LIA, A ESTRELA
Noite fria no Norte do Paraná, típica de inverno londrinense, antecipado.
Precisávamos de aconchego e o encontramos bem no centro da cidade, ao lado da Catedral, junto à Biblioteca Pública, em frente ao Bosque. Sim, antigo e conhecido Teatro Zaqueu de Melo.
Entramos, subimos a escadaria e, além do aconchego de abraços, sorrisos e muita alegria.
Luzes apagadas, para brilhar a estrela. Entrou de vermelho, fez inveja à lua, que se viu eclipsada.
O sorriso adolescente é emoldurado por rosto de mulher, agora. Volta, porém, de imediato, à alegria da menina de longos e esvoaçantes cabelos, que andava depressinha nas calçadas da minha rua. Há na cantora uma facilidade enorme de transformação, indo da menina-moça à mulher, a depender de suas bem trabalhadas interpretações.
A voz é educada, macia, suave e aveludada. Nada de exageros interpretativos. Há a presença de notas sustentadas lindamente no prolongamento de sílabas, fluindo naturalmente, sem esforço e assentadas em vogais que nos vinham direto à alma. Uma delícia de canto, momento de casamento entre almas e corações.
Uma Pagu impagável com ar rebelde, tão versátil quanto, migrou de Rita Lee e Zélia Duncan para a voz de Lia. Ali estava Pagu, a irreverente modernista e libertária “pau pra toda obra... minha força não é bruta, não sou freira nem sou puta...”.
A viagem musical passou suavemente pelo Trem deslizante de Jaçanã, sem agressões sonoras e desfilou pela avenida entre retalhos de um amor perdido. Sim, o drama espalhado, todavia já contando com a luz do sol, que certamente nasceria “finda a tempestade”. Grande Cartola!
Tiradentes, “É,” a gente quer viver uma nação...” não houve palpite infeliz, “pra quê ligar a quem não sabe onde tem o seu nariz?”. Momento este para reflexão, a menina do sorriso largo samba no pé, porém com seriedade. Fina e aguda nas entrelinhas.
Toma ares de intensidade romântica, puxa o banquinho, caem-lhe no rosto os cabelos. Incorpora. Dolores Duran, Roberto e Erasmo Carlos. Luiz Vieira pousou e Lia tornou-se menina-sabiá, Piaf para ninar gente grande. Lirismo à flor da noite.
Canções escolhidas a dedo, para ouvidos atentos. “Não há o que perdoar” já que tudo foi perfeito. Assim, repetimos: é bonita, é bonita, é bonita!
(À cantora londrinense Lia Correia, amiga dos tempos de meninice)
Dalva Molina Mansano
20:16
30.04.2016