O FIM DO FUTURO

Não faz muito, comecei a ler um livro indicado como #1 da semana pelo New York Times. A estória real foi escrita por jovem médico que descobre estar com câncer já em estágio avançado. Ainda não terminei a leitura e não darei “spoiler” aqui mas, apenas para contextualizar, o livro conta a trajetória desde a descoberta da doença até a sua morte e o modo como ele, mesmo sendo médico e portanto acostumado a lidar com o fim da vida, encara o seu ultimo ano (ou menos).

Há um ano atrás li um texto escrito por um renomado médico britânico que trabalha com pacientes com câncer, onde ele afirma que morrer desse doença é a melhor forma de morte possível por possibilitar ao paciente se despedir de amigos queridos, familiares, visitar lugares pela última vez e se organizar para o seu fim.

A minha percepção ao ler (até agora) o livro e o texto descritos acima é a simplificação do sentimento real ao estar diante de uma doença tão séria. Ignora-se o sentimento de revolta, culpa e medo que passa pela cabeça dos pacientes e pessoas próximas, passando a imagem de ser um ritual fácil, meio poético e até mesmo bonito de certa forma. No entanto, a realidade para a maioria das pessoas que precisam enfrentar o câncer não é bem assim.

É claro que cada pessoa possui uma opinião, uma postura diante a vida e um ponto de vista mas aqui darei o meu. Não tenho e nunca tive essa doença mas tenho em minha família uma pessoa muito próxima que atualmente sofre com esse mal.

Ao receber a notícia de que uma pessoa muito próxima estava com essa doença o meu mundo parou! Não é exagero quando eu digo que a sensação no momento em que eu recebi a ligação da minha mãe aos prantos anunciando sobre o diagnóstico do meu pai foi de que o relógio da cozinha tinha parado de funcionar e o mundo parado de girar. Era como se aquele instante tivesse sido congelado e aos poucos as coisas começassem a voltar ao seu lugar.

Eu me lembro que o meu primeiro sentimento foi de culpa. Culpa por não ter insistido que meu pai comesse melhor, culpa por não ter brigado mais vezes sempre que ele terminava uma refeição em 5 minutos (e ainda achava graça disso), culpa por não te-lo obrigado a ir ao médico com mais freqüência e culpa por morar tão longe e não poder estar com ele nesse dia tão difícil.

No começo, o sentimento de impotência fica por conta do repetido diagnostico e prognóstico desfavorável passado por cada oncologista especializado que você vai. Nesse ponto, o único que me restou foi acreditar que este caso seria uma exceção (um milagre, como eles dizem).

Ao mesmo tempo que precisamos lidar com a dor de saber o provável final dessa história, precisamos manter o ânimo, sem deixar a peteca cair.

Outro ponto negativo dessa doença é o desgastante emocional de vivenciar todas as etapas da doença de perto. Quase um ano depois, sinceramente ainda não sei qual a etapa mais difícil. Por morar longe do meu pai (atualmente em outro país) fico de fora de muita coisa e não sinto todas as dificuldades do tratamento e da evolução da doença como o meu irmão que está ao lado dele todos os dias. É difícil.. Mesmo com a tecnologia de hoje (skype, whatsapp, email, telefone etc) a distancia as vezes aperta e o sentimento de não estar presente para dar mais apoio, logo torna-se culpa. Não sei como outras pessoas se sentem no meu lugar mas passado alguns episódios, as vezes fica até mesmo difícil mesmo manter a esperança.

Alguns podem pensar: “- Mas você está longe porque quer!” Bom, o objetivo desse texto não é justificar minhas ações e tomadas de decisões, até porque não devo explicações da minha vida a ninguém, mas confesso que seria muito mais fácil tomar uma decisão dessas se o impacto fosse apenas em mim e não na vida do meu marido ou filho.

Voltando ao texto, a verdade é que câncer é sim uma porcaria de doença e que o fato de permitir que o paciente possa “se programar” para se despedir de amigos e familiares não o torna nada melhor. Pelo contrário! Só quem já passou por essa situação sabe o quão sofrido é ver o seu ente querido, o seu super herói se transformar em pouco tempo em um pintinho acanhado.

Do ponto de vista do paciente, não consigo imaginar o quão reconfortante pode ser saber que seus dias estão de esgotando e que de agora em diante você deverá passar grande parte deles sofrendo com os efeitos da quimio e radioterapia cujo único cunho é paleativo.

Não quero alongar ainda mais esse texto então para finalizar pergunto: se para vivermos a vida precisamos olhar para frente, como fazer isso quando se está ciente do fim do futuro?

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Cafe Donuts
Enviado por Cafe Donuts em 03/02/2016
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