Este rosto
Que estranho cartão de visita carregado de expressões que nenhuma palavra poderia definir com precisão. Cartão de visita, porque é aquele primeiro quadro, o exposto na entrada da galeria dos seres; e estranho, pois é formado pela falta de simetria que qualquer não tão bom perfeccionista consegue notar. Uma olhada no espelho, um mínimo reflexo numa fachada de vidro, ou a simples imaginação comparando o próprio com outros quadros que cruzam o caminho todos os dias e pronto, o julgamento está feito e muito bem feito a ponto da imaginação tecer seus próprios devaneios. E que rosto poderia ser o quadro mais simétrico? Quais traços se encaixariam perfeitamente no meu?
O nariz, a primeira parada deste que vos escreve, é certamente um ponto de mudança; diminuí-lo, talvez, desentortar o topo para que os óculos se assentem. Livrar-se da pinta acima da boca e da metade da barba que insiste em encravar. Deixar a covinha no sorriso um tanto menos enrugada e os olhos e a testa sem as linhas de expressão que já querem aparecer. Mas talvez todo o restante atrapalhasse também, quem sabe. O tamanho da cabeça precisaria de modificação se pensarmos bem, além de que a largura da boca e dos olhos que pareciam adequadas, já não serão tanto. O novo nariz pequeno deixaria o espaço do rosto mais vazio e as orelhas iriam querer ficar mais abanadas e chamativas como que para garantir a nova luta pela simetria. Mas que quadro incerto então... Em um momento aceitável e noutro, de dar pena. Por via das dúvidas, que se escondam todos os espelhos.