Porque é Carnaval
Esquentaram cuícas e tamborins, próprios do ritmo místico sem melodia; treinaram mulatas e mulatos; desceram do morro à compra de enfeites, e depois de cansativos ensaios, repetidos passos e medidos movimentos, construíram escolas e blocos. Enfim, prontas e prontos aos desfiles para suarem, à luz do sol, da lua, bem mais do que no do trabalho quotidiano ou na procura de trabalho. Dos esforços espontâneos e obrigatórios resultaram imensas "escolas de samba" com trabalhadores e desempregados.Não se fale que isso é ilusão, porque é Carnaval...
Esquecem tudo; entram em transe frenético de braços e pernas bailarinas; pela “avenida", acompanham desacompanhados; vagueiam, sem destino; a memória canta marchas antigas, e a vaidade, novo samba-enredo. Quem é o mascarado de comportamento extravagante? Atraem multidões para verem sempre a mesma coisa ou detalhes diferentes dos carnavais que já se foram. Sérias pessoas vestem-se de sacerdote, de freira, mas com caras de orgia e profanas palavras... Sem ensaio, acontece também o "autêntico" carnaval: Qualquer fantasia, roupas de casa que servem para desinibir o "gênero" reprimido. O Carnaval se justifica: Ninguém é de ferro para suportar o peso do ano inteiro sem três dias para dançar. Enfim, a humanidade sempre recorreu a folguedos para exorcizar fantasmas, angústias.
Lá vem Chico Buarque: "(...) Quem é você, diga logo / Que eu quero saber o seu jogo / Que eu quero morrer no seu bloco (...) Vou beijar-te agora / Não me leve a mal / Hoje é carnaval !..." Dizem: "O que é bom dura pouco", até carnaval. Pierrô chorará a ausência de Colombina; cairão máscaras, eflúvios, lágrimas, sorrisos, mentiras e juras de amor. A realidade voltará à rua: Ressacas, trabalho, deslembranças, saudades ou alguns arrependimentos. Mas, valeu a pena, se, no Carnaval, tiver nascido ou renascido alguma história de amor.