DIÁRIO [24/03/2016]
24/03/2016 19h56
ANJOS
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No século XIX, no desenvolvimento do conceito de liberdade (e a liberdade não costuma exceder muito a condição de conceito) os pensadores políticos liberais se dividiam entre os defensores da "liberdade clássica" e os da "liberdade moderna". A liberdade clássica é um tipo de idealismo político, que diz mais sobre o que o Estado deve ser do que sobre o que ele de fato é. Sua tradição remonta a John Locke, J.J. Rousseau e Thomas Payne. A liberdade moderna é o chamado liberalismo realista (no sentido de realidade), que defende um caráter relativo da liberdade, em que a liberdade só ocorre em termos ou sob certas condições. Sua tradição remonta ao De civis de Thomas Hobbes, passando por Hugo Grotius, David Hume e chegando no século XIX com Alexis de Tocqueville e Jeremy Bentham. As condições históricas sempre jogaram a favor dos últimos. O liberalismo loucamente defendido por Frederic Bastiat e que chega ao neoliberalismo de hoje, não passa de uma quimera. Foram as necessidades do capitalismo e de suas pretensões liberais que criaram o Estado moderno. E para os liberais, e principalmente os neoliberais, é justamente o Estado o principal inimigo da liberdade. Esse povo caminha nas nuvens. Os neoliberais perderam o senso de realidade. Hannah Arendt, em entre o passado e o futuro, no capítulo dedicado à liberdade, diz que até Von Mises evitava o uso da palavra liberdade para pensar a relação entre capitalismo e governo. E esse Mises é justamente o papa do neoliberalismo econômico. Digo isso tudo para falar de uma ideia desenvolvida pelo liberalismo moderno de Alexander Hamilton, dita em O federalista. Lá, refutando a tese de Thomas Jefferson de que a pior anarquia é preferível à melhor autoridade, diz Hamilton que se os homens fossem anjos não precisariam de governo. Mas os homens não são anjos, por isso existe a necessidade de um governo forte, que administre de uma distância razoável os interesses particulares dos indivíduos e do próprio capitalismo. Pois é isso aí é o que temos visto: arrolados numa planílha estão os diabos e os diabos que até então se disfarçavam de "anjos". É preciso conviver o melhor possível com essa realidade, não abraçar esse nacionalismo primário e ingênuo, bem como rechaçar as tendências facistas que nessa crise perderam o pudor de exporem à luz do sol. Isso me preocupa tanto que estou caindo num tipo de depressão misturada com letargia. Vamos parar com hipocrisía, porque ela não combina com poesia.
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Goiânia, 24 de março de 2016.
DISPONÍVEL: http://www.joseeustaquioribeiro.prosaeverso.net/blog.php?idb=47019
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