Nossa bandeira
               e os papagaios




          1. Nos últimos dias, o que não falta nas ruas e praças das cidades brasileiras é a bandeira do Brasil. O pavilhão nacional é desfraldado dentro dos ônibus; no interior dos metrôs; nos restaurantes e lanchonetes; e carregado nos ombros por exacerbados "patriotas".
          A bandeira é beijada; acariciada; improvisada como guarda-chuva ou guarda-sol. É, enfim, exaltada em praça pública como a coisa mais sagrada que pode existir numa República que se presa.
          
2. Diante de tamanha euforia "patriótica", cheguei a pensar que o país estava em plena Copa do Mundo de Futebol.
          É fato inconteste que quando a seleção brasileira de futebol - hoje formada por craques, na sua maioria argentários -, entra em campo, a bandeira do Brasil é vista nos mais variados lugares e localidades deste auriverde país tropical.
          
3. A rigor, não sou contra que as pessoas tomem o pendão verde-amarelo e saiam por aí aplaudindo, aos berros, os jogos da seleção ou acompanhando passeatas patrocinadas por esta ou aquela facção política, ditas "de direita" ou "de esquerda".
          
4. Todavia, quão bom seria que nossa bandeira não servisse apenas para empolgar multidões nos movimentos políticos e esportivos, como, nos últimos tempos, vem acontecendo.
          Nossa bandeira deveria estar presente no dia a dia de cada cidadão e por ele idolatrada e respeitada.
          
5. Numa de minhas visitas aos Estados Unidos eu vi - e cito a Pensilvânia como exemplo - o quanto a família norte-americana reverencia, ama a bandeira do seu país.
           Em quase todas as residências a bandeira dos Estados Unidos é vista nos seus beirais ou fazendo parte da intimidade da casa, adornando-a. Vi idosos carregando, no chapéu ou no boné, uma bandeirinha (miniatura) do seu país.
          
6. A nossa bandeira, sem dúvida uma das mais eloquentes e mais belas do planeta, está carecendo de melhor tratamento; e, acima de tudo, de ser respeitada.
          Dia desses, passando eu por uma agência bancária, na hora do arreamento das bandeiras - antes do sol se pôr, portanto, - fui obrigado a ralhar com o debochado segurança que, displicentemente, recolhia o pavilhão.
          Gritei: amigo, trate melhor a sua bandeira! Vomicê esta pensando que ela é o pano do chão da cozinha de sua casa? O cidadão, fardado e armado, deu-me as costas e seguiu com a bandeira no ombro, como se ela fosse um molambo qualquer.
          
7. Castro Alves saudou assim a bandeira do Brasil: "Auriverde pendão de minha terra,/ Que a brisa do Brasil beija e balança,/ Estandarte que a luz do sol encerra/ E as promessas divinas da esperança."
          
8. Auriverde. Embora as cores da bandeira brasileira sejam quatro - verde, amarelo, azul e branco -, dá-se realce ao verde e ao amarelo, daí, auriverde pendão.
     Há muitos relatos folclóricos ou se aproximando da verdade, tentando explicar ou justificar o porquê das cores da bandeira brasileira.
          Ora, no momento em que circulam notícias tão ruins, mexendo, com certeza, com a alma dos brasileiros, lembrar ou até aceitar a versão folclórica talvez minimize a desilusão dos patriotas de verdade...
          
9. No "Livro de Horas", o magnífico escritor baiano Afrânio Peixoto (1876-1947) conta que teria sido do pintor, também baiano, Franco Velasco (1780-1883) "o primeiro esboço da bandeira nacional, cujo verde e amarelo copiara fielmente das penas de um papagaio baiano."
          E prossegue Afrânio: "Com efeito, o verde do pavilhão nem é verde-negro das folhas do café, nem verde-gaio das folhas do fumo; o amarelo é também o tom das penas dos papagaios."
          
10. Isso pode ser uma tremenda lorota, posta, com sabor de verdade, pelo Mestre Afrânio Peixoto, no seu interessantíssimo "Livro de Horas".
          Mas ter as cores de nossa bandeira inspiradas nas asas dos papagaios, não é nenhum absurdo. Afinal, o Brasil já foi chamado de Terra Papagalli - Terra dos papagaios!  

 
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 23/03/2016
Reeditado em 12/12/2020
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