Desde que aposentei tenho usado pouco o transporte público. Até por conta das minhas atuais atividades, que exigem viagens constantes para outros municípios e estados, perdi um pouco o contato com essa formidável fonte de informação que o povão das ruas nos fornece.
Ontem, tendo em vista a necessidade de ir a um cartório numa cidade da Grande São Paulo, resolvi pegar um trem da CPTM. Eu moro em Mogi das Cruzes e tinha que ir até Barueri. Precisava fazer quatro conexões. Ir de Mogi á Guianazes, de Guainazes até a Luz, da Luz á Barra Funda e da Barra Funda até Barueri. Percebi que andar em São Paulo é muito mais fácil de trem do que de carro. Não gastei um tostão porque já tenho mais de sessenta e cinco. Trafeguei sentado a maior parte do tempo, embora em alguns trechos tivesse encontrado ainda alguns sem-educação que não estão nem aí para a lei que reserva assento preferencial para idosos, gestantes e pessoas com deficiência. Afora isso, foi uma viagem tranquila e proveitosa, pois pude observar as mudanças que São Paulo sofreu nestes últimos anos, coisa que a gente não consegue observar andando sempre de carro. Além disso pude ler quase inteiro um ensaio do Emile Durhkeim sobre as regras do método sociológico, livro que estava na minha estante há anos esperando o momento de ser lido.
Mas o melhor mesmo foi o contato com o povão. Não tem meio melhor de se informar do que beber dessa fonte natural que a gente das ruas nos dá. Lembrei-me do disse um historiador da vida medieval, se não me engano Malcon Barber, que nós pouco sabemos sobre a vida medieval porque os cronistas preferiam escrever sobre os nobres e suas aventuras e muito pouco sobre o povo. E é verdade. A nossa mídia também. O povo só é notícia que interessa á mídia quando alguém se envolve em uma tragédia qualquer. Um assalto á banco, um latrocínio bárbaro, a morte de um menino de dez anos, baleado por um policial, o estupro de uma menina de dezesseis anos, feito por mais trinta indivíduos, etc. O resto do noticiário é preenchido por assuntos político, fofocas sobre artistas, vida social, onde só aparece gente importante, análises econômicas, escândalos de corrupção etc.
Conversei com pedreiros que saiam de Ferraz de Vasconcelos para trabalhar em Itapevi; com diaristas que subiram em Guianazes para trabalhar em Jabaquara; meninos e adolescentes que vendiam balas, doces, pilhas, fones de ouvido, pent-drives e outras bugigangas e verifiquei que isso, pelo menos, não mudou muito. Eu também vendia amendoins e canudinhos de coco nos antigos trens de subúrbio da Central do Brasil, quando era moleque. A diferença é que hoje os trens são mais rápidos, mais limpos e mais modernos. Ninguém fica pendurado nas portas, nem as ficam segurando para não se fecharem, como naqueles tempos. As viagens são mais tranquilas. Os trens não são mais apedrejados. Dá para ler e conversar. Só não dá para dormir, pois se senão alguma coisa sua vai sumir. Naqueles tempos isso era mais difícil de acontecer.
Dá até para fazer alguma ideia do que realmente está acontecendo com a sociedade brasileira. A par de histórias de esforço, heroísmo pessoal, comprometimento e garra, com que o povo brasileiro está enfrentando esta crise pela qual passa o nosso país, há outras não tão meritórias, que nos dão algumas das razões pela qual estamos em crise. Uma delas é de uma jovem senhora que sentou-se ao meu lado num dos assentos reservados. Não tinha mais que vinte e cinco anos, pela aparência que demonstrava. Bem vestida, com seu celular moderninho na mão, sequer olhava para os lados, e pouco se dava se dava se havia idosos ou gestantes em pé. Ela fazia de conta que os olhares reprovadores das pessoas não eram para ela. Nem se mexeu quando me levantei para dar meu lugar para uma senhora que entrou em Itaquera. Ela permanesceu impassível, rolando para cima e para baixo a telinha do seu celular, preocupada mais com as mensagens que mandava e recebia. Fez pelo menos umas três ligações com o celular. Em um deles falou com alguém que estava indo para a Paulista participar de um protesto de estudante contra alguma coisa relacionada com merenda escolar. Marcou encontro com ela em frente ao MASP. Depois, em uma outra ligação, falou com outra pessoa (uma parente talvez), e avisou que antes de ir para a Paulista ia passar em uma agência da Caixa para reclamar porque a sua Bolsa Família ainda não tinha sido transferida para a agência de Itaquera, pois ela já havia requerido essa transferência há mais de dois meses.
