A bolsa amarela
Hoje saí da escola dos meus filhos com um item mais, por empréstimo da biblioteca: A bolsa amarela. Quando eu nasci, minha mãe me enrolou em uma manta de crochê amarela, a mesma que usei para enrolar minha filha, na saída da maternidade, mais de três décadas depois. Do batismo, no qual só mergulhei aos quatro anos, paira intacta a imagem da vela acesa. Desde então, floresceram em mim diversos amores amarelos...Se flor, girassol; fruta, manga; grão, milho. Por astro, o sol; por casa, o ovo; por doce, o quindim. E continua pendurado no varal da memória o vestido de renda amarela usado pela menina, na festa do jardim. Na arquitetura, imobilizam meus olhos as janelas e portas amarelas das cidades históricas, com batentes em azul; na pintura, sempre já os girassóis de Van Gogh; nas bibliotecas, os livros amarelados de tempo. E, desde que fomos apresentadas, gosto mais da Chapeuzinho Amarelo, do Chico, que da versão em vermelho e louvo todos os dias a louvação para uma cor, de Adélia Prado, onde o amarelo furável engendra. Amolecem-me todos os mimos amarelos: marcadores de texto, envelopes para cartas e chá de camomila.
Não me contive, pois, em abrir A bolsa o que tornou inevitável a empatia imediata com Raquel e o desejo de ser dela correspondente. E pensar em pedir ao carteiro, de uniforme amarelo, que levasse a carta. Talvez por isso você não seja poupado. Do contrário, eu também precisaria achar um lugar para esconder minhas vontades, a mais ensolarada delas, a de escrever. Anoto, pois, mais essa página no caderno amarelo...o inventário das minhas fruições.