Pano de fundo ou de prato
No início do século 19, o Brasil era um “imenso território virgem” com cerca de três milhões de habitantes, sendo um escravo para cada três brasileiros. Perto de dois milhões de negros cativos foram retirados de seus países de origem para “trabalhar nas minas e lavouras brasileiras durante o século 18”, conforme Laurentino Gomes em seu livro “1808”.
Nos dias de hoje, só a Turquia recebeu “mais de 1,8 milhão de refugiados desde o início da guerra civil na Síria, Iraque, Jordânia, Egito e Líbano”. Só que essas pessoas foram forçadas a deixar seus países em função de “guerras, pobreza, repressão política e religiosa”, dentre outros motivos, atrás de melhores condições de vida. Procuram a Europa, como qualquer outro país, não para ajudar no seu desenvolvimento ou para trabalhar como escravos para seus donos. Até porque as regiões procuradas, em sua maioria, já se acham desenvolvidas. E mesmo fora da Europa ocidental, como no Brasil, por exemplo, que também tem recebido refugiados, não existem as condições inóspitas que se verificam na Síria, Iraque, Jordânia, etc.
Acontece que esses refugiados, dentre eles muitos africanos, não são aceitos hoje na Europa sem qualquer restrição. Claro, eles não precisam ajudar no desenvolvimento dos países que procuram ou trabalhar em minas e lavouras eventualmente existentes. Isso já foi feito – e inteiramente pelos negros cativos – lá pelos idos dos séculos 18 e 19 nas regiões fornecedoras de riquezas e matéria prima para os europeus. Proporcionando a eles as invejáveis condições econômicas de que desfrutam agora, se comparadas às condições de vida nos países permanentemente sob conflitos bélicos.
O resumo da ópera é, portanto, o seguinte: precisou usou; não precisa, joga fora. O que agora não acontece, como é tradicional, apenas com os negros, mas também com pessoas de cor branca, ainda que não necessariamente arianos.
Rio, 04/06/2016