Eu levei um pito!
 
Pois é!
Eu já nos umbrais da terceira idade levei um baita pito.
E ao escrever esta palavra já em desuso, como a educação dos jovens e o respeito aos mais velhos, a memória me atiça.

***
Foi lá naqueles idos em que as escolas eram chamadas de “Grupos Escolares” e as professoras, na transição do tratamento de “Donas” para “Tias”, que se usava com frequência o “pito”.
Fazíamos filas no pátio da escola por ordem de tamanho: os menores na frente e os maiores atrás – havia uma finalidade para isto. Havia também a fila dos meninos e das meninas. Na fila dos meninos dizia-se de forma jocosa e maliciosa:


 
- Vamos ficar quietos porque senão a Dona Fulana passará o pito em quem estiver bagunçando!

Riámos até! Mas quando a professora chegava à frente da fila bastava o seu olhar que percorria do menor ao maior, o último. Tudo se silenciava e íamos para a sala de aula aprender a nos socializarmos e nos informarmos do saber.
O olhar da mestra suscitava o respeito e nem precisava que ela passasse o seu pito: sua repreensão.
Em casa tínhamos a formação de valores.

***
Entramos no elevador do hotel: eu, um casal e seus dois filhos.
A mãe lembrou que se esquecera de comprar algo na rua. E antes que se apertasse o botão que faria aquele transporte funcionar ela saiu às pressas. O garoto que estava no colo do pai começou a chorar e a gritar. O pai nem apertava o tal botão e nem acalentava o filho que passou a se esgoelar e espernear.
Neste ínterim eu perguntei o número do andar em que ficavam os seus aposentos e fui logo acionando o elevador. Foi o suficiente para que o filho de uns cinco anos de idade começasse a reclamar fazendo bicos e choramingões. Foi quando eu levei o pito do pai:

- O senhor deveria ter deixado o garoto apertar o botão! Ele queria fazer isto e havia me pedido desde lá fora no passeio, como se eu tivesse a obrigação de saber dos acordos familiares íntimos.

Eu me encolhi no cubículo espelhado e aquele pirralho passou a pular e apertar sucessivamente os botões da geringonça elétrica e ainda olhava para mim de forma vitoriosa. Fomos para o mesmo andar e não houve  palavras de despedidas. Eu estava repreendido e os três vencidos.
***
Levar um pito na terceira idade é um luxo!
Porque a formação e princípios dados pelos atuais pais aos filhos estão um lixo!
Vive-se um caos de permissividade.
Por isto vemos crianças cheias de mimos, adolescentes sem referências e jovens adultos com atitudes infantis.
Vivemos em uma sociedade que entregou a educação formativa, que era responsabilidade da família, para a escola que deveria dar a formação social e informativa.
A sociabilidade... Ficou esquecida! Para os padrões da atualidade o importante são as vontades de cada um.
Que o mundo se exploda e não tenha tim tim! Não vai demorar muito e eu estarei no andar de cima tocando bandolim.





Leonardo Lisbôa
Barbacena, janeiro de 2016.

 


 
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Leonardo Lisbôa
Enviado por Leonardo Lisbôa em 13/02/2016
Reeditado em 16/02/2016
Código do texto: T5542424
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