A senhorinha a quem eu havia dado o assento devia ter pelo menos uns setenta. Estava indo trabalhar de diarista em um apartamento em Jabaquara. Ia até a Sé, depois pegaria o metrô até lá. Eu comecei a pensar naquelas pequenas multidões que se juntam para fazer protestos, todo dia, contra isso e contra aquilo. A maioria é composta por jovens como aquela moça do celular. Ou por pessoas como ela. E então conclui, não com certa amargura, que essa gentalha, que participa de torcidas organizadas e vive esperando jogador no aeroporto para bater neles quando o time perde o jogo, ou esses desocupados que vivem o dia inteiro participando de protestos contra isso e contra aquilo, tivesse que trabalhar, eles não teriam tempo para fazer as badernas que fazem. Alguém financia isso. Alguém paga para que esses vagabundos tenham tempo para pichar e depredar o patrimônio público e particular, interditar avenidas e azucrinar a vida dos cidadãos que querem trabalhar. No caso daquele mar de camisas vermelhas que enchem as ruas, quem financia são as centrais sindicais através do imposto sindical, excrecência jurídica que já devia ter sido banida das nossas leis trabalhistas. Esse imposto que só serve para sustentar vagabundos. E no caso das pessoas, como aquela moca, temos os penduricalhos governamentais, como as bolsas-família, que foram criadas com a finalidade de incentivar as famílias a mandar suas crianças para a escola e evitar que fossem para a rua em busca de recursos para sobreviver, como fazem esses meninos que vendem bugigangas no trem. Ao revés, acaba financiando vagabundos que, graças á essa ajuda do governo, vão engrossar protestos de rua, que são chamados por alguns de movimentos sociais.
Fora essas exceções condenáveis, criadas por uma ideologia que pensa estar promovendo o bem estar social degradando os indivíduos, tansformandos-o em verdadeiros vagabundos, nota-se que o povo brasileiro continua merecendo o maior dos respeitos. É um povo honesto e trabalhador, que não mede esforços para ganhar a vida com o sur do rosto. É pena que não possamos dizer o mesmo dos nossos políticos.
Ontem, tendo em vista a necessidade de ir a um cartório numa cidade da Grande São Paulo, resolvi pegar um trem da CPTM. Eu moro em Mogi das Cruzes e tinha que ir até Barueri. Precisava fazer quatro conexões. Ir de Mogi á Guianazes, de Guainazes até a Luz, da Luz á Barra Funda e da Barra Funda até Barueri. Percebi que andar em São Paulo é muito mais fácil de trem do que de carro. Não gastei um tostão porque já tenho mais de sessenta e cinco. Trafeguei sentado a maior parte do tempo, embora em alguns trechos tivesse encontrado ainda alguns sem-educação que não estão nem aí para a lei que reserva assento preferencial para idosos, gestantes e pessoas com deficiência. Afora isso, foi uma viagem tranquila e proveitosa, pois pude observar as mudanças que São Paulo sofreu nestes últimos anos, coisa que a gente não consegue observar andando sempre de carro. Além disso pude ler quase inteiro um ensaio do Emile Durhkeim sobre as regras do método sociológico, livro que estava na minha estante há anos esperando o momento de ser lido.
Mas o melhor mesmo foi o contato com o povão. Não tem meio melhor de se informar do que beber dessa fonte natural que a gente das ruas nos dá. Lembrei-me do disse um historiador da vida medieval, se não me engano Malcon Barber, que nós pouco sabemos sobre a vida medieval porque os cronistas preferiam escrever sobre os nobres e suas aventuras e muito pouco sobre o povo. E é verdade. A nossa mídia também. O povo só é notícia que interessa á mídia quando alguém se envolve em uma tragédia qualquer. Um assalto á banco, um latrocínio bárbaro, a morte de um menino de dez anos, baleado por um policial, o estupro de uma menina de dezesseis anos, feito por mais trinta indivíduos, etc. O resto do noticiário é preenchido por assuntos político, fofocas sobre artistas, vida social, onde só aparece gente importante, análises econômicas, escândalos de corrupção etc.
