Nossas casas, nossos modos...

NOSSAS CASAS, NOSSOS MODOS...

Nossas casas abrem-nos suas portas e janelas, dão-nos o fôlego da existência nos seus símbolos e nos preparam para enfrentar a vida e a morte fora delas.

Nelas podemos andar nus e livres dos pensamentos. São nossa proteção, mestras das nossas mazelas e vícios existenciais, aqueles que realmente ficam marcados no nosso âmago. Sua proteção é quase indecifrável. Enganam muitas vezes até os nossos mais profundos analistas. Fazem-nos construir discursos profundamente abstratos e irrecorríveis (será?). Os sonhos coloridos, apesar de coesos e fortemente guardados no inconsciente descem como correnteza aos nossos punhos e, pensando vê-los, conduzimo-los ao papel na mais absurda cegueira literária e psicanalítica. Mas é assim mesmo que deve ser a vida. O escritor se expõe inocentemente. Seu pecado é privar-se disso e querer ser escritor dos seus próprios subterfúgios. Seu único leitor.

Lá fora, nas outras casas por onde sempre andamos, brigamos e sorrimos para sobreviver. Somos miseráveis aventureiros que dançamos o baile da vida apanhando e batendo. Agora, fora do nosso ninho, nem mamãe, nem papai, mas simplesmente o mundo: alegre, triste, solitário, fiel, infiel, pleno, cheio, a depender do momento em que nos acharmos.

Portas novas abrir-se-ão para nós. Juntos veremos novíssimos e belos horizontes. Temos que prová-los dele, sem a gulodice da loucura da vida moderna, mas na santa calma que podemos construir vivendo. Saibamos que viver é construir valores, sem esquecermos nossas próprias identidades que nos chegam espelhadas no que fomos em nossa primeira “casa”. O pé deixado lá jamais sairá. O outro, esse andará pelas searas da vida carregando e sendo carregado a depender de onde estivermos em dado momento de nossas vidas.

Mas o bom é isso. Enfeitemos nossos vazios com nossas boas existências. Driblemos os jogos frívolos da alma. Acendamos o nosso jogo devorador do desconhecido, mas... nunca deixemos de apalpar a precaução, sem endeusá-la, é claro! Nem todos vencerão. É o fruto do jogo da sobrevivência. Uns terão tanto, outros tão pouco, mas ninguém terá mais amor ou mais saudade do que o outro, se todos amarem em suas formas e lembrarem-se de sua primeira janela e de sua primeira porta. Os palácios suntuosos, os banquetes homéricos, os vôos exuberantes, as festas explosivas, nada disso é nada! O sensato é jogar, sem virar o tabuleiro. Jogo é jogo, mas quem joga tem que ter vergonha na cara! Admitir a derrota é vencer o jogo também, ser responsável por seu resultado e não só apreciá-lo de longe, sem sentir vontade alguma de jogar.