TRÊS MOMENTOS NUM DIA DE IRA

“Sejam todos prontos para ouvir,

lentos para falar

tardios para irar-se”

(Tiago 1:19)

Semana passada, no dia de “terra em transe”, conheci três momentos.

A seguir, partilho a experiência com o leitor.

Primeiro, (embora, na dinâmica das coisas tenha ocorrido por último), tomei conhecimento de uma bloguista canadense de nome “Oriah”:

Transcrevo, a seguir, um poema dela:

Não me interessa saber o que você faz para ganhar a vida.

Quero saber o que você deseja ardentemente,

E se você ousa sonhar em buscar os desejos do seu coração.

Não me interessa saber quantos anos você tem.

Quero saber se você se arriscaria passar por tolo por amor,

por seus sonhos e pela aventura de estar vivo.

Não me interessa se os planetas estão em alinhamento com a sua lua.

Quero saber se você já tocou o centro da sua própria tristeza,

se você se tornou mais aberto por causa das traições da vida

ou se você se encolheu e se fechou por medo das futuras mágoas.

Interessa-me saber se você pode sentar-se com a dor, minha ou sua,

sem se importar em escondê-la, tentar diminuí-la ou tratá-la.

Interessa-me se você pode conviver com a alegria, minha ou sua,

se você pode dançar loucamente e deixar que o êxtase se aposse de você

dos pés à cabeça, sem a cautela de ser cuidadoso, de ser realista

ou de lembrar-se das suas limitações de ser humano.

Não me interessa saber se a história que você está contando é verdadeira.

Quero saber é se você é capaz de desapontar alguém

para ser verdadeiro consigo mesmo;

se você pode suportar acusações sem trair a sua própria alma.

Quero saber se você pode ser leal, portanto, se é alguém em que se possa confiar.

Quero saber se você pode ver a beleza mesmo quando o que vê não é bonito,

e se todos os dias, você pode buscar a fonte de sua vida em sua presença.

Quero saber se você pode conviver com o fracasso, seu e meu,

e ainda postar-se à beira de um lago e gritar à lua cheia prateada: “Sim!”.

Não me interessa saber onde mora ou quanto dinheiro tem.

Quero saber se você pode levantar depois de uma noite de tristeza e desespero,

cansado e machucado até os ossos e fazer o que tem que ser feito

para quem depende de você.

Não me interessa quem você é ou como chegou até aqui.

Quero saber se você vai se postar no meio do fogo comigo e não vai se acovardar.

Não me interessa onde ou o que ou com quem você estudou.

Quero saber é o que faz se agüentar por dentro quando tudo ao seu redor fracassa.

Quero saber se você pode ficar só consigo mesmo

e se você realmente gosta da companhia que tem nos momentos vazios.

(Tradução minha, com auxilio do “Google tradutor” e outras ferramentas, do poema “O convite”, de Oriah Mountain Dreamer; ou “Oriah”, somente, porque esta coisa de “montanha” e “sonhos” deve ter sido acrescentado).

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Lembra a “Oração de Gestalt”, de Frederick Perls, um pequeno poema que seria a síntese da visão do poeta/neurologista sobre as relações entre as pessoas.

“Eu sou eu.

Você é você.

Eu faço as minhas coisas,

Você faz as suas.

Não estou neste mundo para viver de acordo com suas expectativas.

E você não está neste mundo para viver de acordo com as minhas.

E se por acaso nos encontrarmos, será lindo.

Se não, nada há à fazer.”

A posição de Perls é a de um respeito total pela individualidade, pela aceitação das diferenças e pelo reconhecimento e aceitação plenos dos limites inerentes a qualquer relacionamento.

Cada pessoa tem o direito de ser o que é; e isso basta.

Se houver afeto, respeito e aceitação pela individualidade do outro, poderemos continuar a conviver em harmonia.

É um pouco como diz Fernando Pessoa:

“Segue o teu destino...

Rega as tuas plantas;

Ama as tuas rosas.

O resto é a sombra

de árvores alheias.”

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Estava eu na avenida Brasília, aqui em nossa Baguaçu, quando um senhor, que seguia atento o noticiário na televisão ligada no recinto, disse:

“Esse filho da puta tem mesmo que ir para cadeia. Bandido. Safado”.

Repetia, mais ou menos, o mesmo que dizia o repórter na “maquina de fabricar doido”.

A televisão pode nos dar muitas coisas; exceto tempo para pensar.

Era o telespectador sacando em excesso sobre o futuro.

Outro senhor, ao lado, não gostou:

“Cala essa boca coxinha. Você nem sabe do que está falando.”

O leite azedou e os dois ficaram a bater boca.

A certa altura o que se indignou com o outro, explicou que ele era coxinha “porque coxinha tem a barriga cheia, não tem cabeça (pois não pensa) e nem tem pernas e braços (porque não trabalha).

Quase chegaram a brigar de soco; isso na frente de estranhos.

O proprietário da loja de fotocópias colocou os dois para fora:

“Por favor, saim daqui, respeitem o ambiente; briguem na rua.”

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Mal saíram os dois rabugentos e estaciona em frente a loja um automóvel de luxo, Audi, modelo que desconheço, maravilhoso.

Do carro desce um rapagão, porte atlético e roupas caras.

Não minha senhora;

não é viadagem não...,

mas o rapaz era bastante bonito.

Ele chegou ao balcão com uma pasta e foi atendido pelo empregado; um negrinho, ou melhor, um afro descendente, mirrado, e que estava ali ganhando a vida honestamente.

“Boa tarde”... – diz um;

“Boa tarde”... – responde o outro.

O bonitão pediu que fossem tiradas cópias de algumas partituras musicais, que colocou sobre o balcão.

O empregado olhou para as peças e diz:

“Quer que eu tire as cópias assim como estão; ou que eu inverta a posição do texto?”

O garoto rico responde:

“Não entendi! Isso faz diferença?”

“Sim, faz diferença quando se tira cópias invertidas de partituras. Se eu inverter você poderá manuseá-las com a mão esquerda, rapidamente, sem perder o ritmo”.

“Não sabia; sabe que é uma boa ideia. Faz assim como você disse”

E acrescentou:

“Você entende de música?”

O empregado responde simpático:

“Gosto de tocar cavaquinho. E vi que as partituras são de Ernesto Nazaré. Tenho umas partituras boas dele em casa e que você não tem aqui.”

“Jura!” – responde o bonitão – “Você não me arruma umas cópias?”

“Claro. Pegue amanhã por aqui comigo. Mas vou querer cópia de umas que você tem e eu não tenho.”

“Fique à vontade.”

“A gente precisa se encontrar um dia para trocar experiência.”

“Puxa, seria legal.”

“Me de seu celular, vou colocar você num grupo de músicos que tenho.”

E mais não ouvi; porque já não tinha nada para fazer ali naquele lugar.

Mas bem que gostaria de ter ficado, para continuar a usufruir daquele papo gostoso, de duas pessoas que nunca se viram, mas se respeitavam e tinham a música em comum, e faziam disso um mote para confraternização.

E pensar que a primeira coisa que disseram um ao outro foi “Boa tarde”.

Creio que a educação e o bom trato entre as pessoas é o concreto que pavimenta as boas relações.

E creio mais, que todo mundo tem escolhas na vida, e pode abordá-las como crítico ou criador, amoroso ou rancoroso, doador ou tomador.

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Obrigado pela leitura;

Fiquem em paz.

Araçatuba, março / 2016