SAUDADES DE UM AMIGO
Morreu no dia 31 de maio de 2013 o poeta Carlos Porfírio, nosso grande amigo de viola. Carlos Porfírio era portador de uma doença chamada albinismo, que o povo conhece por gazo ou sarará. Cantei com Carlos Porfírio seis anos consecutivos e viajamos por Ceca e Meca levando a nossa mensagem ao campesino amigo e sincero. O nosso vate não teve como cultivar a sua verve e nem se tornar um grande repentista letrado, morava o nosso menestrel 20 quilômetros distante da sede do nosso município e por este motivo ele não estudou para educar a sua arte nata. Não foi um gênio do repente, no entanto cantava com muita ironia e correção na língua de Camões. O nosso poeta teve muitos parceiros, amigos no cenário da viola. Entre os melhores parceiros que teve ele, tinha João Neidemar como bom companheiro e colega de preferência. Carlos Porfírio começou a cantar repente com João Jacó, Paulo Jacó e muitos outros cujos nomes eu não me lembro agora. Em 1985, conheci o poeta Carlos Porfírio quando ele tinha 23 anos de idade e eu tinha 31 anos. Em 86, começamos a viajar juntos por todo o sertão jaguaribano e cantar para o sertanejo amigo e grande admirador do cantador nordestino. O nosso menestrel vinha ultimamente sofrendo muito com a sua doença incurável, doença que o levou ao túmulo. Não morreu à míngua e nem lhe faltou o afeto dos amigos, dos companheiros de viola, como também o grande apoio dos seus irmãos e dos seus sublimes pais, que são eles: Dona Ana Madalena e Seu Gerardo do Porfírio, a quem eu tenho bastante respeito e muita gratidão pela sua honestidade de cidadão pobre, entretanto muito mais do que íntegro. Deixo aqui os meus pêsames à toda a família do falecido poeta e meu nobre companheiro de viola por mais de seis anos. De todos os parentes de Carlos Porfírio, quem mais o admirava era sua prima Martinha Nogueira, grande amiga dos cantadores, e muito mais deste seu parente e poeta morto recentemente. A morte do nosso poeta deixou muita gente triste. Nem só os seus parentes sentiram a perda do nosso poeta. Nós artistas lamentamos a ausência desse vate sincero e admirado por todos aqueles que o conheceram. Carlos com a sua humilde cantoria fez amizade com muita gente por este sertão a fora. O poeta tinha um carisma formidável para dominar a platéia com sua lira matuta. Cantei com o poeta várias vezes na região de Tabuleiro do Norte e outras regiões vizinhas deste vale querido. Ao afastar-me da viola em 2005, sempre ia visitar o nosso poeta em sua residência no Sítio Lagoa dos Cavalos. O nosso artista era casado com Edite Caboclo e deixou três filhos órfãos. Mesmo sofrendo muito, o nosso vate não reclamava da sua doença incurável. O nosso genial poeta não teve nenhum apoio da nossa sociedade e por isto não teve como crescer na profissão de repentista popular. Carlos tinha uma voz boa e muito carisma para a arte do improviso, embora lhe tenha faltado o total arrimo do nosso povo admirador da cantoria nordestina. Por que o nosso poeta não foi grande? Porque lhe faltou total apoio da nossa sociedade ingrata e egoísta. Morreu o poeta de carne e osso, todavia a arte do nosso irmão artista vai ficar para sempre no coração daqueles que o ouviram cantar repente e privaram da sua amizade pura e saudável. De todos os colegas com quem cantei, só Carlos tinha ciência da minha vida de artista humilde e estudioso. Nunca ouvi o nosso genial segrel reclamar da sua profissão e nem humilhar ao parceiro por não fazer boa cantoria ou ganhar pouco dinheiro. O nosso vate era calado a beça, pouco gostava de falar o que sentia de bem ou de mal. Eu como um dos seus parceiros jamais vou esquecer das nossas noites de cantorias por todo este sertão macabro onde levamos os nossos improvisos irônicos e cheios de críticas ao sistema político desse Brasil fajuto.
Autor: Antônio Agostinho