De repente um tiro
Estou deitado no que penso ser minha cama.
Ao meu lado dorme a mulher que tanto amo.
Não recordo por qual motivo ela brigou comigo.
Sinto uma dor intensa na cabeça.
Há sangue escorrendo em meu próprio peito.
Olho para a frente assustado após ouvir o tiro.
Não quero acreditar no que agora vejo.
Ela está em pé a minha frente com o revolver em punho.
Do cano da arma vejo sair fumaça.
Ela com os olhos arregalados deu-me um tiro.
Rodopiei e cai de volta a cama.
As lembranças de todos os meu dias na terra
passaram por minha mente como num livro de história.
Vejo-me tomando minha primeira mamadeira.
Ela é toda feita de vidro com alguns relevos.
Agora estou diante dos meus cinco anos.
Na casa de meus pais subo no parapeito do muro.
Observo na avenida surgir um bonde.
Está levando pessoas para o centro da cidade.
Quando desço do parapeito a cena dos meus sete anos surge.
Estou brigando com um menino filhinho de papai.
Não consigo recordar o nome dele.
Só lembro que ele é o filho do doutor José Roque.
Ele briga comigo quando observa o próprio pai
ser atencioso comigo quando deles me aproximo.
Agora salto no tempo e tenho dez anos de idade.
Minha mãe faleceu doente na cama de um hospital.
Minhas irmãs e irmãos choram juntos comigo.
Perdemos aquela que era o coração da casa.
Caído na minha cama vejo outra lembrança.
Meu rosto está triste e estou chorando.
Da mãe que perdemos sinto saudades.
Vejo-me também descendo pela rua Santa Quitéria.
Vou com meus irmãos e irmãs a cooperativa do banco.
Lá enchemos o carrinho com diversas compras.
Sem saber como eu vejo os meus vinte anos.
tentei me jogar debaixo de um ônibus.
Pensava cometer a loucura do suicido.
Eu me vejo agora casado e com dois filhos.
No quarto a mulher olha-me deitado.
De repente o tiro devolveu-me a realidade.
Que tiro afinal foi esse em meu peito?
Descubro perplexo com a camisa toda suada
que tudo não passava de apenas um sonho.
( J C L I S )