Os seres não queridos
Ao assistir as telenovelas e os filmes românticos, ao ler os meus livros preferidos, ao observar a vida em geral constatei que o amor é o sentimento que está presente em tudo. Neste exato momento, enquanto escrevo, escuto a música Love me Harder – Ariana Grande feat. The Weeknd, que por sinal fala de amor. Entretanto, cheguei a outra conclusão... Comprovei que tudo o que tinha para ser escrito sobre o amor, já foi feito com muita verdade. Poucas pessoas tem o privilégio de dizer que foram muita amadas. A maioria, mesmo com uma faca no pescoço, não confessaria que são traficantes, ladras ou guerrilheiras do amor. Que bela imagem seria se víssemos no cemitério nos túmulos: “Aqui jaz alguém que amou e foi amado”.
Concordo com a ideia de que o amor é realmente a única coisa que dá sentido à vida. E muitos já deixaram essa impressão sobre ele. Sim, porque há aí inúmeras frases inquietantes sobre o tema. Shakespeare disse: as viagens terminam com o encontro dos apaixonados. Que ideia extraordinária! Você já imaginou ter aquele alguém, que você pensa constantemente, te esperando ansiosamente do outro lado do vasto coração? É realmente lindo. Confesso, pessoalmente, que nunca experimentei nada ou algo parecido. Porém, acho que o Shakespeare tenha experimentado.
Suponho que penso no amor mais do que deveria. Sou muito curiosa. Admira-me constantemente seu poder esmagador de alterar rotas e definir nossas vidas. Deve ser por isso que o amor é cego (li em algum lugar que Shakespeare disse isso). Pois bem, estou segura de que isso é verdade. Pois tenho visto amores deixarem as pessoas irracionais, cegas, surdas, com o olhar fixo no seu objeto de amor e devoção.
Suspeitei, por um instante, que a psicanálise havia fracassado, pois Freud sempre disse que o desejo nunca é preenchido, que se o é, o é por frações de segundos, e que a vida é insatisfação e procura. Contudo, o verdadeiro amor nos mostra que nosso mais sublime desejo pode ser saciado, nossa procura pode chegar ao fim e nossa insatisfação pode se transformar em felicidade. Existem vários tipos de amor: de infância, à primeira vista, amizade, construído ao longo dos anos, de mãe, o verdadeiro, o único e o grande. Para algumas pessoas o amor se apaga de forma inexplicável. Para outras, o amor sutilmente se vai. Para outros mais, o amor singelamente aparece e faz ninho.
Como Arnaldo Jabor, “o amor deixa a muito desejar”. Principalmente quando se trata de uma classe em questão: amor mais cruel, aquele que praticamente mata as suas vítimas (malditas setas sem ponta e direção do Cupido) – o amor não correspondido. Nesse tipo, bom.... Sou experiente, quase tenho diploma. Não por acaso, Bilac, que parece ler os meus pensamentos e sentimentos, em sua máxima salomônica, diz: “Eu tenho amado tanto e não conheço o amor”. Aliás, Salomão foi um grande amante. Como será que ele conseguiu amar tantas esposas e concubinas? Bem, acho que só ele poderia revelar o seu segredo.
Como boa observadora e com uma devoradora de livros românticos, percebi que a maioria (quiçá, todas) das histórias de amor trazem amantes que se apaixonam perdidamente um pelo outro. É tão generalizado esse modelo, que mesmo mudando o gênero e as circunstâncias, adivinha, sempre terá o fofo casal apaixonado, geralmente providos das mais altas qualidades. Mas, me pergunto, que graça teria se fosse diferente?
Mas o que acontece com os demais? E a minha e a sua história? Nossas desventuradas histórias? Aquelas em que nos apaixonamos, mas por azar ou travessura do destino, amamos sozinhos? Somos vítimas de uma aventura unilateral, nosso enredo é solitário e, francamente, é triste, com um toque de decepcionante. Talvez por isso ninguém conte nossa história. Quem iria querer saber de uma andar solitário e dolorido. Somos os amaldiçoados de não ter ninguém que nos considere queridos. Somos os seres não queridos. Os feridos que se valem por si mesmos. Somos os incapacitados sem estacionamento reservados no coração de ninguém. O amor nunca tira férias, mas quando chega a nossa vez, após uma longa fila, ele resolve tirar uma folga.
O pior é que ver uma pessoa amando é como ler um romance de amor. É como sentar no sofá e assistir um filme de amor recheado com pipoca e brigadeiro. Acredito que se ama por contaminação. A estória pode ser para o outro, mas as páginas são foleadas pela gente. Assim como todo jardineiro o é porque não pode ser flor, eu sou uma apaixonada pela vida, por enquanto.... quem sabe, logo passa a minha sina de ser não querido.