HOMEM CERTO NO LUGAR CERTO
No armário havia a cópia de um processo e de um bastão de madeira, que estava quebrado quase ao meio. Ambos dentro de envelopes pardos, já manchados pelo tempo e presos entre si por um pedaço de barbante. O envelope do bastão já aderira a forma de canudo pelo constante manuseio.
Das explicações do antecessor que me precedera no cargo de secretário não vieram muitos esclarecimentos, tão somente que já houvera tentativas de esclarecimentos através de indagações firmadas em documentos e inseridas no envelope.
Do Comandante veio a recomendação:
- Leve o documento pessoalmente e aguarde uma resposta!
Tudo pronto, dias depois segui destino e no início da tarde de uma segunda-feira fui até a direção do IPF. Relatei a minha necessidade à secretaria e ela disse que eu esperasse alguns minutos que o Diretor já estaria chegando. Não tardou e ele passou pela antessala cumprimentando-nos e já arguindo-me se eu queria falar com ele. Respondi que sim, então ele disse:
- Pode passar tenente! – Na ocasião eu estava fardado. Andávamos fardados, mesmos sozinhos e utilizávamos o transporte coletivo.
Nem bem entramos na sala e entraram vários assessore munidos de papeis. Cumprimentavam o Diretor e colocavam a papelada numa caixinha de entrada de documentos. Dois ou três permaneceram na sala. Um cafezinho tenente? Perguntou ele. Não senhor, respondi e já fui declinando do motivo de estar ali. Senhor eu trabalho no Segundo Batalhão da Brigada Militar e gostaria de saber da situação de um integrante do batalhão que está recolhido ao Instituto Psiquiátrico Forense. O nome dele é Edvino de Tal.
- Ele está muito bem, podes verificar pessoalmente. É este rapaz que está sentado na sua frente.
A conversa espichou-se um pouco, refis mentalmente a minha demanda e ele deu-me um ofício informando da situação dele.
Edvino que era soldado, lá por 1970 havia descumprido uma ordem do sargento da patrulha, da discussão ele agrediu o sargento com o bastão, depois de alguns golpes o bastão partiu-se, mas deixando algumas lesões e a compreensão da tentativa de homicídio. Julgado e condenado por isto, sobreveio o diagnóstico de doença mental, então a necessidade de cumprimento em estabelecimento especializado.
Depois de duas horas de conversa já estávamos funcionalmente íntimos e o Diretor brincou perguntando-me se eu via algum traço em Edvino de doença mental e complementando com a informação de que tudo estava sacramentado judicialmente e dentro do tratamento psicológico. Claro que não, tanto que ele paga suas contas, faz sua segurança pessoa, mas não posso duvidar do diagnóstico. Edvino era um homem magro, mas com mais de 1,85 m, não assustava mas impunha respeito, tanto que já buscara receber os fardamentos que lhe eram pertinentes e andava fardado para não pagar o ônibus e eventualmente cumprir algumas tarefas do IPF que assim exigia.
De volta a Rio Pardo, providenciamos na transferência dele para algum quartel de Porto Alegre.
Esta passagem verdadeira veio-me em sonho nesta madrugada, talvez pelas discussões dos últimos dias, sobre a falta de tête-à-tête. No sonho eu relatava para um amigo, justificando da necessidade de buscar soluções além do simples envio de papeis. Se eu não tivesse ido pessoalmente até o IPF certamente estariam enviando papeis sem volta.