Folhetim - Três Noites de Paixão - III

O padre sabia que a excitação da professora em torno da monografia era uma forma de desviar a mente (e o corpo) da atração que sentia por um jovem do lugar, André, filho do comunista que lhe emprestara os livros de Zeferino Galvão. A atração entre eles era profunda e só não se completava devido à falta de oportunidade e aos preconceitos e tabus locais que não admitiam que um jovem de 20 anos se relacionasse plenamente com uma mulher mais velha do que ele. Além disso, sabia o padre, a professora tinha outro motivo ainda mais forte para descartar qualquer tipo de romance na cidade. André era vidrado na professora, era a sua paixão. Às vezes nem precisava vê-la para que seu coração batesse mais forte. A simples lembrança dela excitava-o. A professora morava no primeiro andar do colégio das freiras que ficava na vizinhança da casa dos avós do rapaz. Todo fim de semana ele vinha da cidade vizinha, onde era funcionário do Banco do Brasil, e ficava na casa dos avós. No seu quarto, à noite, ele abria a janela e via uma luz acesa no andar de cima do colégio e pensava: "Será que ela está lendo ou com insônia? Será que está pensando em mim?" E ficava fantasiando, recompondo na memória os encontros com ela, recordando-os nos mínimos detalhes, mas gostava de relembrar esses encontros, não raro, alterando-os, aduzindo cenas, transformando essas situações. Na sua fantasia ela sempre se entregava a ele, carinhosa, vibrante, sensual, e aí ele terminava se masturbando.

O padre que a admirava secretamente (nas suas noites de solidão, tomando vinho, costumava, pensando nela, declamar versos dos seus poetas favoritos), não entendia por que, ante evidências tão óbvis, as demais pessoas não notassem o envolvimento da professora com o jovem. Ele sacara o clima do roamnce entre os dois apenas observando a pertubação deles quando se encontravam em reuniões com outras pessoas, as tentativas quase cômicas de disfarçar o que sentiam, esses expedientes de que se utilizam os que se amam e tentam esconder esse sentimento.

Quando estava concluindo a sua monografia, a professora que sempre submetia ao padre o que escrevia, disse-lhe que só temia, caso fosse aprovada, ter que se ausentar da cidade. Isso não a entusiasmava porque se afeiçoara a terra, gostava do povo, fizera ali bons amigos, e saiu enumerando uma série de argumentos contráruios a uma provável transferência. O religioso ouviu tudo e fez cara de riso. Ela corou, sabia que ele notara que ela não havia citado o veradeiro motivo. Perguntou embaraçada:

- Por que o senhor está rindo?

- Porque a senhora omitiu o verdadeiro motivo que a impediria de sair da nossa cidade.

Ela baixou os olhos e na defensiva mormurou:

- É tão evidente assim? Eu sempre desconfiei que o senhor sabia desse fato que eu tento esconder, embora eu nunca tenha lhe confessado nada.

- Não me venha dizer que estou violando um segredo de confessionário porque não é verdade - o padre comentou rindo -, porque você nunca se confessor comigo.

- E com nenhum outro padre. Eu acho mesmo que tenho que ir embora, antes que o pior aconteça.

- O pior ou o melhor, isso depende do ângulo que se analisa o problema. É relativo.

- Não, padre, a gente tem que viver de acordo com as normas do lugar. É muirto difícil vencer preconceitos arraigados, ainda mais no meu caso...

Ele interrompeu:

- Difícil, mas não impossível.

- Para mim é, padre, o senhor sabe disso, tenho certeza que sabe dos meus antecedentes, uma recaída seria fatal.

Nem ele fez mais nenhum comentpário e nem ela quis revelar mais nada, preferiram voltar à vaca fria, ou seja, à monografia: "A vida e a obra de Zeferino Galvão".

- Continua -

P.S. Obrigado a Angie, Alice, Humberto, Maria ASraújo ( Quase Frevo)...

Fico bestinha por vocês lerem este folhetim tão acanhado. Abraço.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 18/03/2016
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