UMA POESIA E UM VIOLÃO.

UMA VALSA E UMA POESIA.

Crônica de Honorato Ribeiro.

Alguém me apresentou uma pessoa que trabalhou bastante em teatro. Era um verdadeiro ator. Mas o mais notável dele era a arte de recitar lindas poesias de cor, várias e de vários poetas. Eram poesias e poemas longos.

Noite de lua clara, céu estrelado e todos dormindo, luzes apagadas, somente a claridade da lua e das estrelas a brilharem no céu. Podia ver bem nitidamente a abóbada celestial; o “Caminho de São Tiago”, a nossa linda galáxia, a Via Láctea um verdadeiro tapete celestial de estrelas de todos os tamanhos a piscar sem parar os olhos luzentes da criação do criador. Eu peguei o meu violão e saí com ele. De frente à porta da rua de quem gostava de ouvir seresta, acomodei-me sentado na calçada e solei a valsa Abismo de Rosa, e ele, parecia que estava num palco e o salão cheio de espectadores, pois ele começou a recitar e abria os braços, olhava para a lua, erguia as mãos para o céu, e, com fundo musical, eu dedilhava a valsa suavemente. Caminhamos de rua em rua, de praça em praça e ele não esgotava de recitar poesias, as mais belas poesias de amor em versos madrigais; enquanto eu passei a solar outra valsa e mais bonita: Se ela perguntar por mim, de Euvaldo Goveia e Jair Amorim, arranjo para violão, do Rei da América Latina: Dilermando Reis, e eu o imitava. Ouvimos o cantar dos galos na calada da madrugada, pois o relógio marcava 3h da manhã e nós fomos dormir.

Ao amanhecer, saí para a padaria comprar pão para o café da manhã e já encontrava os comentários do povo a perguntar-me quem era aquele recitador daquelas poesias! Foi a manchete do dia e toda a cidade comentava a seresta de um solo de violão e um recitador de poesia. Ele era mineiro de Januária, nunca esqueci dele.

Mas irei contar a proeza, a eloquência, de outro recitador de poesia. Meu grande amigo o Dr Daniel Azevedo, grande advogado. Quando ele chegava de Brasília à nossa querida terra, à margem esquerda do Velho Chico, Daniel Azevedo ia logo à minha residência, à noite, e dizia-me: “Zé de Patrício, cadê seu violão”? Eu já sabia o que ele queria. Pegava o meu violão e saíamos para ruas e praças e ele recitando poesias de Castro Alves: “Navio Negreiro” e eu solava: “Uma valsa e dois amores” de Dilermando Reis. Ele acabava de recitar Navio Negreiro e me dizia: Sola Abismo de Rosa que eu vou recitar: Voz da África de Castro Alves. E as horas iam passando, e a lua ia se escondendo atrás da serra e o céu lindo e as estrelas a chorar lágrimas a derramar gotas qual garoa sobre o chão; e a brisa fria chegava e nós dois alegremente fazendo sonata de poesia pelas ruas da pequena cidade de Carinhanha. Há muitos anos não o vejo, não veio aqui mais para ele recitar as poesias de Castro Alves para mim. Grande recitador, o Dr Daniel Azevedo e grande advogado. Tudo passa rápido e a gente não observa o tempo passar. Mas as lembranças não morrem na minha mente e nem apagam as minhas perspectivas de imagens e do som de sua voz que vibrava como um boêmio apaixonado ou talvez fosse um menestrel louco de amor pela sua bela amada! Que vida bela tivemos!

hagaribeiro

Zé de Patrício
Enviado por Zé de Patrício em 08/03/2016
Código do texto: T5567630
Classificação de conteúdo: seguro