SORRI DE VOLTA, E FECHEI A PORTA
No mês passado, uma amiga partiu dessa vida.
Na semana passada, sua única filha, que vi crescer, pediu-me que a ajudasse, a dar um destino útil aos pertences de sua mãe.
Tarefa dolorosa essa, mas como negar?
Assim que adentramos a casa, na qual minha amiga, que enviuvou há dois anos atrás, morava sozinha, um arrepio percorreu todo meu corpo e minha alma. Desde sua partida, ninguém mais tinha entrado ali.
Havia por todo canto, o doce perfume dela. Tudo estava arrumado, impecavelmente limpo. No quarto, a cama feita, mostrava uma colcha de pique alva como algodão, com dois travesseiros sobre ela, neles as iniciais do casal apareciam bordadas.
Na mesa de cabeceira a imagem de Santa Rita de Cássia tinha aos pés, um rosário antigo, carinhosamente ali depositado, um hábito muito dela.
Ainda, havia ali, um copo com água, e um diário onde ela escrevia suas memórias.
Toquei de leve o caderno fechado, e uma corrente de emoção invadiu minha alma, não fui capaz de conter as lágrimas.
Ao longe ouvi a voz de Susi (a filha da minha amiga) dizer que precisava ir embora dali, não tinha coragem para continuar. Com os olhos rasos de pranto, pediu para que eu fizesse o que tinha que ser feito, pois ela não conseguiria.
Acenou com a mão e se foi, deixando-me ali, com todo aquele mar de lembranças, de uma amiga tão estimada.
Suspirei fundo, dei-me o tempo que foi preciso para me recuperar da enxurrada de emoção, que transitava por todo ambiente, e dentro de mim. Em seguida, me encaminhei ao closet, lá encontrei o mesmo perfume impregnado em tudo, a mesma ordem, a mesma limpeza.
Vestidos pendurados nos cabides, enfileirados por cor, assim como blusas, camisas, saias. Os sapatos brilhavam de tão limpos, bem arrumados nas estantes próprias para eles, as bolsas, estavam guardadas em sacos especias para mante-las limpas. Olhei tudo, sem saber por onde começar, faltava-me coragem, para mexer naquele mundo tão dela.
Eu bem sabia, da vontade da minha querida amiga, pois sempre conversamos muito eu e ela, sobre a vida e a morte. Então, restava-me cumprir o desejo dela.
Como quem toca em coisa sagrada, peguei cada peça de roupa, dobrei cada uma com carinho, e coloquei dentro de duas malas que ali estavam.
Nessa tarefa, os soluços foram se soltando da minha garganta, e tinham o som triste da saudade e das lembranças de uma amizade verdadeira.
Nem sei quanto tempo levei para terminar algo que seria feito em minutos se não houvesse tanto sentimento envolvido.
Sai do closet puxando duas grandes malas pelas mãos. Ao passar ao lado da cozinha, um ímã me puxou para dentro. Puxei uma cadeira e me sentei, de repente por frações de segundos fui capaz de ouvir novamente partes de nossas conversas, feitas ali, ao redor daquela mesa, sempre com uma xícara de café entre as mãos.
Por entre uma cortina de pranto, olhei o local onde ela foi encontrada caida, vítima de um infarto fulminante.
Chacoalhei a cabeça, e apaguei essa imagem. Sei bem, sinto que ela está em paz. Ultrapassou com louvor as portas que separam os dois mundos.
Viveu uma vida dedicada ao bem dos seus, e de muitos desconhecidos, que ela assistiu com sua bondade única.
Levantei-me, e me encaminhei para a porta de entrada, virei para pegar as malas, e num átimo tive a impressão de que ela me olhava sorrindo, sentada em sua poltrona preferida.
Sorri de volta, e fechei a porta.
(Imagem: Lenapena)
No mês passado, uma amiga partiu dessa vida.
Na semana passada, sua única filha, que vi crescer, pediu-me que a ajudasse, a dar um destino útil aos pertences de sua mãe.
Tarefa dolorosa essa, mas como negar?
Assim que adentramos a casa, na qual minha amiga, que enviuvou há dois anos atrás, morava sozinha, um arrepio percorreu todo meu corpo e minha alma. Desde sua partida, ninguém mais tinha entrado ali.
Havia por todo canto, o doce perfume dela. Tudo estava arrumado, impecavelmente limpo. No quarto, a cama feita, mostrava uma colcha de pique alva como algodão, com dois travesseiros sobre ela, neles as iniciais do casal apareciam bordadas.
Na mesa de cabeceira a imagem de Santa Rita de Cássia tinha aos pés, um rosário antigo, carinhosamente ali depositado, um hábito muito dela.
Ainda, havia ali, um copo com água, e um diário onde ela escrevia suas memórias.
Toquei de leve o caderno fechado, e uma corrente de emoção invadiu minha alma, não fui capaz de conter as lágrimas.
Ao longe ouvi a voz de Susi (a filha da minha amiga) dizer que precisava ir embora dali, não tinha coragem para continuar. Com os olhos rasos de pranto, pediu para que eu fizesse o que tinha que ser feito, pois ela não conseguiria.
Acenou com a mão e se foi, deixando-me ali, com todo aquele mar de lembranças, de uma amiga tão estimada.
Suspirei fundo, dei-me o tempo que foi preciso para me recuperar da enxurrada de emoção, que transitava por todo ambiente, e dentro de mim. Em seguida, me encaminhei ao closet, lá encontrei o mesmo perfume impregnado em tudo, a mesma ordem, a mesma limpeza.
Vestidos pendurados nos cabides, enfileirados por cor, assim como blusas, camisas, saias. Os sapatos brilhavam de tão limpos, bem arrumados nas estantes próprias para eles, as bolsas, estavam guardadas em sacos especias para mante-las limpas. Olhei tudo, sem saber por onde começar, faltava-me coragem, para mexer naquele mundo tão dela.
Eu bem sabia, da vontade da minha querida amiga, pois sempre conversamos muito eu e ela, sobre a vida e a morte. Então, restava-me cumprir o desejo dela.
Como quem toca em coisa sagrada, peguei cada peça de roupa, dobrei cada uma com carinho, e coloquei dentro de duas malas que ali estavam.
Nessa tarefa, os soluços foram se soltando da minha garganta, e tinham o som triste da saudade e das lembranças de uma amizade verdadeira.
Nem sei quanto tempo levei para terminar algo que seria feito em minutos se não houvesse tanto sentimento envolvido.
Sai do closet puxando duas grandes malas pelas mãos. Ao passar ao lado da cozinha, um ímã me puxou para dentro. Puxei uma cadeira e me sentei, de repente por frações de segundos fui capaz de ouvir novamente partes de nossas conversas, feitas ali, ao redor daquela mesa, sempre com uma xícara de café entre as mãos.
Por entre uma cortina de pranto, olhei o local onde ela foi encontrada caida, vítima de um infarto fulminante.
Chacoalhei a cabeça, e apaguei essa imagem. Sei bem, sinto que ela está em paz. Ultrapassou com louvor as portas que separam os dois mundos.
Viveu uma vida dedicada ao bem dos seus, e de muitos desconhecidos, que ela assistiu com sua bondade única.
Levantei-me, e me encaminhei para a porta de entrada, virei para pegar as malas, e num átimo tive a impressão de que ela me olhava sorrindo, sentada em sua poltrona preferida.
Sorri de volta, e fechei a porta.
(Imagem: Lenapena)