmo vestido parece estar nu, habitante de uma casa tao linda, porém sem teto, sem chão nem paredes podia deliciar-se de um pão quentinho conquistado as portas das empresas que fabricam pães, nos restaurantes, ou ao lado das tias que vendem pães com mosca e carvão, la onde seria praça, no Camazingo, Caferro, Maringa, praça do peixe. Etc., hoje o pão, graças ao poder de um certo tipo de regime é propriedade exclusiva da classe dos burgueses.

Dizem por aí que o pão é um dos primeiros alimentos a ser preparado pelo homem. Este mesmo pão é sujeito principal de uma história tao antiga que fica difícil precisar de quando data a sua existência, embora alguns aventureiros da história tentem faze-lo.

Mas o facto aqui é o seguinte: do mesmo modo como custa e dói ao coração, à alma e ao cérebro perder um bem antigo como a primeira joia, a primeira guitarra, ou separar-se do primeiro bom companheiro, de igual modo, não queiram imaginar quanto custa a certas pessoas perder a intimidade com pão. Já quero imaginar daqui há tempos o pão tornar-se cada vez mais raro como o bolo-rei, o ovo da páscoa, enfim. Quem sabe dentro de anos comecemos a apagar as velas de aniversário num pão no ludar de um bolo dado a importância e o valor que o pão tomará em virtude do Kumbú, bufunfa, jabaculé, lombongo necessário à sua aquisição.

Parece-me que quando desaparece o pão é porque “estão reunidos os glutões, e nós, os pobres, somos a lenha da combustão”.

Quem se espantará com a quantidade de alimentos que vai aumentar? São os salalés com certeza. É bom estarmos preparados para começar a reaprender a morrer de fome numa cadeia de céu aberto cada vez mais independente e cada vez mais em paz, aqui mesmo neste rascunho de país.

E nós na fita? Presos e bem acorrentados nas garras do medo de desabafar, vamos comparticipando na elaboração de um mundo onde parece que o silêncio e o pacifismo enchessem barrigas ou como se fortuna fossem, com nada participamos para que algum dia possamos deixar este mundo um pouquinho melhor do que o encontramos. Eu tenho impressão que todos nós já assimilamos e aceitamos em nossas vidas a linda profecia: “o rico cada vez mais rico e pobre cada vez mais pobre.”

Rogo-vos a vós que sois pobres de pão, não afogueis as vossas dores em vinhos por escassez de pão. Pois bem sei que “o pobre prefere um pouco de vinho ao invés de um pedaço de pão porque o estomago da miséria necessita mais de ilusões do que de pão.” (Georges Bernanos).

Já mesmo em jeitinho de conclusão deste pequeno texto que depois de lido não moverá palha alguma no cérebro das pessoas deste rascunho de país quero solicitar o vosso optimismo na esperança de dias melhores porque sei que “a vida vale a pena mesmo que o pão seja caro e a liberdade pequena” conforme ensinaria Ferreira Gullar, e mesmo que sejamos “reclusos na prisão da fome” como diz o poeta imortal Fridoli Kamolãkawe.

Bem-vindos a nova Angola onde conseguir um pedaço de pão é uma vitória. Só peço-vos mais: que não nos esqueçamos de partilhar com quem tiver maior necessidade que a nossa, porque nada sabe tao bem como o sabor do pão partilhado. Lembrai-vos que Cristo foi o primeiro comunista ao repartir o pão e o peixe e ao transformar água em vinho, como pensa Fidel Castro.

Não é uma reflexão na busca de culpados que vos convido a fazer, mas se por acaso por causa da vossa curiosidade natural o fizerdes, imploro-vos que não culpeis o coitado do Satanás, pois ele não é mesmo o culpado. A minha preocupação é a seguinte: por quê nos inventaram esta crise de pão agora? Como estamos a lidar com ela? E fundamentalmente a seguinte: Que soluções para a escassez de pão sendo que maior parte dos angolanos matabicha chá com pão?

Luzingo MALEMBE
Enviado por Luzingo MALEMBE em 11/06/2016
Reeditado em 24/12/2023
Código do texto: T5663835
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