O  (de)EFEITO da Conjuração Setecentista Mineira
 


A Conjuração ou Inconfidência Mineira teve pouco efeito prático. Não passou de idealizações e discussões. Serviu sim à maneira ‘simbolista’ de um grande movimento que pensou as ideias Iluministas no Brasil e as fizeram sentir à moda romântica.
 
Foi um movimento mais significativo que prático e não podemos levantar conjecturas sobre suas possibilidades como alerta Tôrres:
“...não podemos discutir se possuía ou não resultados prováveis. O condicional não interessa à História; importa considerar o que efetivamente ocorreu.”¹
Levantar conjecturas sobre possibilidades é um erro crasso cometido por leigos que não têm formação  historiográfica e vivem dizendo asneiras tal qual esta:  “se tivesse acontecido assim seria assado”. A história não se faz disto e sim do acontecido nu e cru. Outro erro é analisar o que ocorreu com a visão do modo como acontecem os processos históricos, com licença da redundância, da contemporaneidade imediata – isto é anacronismo.
 
Em sua base de importância, de significados, está o fato de que este movimento mineiro do século 18 ofereceu à República Positivista, que se instalaria um século depois, a figura do herói na pessoa daquele que recebera a culpa, Joaquim José da Silva Xavier. Transformado em mártir, pintado a semelhança de Jesus Cristo teria sua imagem impressa e propagada como exemplo de dedicação brasileira e de nacionalidade.
 
Se o atual século 21 é marcado pela globalização, os precedentes 19 e 21 se pautaram no Nacionalismo.  E “esta consciência moderna de nacionalidade madrugou no Brasil graças à Inconfidência”², pois ela projetou o Estado Nacional Brasileiro.
 
Uma vez que a conjuração foi pensada segundo os ideais burgueses do Iluminismo, ela trazia de modo subjetivo e protótipo o conceito de cidadania. Rompia-se assim com significados ainda do Absolutismo português e medievalesco como o de vassalagem. Suscitava a razão de que “comunidade de terra” e não de estirpe é diferente de origem de mesmo lugar uma vez que “o liame entre suserano e o seu homem – eis o verdadeiro fundamento jurídico da nacionalidade de estirpe – era a base do laço feudal. Português era todo aquele que nascesse súdito do rei de Portugal. Esta conceituação de nacionalidade em função de nexo feudal explica muita coisa, como, por exemplo, as transferências de cidades e províncias inteiras de uma soberania a outra por meio de casamentos ou heranças, assim como os fatos, bem conhecidos, de homens que se punham a serviço de outro soberano que não aquele de seu nascimento... a Inconfidência revela que os mineiros  começavam a possuir uma consciência clara”³.
 
E assim...
“A Inconfidência revela que os mineiros começavam a possuir uma consciência clara da comunidade de terra e não de estirpe. A pátria começava a ser considerada “o lugar onde se nasce” e não a terra dos antepassados. Principalmente deixava de ser a comunidade dos de mesma origem para principiar a tornar-se a comunidade dos nascidos no mesmo lugar”³.
 
Torres assim comparava a seguir “...muitos depoimentos de inconfidentes e de outras manifestações... sentiam-se mais presos à terra do que atados à fidelidade de vassalos. Todos eles se consideravam mais homens nascidos no Brasil do que súditos portugueses, o que, juridicamente, eram. Enquanto os norte-americanos raciocinaram mais em termos de direitos ofendidos, direitos oriundos das leis e costumes ingleses reconhecidos na América, alguns dos inconfidentes, se não todos, tinham-se em conta de “brasileiros” em hostilidades aos “portugueses” 4.
 
Leon Pomer nos dá a Identidade Nacional dizendo que “a Nação é uma forma particular de agrupamento por parte dos homens que a compõem. Nem todo agrupamento humano é uma nação. Não o é uma tribo nem o foram os impérios inca e romano. Na nação os homens podem professar uma ou mais religiões, falar uma ou mais línguas, reconhecer-se como diferente em vários aspectos. Mas há algo em que coincidem: em identificar-se, acima de suas particularidades e sem prejuízo de que estas particularidades continuem existindo, como membros de uma identidade superior, a identidade nacional... uma das características da nação é que a identidade comum é aceita por um número maior de pessoas do que em qualquer outro agrupamento humano. As fronteiras da nação transpõem amplamente a fronteira da comunidade local, da região, da província. Quem se reconhece membro de uma nação aceita que sejam seus conacionais as pessoas que vivem dentro dos limites do Estado (e, em certas ocasiões, fora deste), quando a nação tem seu próprio Estado independente.”¹
 
Em sua época o movimento mineiro do século 18 não teve sua praticidade e nem durante o período do Império Brasileiro do século 19. Sua práxis se faria com a República que se instalara em novembro de 1889. Pois foi na conjuração de Minas que aqueles idealizadores foram buscar conceitos como “coisa pública” e a figura de Tiradentes como exemplo de cidadão brasileiro (e não súdito) e o afã passional do sentimentalismo brasileiro. Era o modo de dar o troco por se sentirem traídos pela casa portuguesa e a forma de governo que deixou a abolição acontecer sem indenizarem os proprietários da mão-de-obra escrava e que não valorizava os homens do Exército que lutava no Paraguai.
 
Há de se perguntar: qual o “(de)efeito”  do movimento mineiro do século 18? Tudo não passou de conversas? Faltou coragem suficiente? Idealizaram mais que realizaram?
 

Segundo Augusto Comte, propalado no Brasil por Benjamim Constant, tudo é causa e consequência;  prarafraseando, tudo é efeito e defeito.
 


 
Leonardo Lisbôa,
Barbacena, 29/04/2016
 
Referências:
POMER, Leon. O Surgimento das Nações. Discutindo a História. 3ªed. São Paulo. Atual. Campinas, SP. ¹p.10.
 
TÔRRES, João Camilo de Oliveira – História de Minas Gerais V. 3. Difusão Pan-americana do livro B.H. ¹p.735; ²p. 737; ³p.736;4p.737.


 

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Leonardo Lisbôa
Enviado por Leonardo Lisbôa em 29/04/2016
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