Conversei com pedreiros que saiam de Ferraz de Vasconcelos para trabalhar em Itapevi; com diaristas que subiram em Guianazes para trabalhar em Jabaquara; meninos e adolescentes que vendiam balas, doces, pilhas, fones de ouvido, pent-drives e outras bugigangas e verifiquei que isso, pelo menos, não mudou muito. Eu também vendia amendoins e canudinhos de coco nos antigos trens de subúrbio da Central do Brasil, quando era moleque. A diferença é que hoje os trens são mais rápidos, mais limpos e mais modernos. Ninguém fica pendurado nas portas, nem as ficam segurando para não se fecharem, como naqueles tempos. As viagens são mais tranquilas. Os trens não são mais apedrejados. Dá para ler e conversar. Só não dá para dormir, pois se senão alguma coisa sua vai sumir. Naqueles tempos isso era mais difícil de acontecer.
Dá até para fazer alguma ideia do que realmente está acontecendo com a sociedade brasileira. A par de histórias de esforço, heroísmo pessoal, comprometimento e garra, com que o povo brasileiro está enfrentando esta crise pela qual passa o nosso país, há outras não tão meritórias, que nos dão algumas das razões pela qual estamos em crise. Uma delas é de uma jovem senhora que sentou-se ao meu lado num dos assentos reservados. Não tinha mais que vinte e cinco anos, pela aparência que demonstrava. Bem vestida, com seu celular moderninho na mão, sequer olhava para os lados, e pouco se dava se dava se havia idosos ou gestantes em pé. Ela fazia de conta que os olhares reprovadores das pessoas não eram para ela. Nem se mexeu quando me levantei para dar meu lugar para uma senhora que entrou em Itaquera. Ela permanesceu impassível, rolando para cima e para baixo a telinha do seu celular, preocupada mais com as mensagens que mandava e recebia. Fez pelo menos umas três ligações com o celular. Em um deles falou com alguém que estava indo para a Paulista participar de um protesto de estudante contra alguma coisa relacionada com merenda escolar. Marcou encontro com ela em frente ao MASP. Depois, em uma outra ligação, falou com outra pessoa (uma parente talvez), e avisou que antes de ir para a Paulista ia passar em uma agência da Caixa para reclamar porque a sua Bolsa Família ainda não tinha sido transferida para a agência de Itaquera, pois ela já havia requerido essa transferência há mais de dois meses.
A senhorinha a quem eu havia dado o assento devia ter pelo menos uns setenta. Estava indo trabalhar de diarista em um apartamento em Jabaquara. Ia até a Sé, depois pegaria o metrô até lá. Eu comecei a pensar naquelas pequenas multidões que se juntam para fazer protestos, todo dia, contra isso e contra aquilo. A maioria é composta por jovens como aquela moça do celular. Ou por pessoas como ela. E então conclui, não com certa amargura, que essa gentalha, que participa de torcidas organizadas e vive esperando jogador no aeroporto para bater neles quando o time perde o jogo, ou esses desocupados que vivem o dia inteiro participando de protestos contra isso e contra aquilo, tivesse que trabalhar, eles não teriam tempo para fazer as badernas que fazem. Alguém financia isso. Alguém paga para que esses vagabundos tenham tempo para pichar e depredar o patrimônio público e particular, interditar avenidas e azucrinar a vida dos cidadãos que querem trabalhar. No caso daquele mar de camisas vermelhas que enchem as ruas, quem financia são as centrais sindicais através do imposto sindical, excrecência jurídica que já devia ter sido banida das nossas leis trabalhistas. Esse imposto que só serve para sustentar vagabundos. E no caso das pessoas, como aquela moca, temos os penduricalhos governamentais, como as bolsas-família, que foram criadas com a finalidade de incentivar as famílias a mandar suas crianças para a escola e evitar que fossem para a rua em busca de recursos para sobreviver, como fazem esses meninos que vendem bugigangas no trem. Ao revés, acaba financiando vagabundos que, graças á essa ajuda do governo, vão engrossar protestos de rua, que são chamados por alguns de movimentos sociais.
Fora essas exceções condenáveis, criadas por uma ideologia que pensa estar promovendo o bem estar social degradando os indivíduos, tansformandos-o em verdadeiros vagabundos, nota-se que o povo brasileiro continua merecendo o maior dos respeitos. É um povo honesto e trabalhador, que não mede esforços para ganhar a vida com o sur do rosto. É pena que não possamos dizer o mesmo dos nossos políticos.