Alguns valores explorados pela mídia contemporânea
Tendo a mídia o acesso à intimidade dos lares do mundo globalizado, as imagens captadas plenas dos interesses da comunicação visual e auditiva estão na cabeça dos homens, principalmente as que encerram algum objetivo de cunho comercial, intensamente despejadas em todos os lugares atingíveis deste planeta varrido pelas ondas eletromagnéticas.
A propaganda impera sobre a dinâmica do homem moderno, que se mantém carente na falta de tempo para uma leitura informativa mais aprofundada da realidade que o envolve, em cuja ignorância tem-se plantado e se consagrado um círculo vicioso e inibidor da capacidade crítica sobre o cosmo que absorve o humanoide, fato que se tem fortalecido ou manipulado através da pregação de pseudovalores martelados frequentemente sobre a cabeça do ser humano, bastante idiotizado e em aparente letargia neste início de século nascente. E fico pasmo que isso aconteça mesmo depois da virada do século.
Identifico o veículo de venda ao consumidor de produtos usados por músicos e dançarinos no modismo dos ritmos africanos ou de meros baticuns monotônicos, tais como roupas, sapatos e relógios, etc.
Muitos artistas apresentam vacância cultural sobre o campo de definição das artes que se queixam praticar, alimentando o processo de manutenção de um presente apodrecido e com nível cultural pobre ou definidor precário de um pretenso rompimento com os valores que um dia fizeram da Humanidade um poço de conhecimentos sábios, de verdades axiológicas capazes de enobrecer e dignificar o homo sapiens. Todavia, a massificação dos meios televisivos – o fértil caminho gerador de riqueza para os profissionais da propaganda (muitos deles conscientemente moldados na forma da mentira ludibriadora dos povos, por vezes!) – obviamente não tem sido combatida pela classe mais aculturada deste país composto em sua quase totalidade de analfabetos ou de semianalfabetos.
Contudo, não é privilégio do Brasil esta estatística anômala. Assim, é que, recentemente, crimes praticados nos Estados Unidos, com atentados à bala cometidos por estudantes contra colegas de escolas, se repetiram em outros lugares daquela terra, exibidos ao mundo quase em tempo real, tendo acontecido com as mesmas características vistas originalmente, mostrando que criminosos também perdem a própria identidade ou criatividade até mesmo no cometimento de crimes, apenas copiando as formas praticadas pelos bandidos dos atentados anteriormente revelados. Portanto, vejo que não é privilégio de gente sadia a imitação daquilo que é revelado pela propaganda televisiva – seja ela ruim ou boa para o ser humano!
A cabeça raspada ‘na máquina zero’ (onde o cabelo fora cortado literalmente rente ao escalpo!) de jogadores no mundo do futebol acompanha o corte do craque brasileiro Ronaldinho, numa apologia ao estilo já visto antes nos filmes do artista norte-americano, no papel do policial Kojak, porém com imitação em menor grau, ressaltando-se a diferença de que no teatro ou no cinema é exigido um bom funcionamento do cérebro além das funções vitais, com abstrações e operações que dignificam o ser humano, tornando-o, pois, superior aos animais irracionais. Parece-me ter nascido uma inversão de valores aqui: o lado material vale mais do que o valor cultural, sendo a cultura desenvolvida nos pés para os jogadores de futebol! Tudo bem, afinal nosso planeta já fora comparado com o modelo capitalista do material world e curiosamente jovens e velhos, até mesmo os ditos pernas de pau, têm aderido à velha tradição dos calouros universitários do continente brasileiro, hoje caracterizada como um modismo criado pelo craque das convulsões da Copa do Mundo da França. Será que raspar a cabeça é ignorar a memória que se possui ou será que se trata unicamente de falta de memória? Não se sabe, todavia poder-se-á emitir um juízo de valor a partir do cheiro do pensar dos adeptos dessa fashion!...
Nos processos eleitorais, na maioria das vezes batizados pelo povo como sendo eleitoreiros, no mundo em atrasos tecnológico e político, dá-se a manutenção da ignorância do eleitorado. No Brasil, especialmente em seu enorme contingente de analfabetos com fome e desassistidos em tudo, portanto, justamente onde repousa a maior e a pior parte da ignorância sobre a vida política desta nação, perfaz-se a força assegurada de votos para candidatos ruins no processo de eleições. Tais candidatos tratam o inocente eleitorado como bichos em seus limitados e demarcados currais eleitorais (possivelmente, eleitoreiros!). Eleitores ou vítimas, por sua vez e com frequência, têm eleito muitos demagogos e/ou corruptos para o poder Executivo, os quais tiram benefícios apenas em favorecimento de causas próprias, sempre atuando de modo a subtrair ou a polarizar recursos para as áreas e/ou regiões de interesses exclusivamente pessoais, castrando as populações nas necessárias melhorias de crescimento enquanto seres humanos que são, o que quase sempre se constitui em práticas perversas e criminosas, cujo incauto eleitor não tem capacidade de perceber o que de fato se passa e, assim, ele continua aprisionado nelas ad eternum. Trata-se, pois, de uma bem conhecida negação da democracia!
