__________Caixinha de Segredo


Tremeu nas bases: no cantinho do criado-mudo o celular de Antônio Augusto. Ele tinha saído tão depressa que nem lembrara de pegar o aparelho carregando a bateria. Bom, e agora? Era estranha a sensação de ter os segredos do marido nas mãos. O que será que continha aquela caixinha poderosa que ela não sabia?

Segurou o objeto nas mãos, tocou levemente a tela com a ponta dos dedos. O visor iluminou-se, a ansiedade cresceu. Tinha a impressão de que estava para cometer um pecado. “Não fuçareis o celular do marido”. Sim, mexer ali não era mexer. Era fuçar mesmo. E ela não fuçaria, claro! Quem fuça é porquinho no chiqueiro e ela não era uma porquinha! Mentira! Naquele caso, equiparar-se a uma porquinha não significava absolutamente nada.  Não ia ter jeito, ia ter que fuçar...

Um filme na cabeça. Lembrou as amigas contando que fuçavam o celular dos maridos, noivos, namorados e namoridos. Moralista, ela condenava: “Que coisa mais sem ética, gente!”, ao que as amigas retrucavam: “E se tiver rolando algum rolo, tudo bem pra você?”. Ela mantendo posição: “Se não tiver confiança na relação, nem vale a pena, uai!”. Bom, mas agora é que se dava conta:  nunca tinha tido uma oportunidade como a de agora. Seu amor mergulhado no trabalho e ela ali, com a possível caixinha de segredos dele totalmente nas mãos...

E ele, será que faria o quê na mesma situação? Ah, Toninho era possessivo, chegava a ser chato! Melhor, ele beirava ao insuportável com seus ciúmes tolos. Aquela vez, por exemplo, que chegou de surpresa no barzinho onde ela tomava umas cervejas com a turma da escola, ele quase partiu pra cima do Carlinhos, professor de Matemática. Foi um vexame! Quase morreu de vergonha! É, pensando bem Toninho era um ignorantão nesse quesito, e certamente lhe vasculharia sem pudor o celular se tivesse alguma chance. Sabe de uma coisa? Ele não merecia sua ética, sua moral, sua consideração! Ia fuçar, sim, o celular!

Ponta dos dedos queimando, coração disparado, ela correu a tela dos contatos: Que alívio! Só nomes de gente conhecida. Sentiu-se culpada. JP, Vinicinho, Marcão, Rubinho... Epa! Juliano Terno.Terno? Quê isso? Que ternura era aquela? O coração deu um salto! Será que o marido... Não, não podia ser. De repente, clareou: era  o Juliano da loja onde Toninho  tinha alugado o terno para a formatura da irmã. Nossa, que susto!

A lista deslizava, e... Começou a esquentar: Sara. Que Sara? Anotou o nome e número num papelzinho. Julice. E essa também, quem era? Merecia uma pesquisa, claro! Domitila. Hum, esquisito! Mas pelo nome sossegou, devia ser alguma paciente da Fisioterapia. Foi quando deu com aquele Kátia Amor! Ah, aí não! Kátia Amor era sem explicação! Sem pensar duas vezes, fez a ligação do celular dele mesmo.  No telefone do trabalho Toninho atendeu, e, reconhecendo o próprio  número, não teve dúvidas do que estava por acontecer... O que continha sua caixinha de segredo ia render! Ela era possessiva! Tremeu nas bases!