A DOCE VINGANÇA DA RAINHA
Então conta-se que a rainha resolveu ir à forra.
Todos aqueles que conspiraram para tirá-la do trono teriam o castigo merecido. Em especial o vice-rainha, que nunca jogou de fato no seu time, mas que devia ser o mentor intelectual do grupo.
Foram noites e noites sem pregar o olho, pensando como se vingar de cada um daqueles malditos. Nenhum deles ficaria impune, nenhum mesmo.
Até que ela tentou se aconselhar com alguns membros da côrte, mas resolveu que ninguém merecia um fiapo de sua confiança. Ninguém.
Pensou em tudo. Poderia subornar algum cozinheiro do reino pra envenenar o vice-rainha. Vê-lo agonizando nos seus últimos momentos seria a glória. Não, ficaria muito na cara que ela estaria por trás deste "acidente". Além do mais, não tinha um mísero cozinheiro daquele reino que se prestaria a colocar cicuta na coxa de cabrito que seu vice tanto apreciava.
Afrouxar uma das rodas da carruagem que o vice-rainha usava seria outra ideia. Ela poderia se disfarçar colocando uma peruca e cobrindo o rosto. De madrugada iria até a cocheira real e faria este serviço. Desistiu quando fez a conta do número de carruagens que têm lá. Levaria noites e noites para afrouxar as rodas de todas as carruagens, porque o infeliz usava cada dia um diferente. Sem contar que poderia afrouxar a roda da própria carruagem que ela fosse usar. Péssima ideia.
Matar o vice-rainha com uma flechada certeira. Poderia pegar um daqueles bandidos cumprindo pena no calabouço do castelo, entregar algumas moedas de ouro e prometer libertá-lo se tivesse sucesso na empreitada. Também não teria como descer as escadarias que conduziam ao calabouços sem ser notada. Seria arriscado demais.
O que fazer, ó céus, o que fazer? Está certo que ela se apropriou de boa parte do tesouro real. Como poderia saber que alguém notaria a falta daquelas moedas? Achava que se pegasse uma hoje, outra amanhã, ninguém daria falta. Também não foi uma rainha que os súditos amassem de paixão. Fez burrada atrás de burrada.
Foi assim que encontrou a solução para saborear a mais contundente e implacável vingança contra todos os crápulas que planejaram esta injusta armação - pela ótica dela, é claro.
Então a rainha resolveu ser honesta e eficiente nas atribuições que seu cargo prescrevesse. E nunca mais colocar no bolso uma moedinha que fosse e que não a tivesse merecido de fato. Decidiu, também, parar com esta postura de brutamontes que fazia com que as pessoas se borrassem nas calças diante dos seus berros e que faziam todo o reino tremer. Seria então uma rainha como aqueles livros de histórias infantis tão bem retratam: amável, doce, uma rainha dos sonhos de todos seus súditos. Uma rainha-modelo de retidão, de generosidade, de lisura.
Isso tirou o vice-rainha e seus assessores do eixo. Podiam imaginar o rio secar, a macieira dar romã, mas a rainha parar de meter a mão no tesouro real e tirar aquela máscara de megera era demais pra eles.
Assim, um a um, foram fugindo de lá, indo aportar num reino de mandante perverso, prepotente e ladrão, que é o mais tinha por aquelas bandas.
Então a rainha pôde, finalmente, saborear sua mais deliciosa vingança.
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