Um texto arretado

Adoro ler crônicas e quando me deparo com uma arretada gosto de compartilhá-la, mesmo sabendo que quase todos já leram. Mas não resisto, é uma espécie de compulsão:

O NOME DA SERPENTE

Luis Fernando Veríssimo

"Na sua peça The Coast of Utopia, 'A Costa da Utopia', Tom Stoppand põe na boca de Michael Kakunin um pensamento sobre a queda que condenou o Homem à infelicidade: 'Uma vez, diz Bakunin, 'há muito tempo, no começo da História, éramos todos livres. O Homem integrava-se com a natureza e vivia em harmonia com o mundo, e portanto, era bom. E então uma serpente entrou no Paraíso'.

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"Para o anarquista Bakunin, o nome da serpente era 'Ordem'. Matéria e espírito se separaram.'O Homem não era mais inteiro, era impelido por ambição, cobiça, ciúmes, medo. O conflito tornou-se condição de sua vida - o indivíduo contra seu viizinho, contra a sociedade, contra si mesmo - e a Idade de Ouro acabou', segundo Bakunin.A serpente trouxera a desoprdem. O Homem só poderia criar uma nova Idade de Ouro e tornar-se livre outra vez destruindo o quetinha destruído seu paraíso. A ordem.

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"Para um socialista, ao contrário, ordem - ou organização social - é o que salva o Homem da sua opior natureza. Evita conflitos e traz a harmonia,portanto não é um bom nome para a serpente.Já para um fascista, só a submissão a uma idéia e a uma autoridade integradoras traz a felicidade, ou a ordem no bom sentido. Como elogio, não como serpente. E para um liberal, se a serpente nos tirou do paraíso mas inaugurou o homem competitivo, então viva ele, seja lá qual for o nome.

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"Que nome merece a serpente? Acho que umbom nome seria 'precisão!'. Foi quando desenvolveram o dedão opositor e se tornou capaz de, primeiro, catar pulgas com mais eficiência e eventualmente esgoelar o próximoe fabricar e empunhar instrumentos sem deixá-los cair - enfim, quando se tornou preciso - que o Homem começou a sair do paraíso. Acabou a Idade do OPuro de inabilidade digital, que nos igualava aos outros animais e nos impedia gestos especualtivos, como o de segurar um cristal contra o Sol e ficar filosofando sobre a luz decomposta em vez de se integrar com a natureza como um bom bicho.

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"O dedão opositor estánas origens do arco e flecha, daí para o zíper e as centrais nucleares foi um pulo -no abismo. A nossa quedacomeçou pelo polegar.

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"Na mesma peça, o Bakuninde Stoppard consola um amigo, desesperado com as seguidas derrotas do seu ideal socialista pelo reacionarismo. 'A reação é apenas iluisão ótica do rio que parece correr para trás, quando o rio corre sempre para o mar, que é a liberdade ilimitada e indivizível!'. Um consolo para desesperados de todas as épocas".

Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 05/06/2016
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