Jogos de canibalismo dentro do poder instaurado entre políticos ou permeado no tecido dos partidos, que disputam governos, presidências, partidos etc, alardeiam-se em péssimos desvios de comportamento de líderes junto à mídia oportunista – como já se dera com os presidentes Nixon no caso Water Gate e Collor nos múltiplos escândalos junto com o seu tesoureiro de campanha Paulo César Farias, o PC, todos muito amplificados pela mídia. Atualmente, a título de exemplo, o presidente americano Bill Clinton está preste a sofrer um processo de impeachment pelas muitas práticas sexuais que revelara em tribunal ter mantido com a senhorita Monica Lewinski, quando esta realizava estágio no ambiente de labuta do poderoso mandachuva americano e dentro da própria White House! Sim, a coisa fora tão marcante que implicou no nascimento de mais um neologismo naquele país: o verbo to lewinski, significando o fazer sexo oral.
É real que a mídia associa ocorrências novas a eventos do passado ao mostrar fatos atuais sensacionalmente. Infelizmente o faz aumentando, copiando, relacionando, ridicularizando dados e fatos, geradores e/ou origens, induzindo a parcela do público menos capaz sobre teses oportunistas que defendem com fins de lograr incremento da audiência e que, entretanto, costumeiramente nunca vão além de falsas hipóteses, que jamais são devidamente compreendidas pela maioria dos normalmente fracos ouvintes de broadcasts, sendo esta uma observação bem notada no continente brasileiro. Assim, onde estão os governos e as causas sociais de erradicação da ignorância dos povos?
Na Terra Brasilis, repleta de sedentos e famintos, chega-se quase a beber os líquidos anunciados na TV, como acontece quando da propaganda da Coca-Cola. De modo similar, sanduíches das lanchonetes McDonald’s parecem ser degustados pelos telespectadores, estáticos, imaginativos e com os estômagos a roncar de fome, sendo mesmo canina o seu qualitativo mais apropriado com referência, pelo menos, à qualidade da carne empregada em hamburgers comerciais, sempre aditivados de produtos químicos para conservação da péssima mistura de carnes de que são compostos! Por que não somos críticos de nós mesmos na consecução de nosso bem-estar alimentar, pelo menos? Será que ainda pensamos? Ou será que estamos em processo de regressão mental, voltando ao primitivo estágio da inteligência humana? Seria o evolucionismo de Darwin ao contrário?...
Lindos, potentes e avançados carrões da Engenharia Automobilística e maravilhosos produtos da Eletrônica e da Cibernética são entes virtuais, entretanto materializados nos lares de muitas nações, especialmente daquelas com maiores carências materiais. Será que estamos a receber o capitalismo à força ou será que o homem é de fato o seu próprio lobo?...
De tudo posto antes, se me apresenta o desencadeamento de um processo de desvairado consumo ou até de intensificado consumismo, o qual, em muitas ocasiões e se então não consumado de pronto, pode levar a criatura humana à negação da própria dignidade, na geração de práticas imorais e/ou ilegais de roubos, saques, agressões destrutivas contra o patrimônio alheio etc. O homem não estaria buscando implodir a Humanidade? Por que se mostrar ao iludido brasileiro o que não poderá ter dentro da realidade da conjuntura econômica vigente, a qual o tortura e o agride quando da revelação de inconteste pobreza material?
Ficamos na fervura tamponada da panela global de nossa mídia contemporânea, boiando que nem corpos flutuantes sobre sujas águas oceânicas próximas a emissário submarino.
Devemos, portanto, algo fazer para evitar que exalemos certo aroma fétido, peculiar aos dejetos encobertos por nossa vil metáfora! Contudo, que jamais se deixe de ressaltar que censurar a mídia equivale a castrar a liberdade e a chance de tê-la completamente saneada da falsa ilusão ofertada contra os mortais menos favorecidos deste nosso mundo, então em branda, mas real guerra civil!
Salvador, 31/03/1999.