Sentimento ou Pensamento:
(In)confidência e conjuração


 
No filme “Margareth Thatcher, a dama de ferro” uma fala muito expressiva se faz quando a personagem se expressa:
- O mundo está do jeito que está porque as pessoas sentem muito. Todos estão dizendo: “Eu sinto muito” ou “Eu estou sentindo isto e aquilo.”
- O mundo precisa é de pensamento! O mundo precisa é de ideias, de razões...
 
 
Neoliberalismo à parte!
 
De certo, desde o Iluminismo as coisas se fazem por aí: Razão, Ideia que é, segundo o movimento, Luz. E isto nos remete a René Descartes: “Penso, logo existo!”
 
Na contemporaneidade se fala em “quoeficiente emocional”, o Q.E., carga emocional que o indivíduo carrega consigo.
Perguntamos:   são os sentimentos que provocam os pensamentos? Ou o pensar leva ao sentir? Que os filósofos e os psicólogos nos respondam!
 
A História nos faz ver os dois afluentes deste mesmo rio e interrogamos como forma de provocação: É o movimento mineiro do século 18 resultado de um pensar e de um sentir?
 
Se analisarmos em termos de uma “Inconfidência”, infidelidade, encontraremos motivos sentimentais e afãs passionais que levaram às razões.
Se observarmos os incentivos movidos pelas leituras de obras encontradas nas bibliotecas dos envolvidos e parâmetros da independência dos Estados Unidos da América, veremos que a Conjura Mineira foi movida antes por pensamentos, ideias e razões que questionavam a autoridade, o poder e os desmandos portugueses.
 
Percebemos que é uma linha tênue que separa os motivos gerados pelos pensamentos e sentimentos na condução do movimento das Minas Gerais daquele tempo.
Tôrres  diz que “as revoluções nascem do sentimento de ‘asfixia política’ quando comunidades ricas e conscientes são, porém, dominados externamente”. E o mesmo autor adianta a respeito do povo mineiro setecentista: “era um povo perfeitamente cônscio de seu poder, de sua força: muitos punham em dúvida a legitimidade da autoridade do rei de Portugal sobre o Brasil, como demonstram depoimentos de inconfidentes que alegam haver o nordeste feito a expulsão dos holandeses sem o auxílio de Portugal e que o Rio fora comprado aos corsários franceses pelo seu povo. E, obviamente, as Minas  haviam sido descobertas e povoadas pelo esforço  particular.”¹  Pelo exposto percebemos a motivação sentimental do nacionalismo que já germinava e nascia no Brasil.
 
A Conjuração nasce de questionamentos e pensamentos. Quem duvida, quem pergunta está buscando a lógica, a ideia das coisas. Alguns liam as ideias que borbulhavam na Europa e sabiam de coisas colocadas em práticas na América do Norte.
 
“Todos estes sentimentos, todavia, haviam recebido, modernamente, uma justificativa teórica: as ideias ‘libertinas’ acerca da soberania popular, do ‘contrato social’, do direito de rebelião, do governo representativo. A palavra ‘república’ assumira, agora, um sentimento novo, como de governo do povo, por ocasião ao governo do rei. Estas ideias que muita gente conhecia em Vila Rica, Mariana, Sabará e São João Del Rei, etc, já haviam passado do domínio do debate em salões elegantes e cafés – eram realidade viva e atraente, num fato que assombrava: os ingleses da América do Norte num gesto ousado que provocara a admiração de todos, haviam criado uma nova nação, com sistema político diferente dos que a Europa conhecia... os mineiros conheciam tudo muito bem. O Cônego Vieira gostava muito de comentar aquelas coisas. Os ingleses da América do Norte governava-se por um governo escolhido por eles mesmos, nada mais vindo do reino, da Europa.
E por que não fazer o mesmo em Minas? Por que não repetir o gesto?
A Inconfidência foi, principalmente, esta pergunta ousada repetida por algumas bocas intemeratas.
...uma situação realmente nova surgia, a da consciência de que os portugueses da América se sentiam um povo distinto dos portugueses da Europa. O dia em que, pela primeira vez, alguém, talvez consigo próprio, levantou a dúvida e formulou a pergunta revolucionária – por que não fazer como os ingleses? – surgia no Brasil, um ‘nós’ distinto do ser coletivo antigo – não mais os súditos de sua Majestade Fidelíssima, e, sim, brasileiros, gente natural do Reino. ‘Nós, os mazombos, somos capazes de governo’. Pouco importa acharmos hoje ousada a tese – a sua simples formulação era mais do que uma declaração de guerra”², era uma tomada de consciência. Uma reflexão que levou os mineiros a sentirem-se diferente dos portugueses.
 
Seria prudente perguntarmos novamente: a Inconfidência Mineira surgiu de pensamento ou sentimento?  Primeiramente nasce de uma reflexão, de uma dúvida, um questionamento? É o pensamento que levou ao sentimento de querer ser livre de Portugal? Mas a Conjuração Mineira não surgiu do sentimento de opressão política e exploração econômica que levaria o se sentir diferente de Portugal?
 
Voltemos a Tôrres: “E, de qualquer modo, consta dos autos uma frase que, presumivelmente verdadeira, é a grande declaração de guerra, a demonstração de que havia uma nova consciência de povo – um ser coletivo novo emergia. Disse ele (Tiradentes), segundo depôs Domingos de Abreu Vieira, em depoimento transcrito à fls. 95 do volume I dos Autos da Devassa: os mazombos* também sabiam governar”³.
 
Pensamento e Sentimento, sentimentos e pensamentos: claro e escuro, partes que nos fazem humanos.
Sentimentos e pensamentos são forças que estimulam uma a outra fazendo a pessoa agir em sociedade e esta a repensar sua posição frente a outros.
 


Leonardo Lisbôa,
Barbacena, 15/04/2016.



TÔRRES, João Camilo de Oliveira – História de Minas Gerais. Ed Bernado Àlvares, S.A. – Difusão Pan-americana do Livro. 3º Volume.
¹p.693.
²p.694 e 695
³p. 729
*No Brasil Colônia eram os filhos de portugueses nascidos em terras brasileiras.
 
 

 
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Leonardo Lisbôa
Enviado por Leonardo Lisbôa em 15/04/2016
Reeditado em 18/04/2016
Código do texto: T5605923
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