CAUSOS DA ADOLESCÊNCIA - ZITO E EU

O Mercadão Municipal de Santa Maria da Vitória, situado na Praça dos Afonsos, foi construído aos moldes coloniais, com quatro entradas, quatro corredores internos, com quatro lojas em cada um. Dentro, ao centro, quatro colunas de alvenarias que sustentam o telhado que é construído de armação de madeira de lei em uma arquitetura que é uma verdadeira arte de carpintaria culminado com as telhas de olaria.

O Mercadão nos anos setenta funcionava como um dos maiores centro de armarinhos e lojas da cidade. Dos lados externos havia lojas de propriedades de Seu Biú, Pedro Almeida, José Braga, alguns outros que não me lembro de cabeça neste momento ficando na parte situada no beco da farmácia do João Alexandre, o complexo de açougues da cidade com alguns açougueiros conhecidos como, Tião, Givaldo, Isaías, Mariano, Magarefe, Bainhoe outros mais.

O Mercadão também funcionava como o maior ponto de encontro, principalmente nas lojas de Cícero de Ferreirnha, que largava a venda para ir jogar damas em frente da barbearia Estrela, na segunda loja do comerciante Antero, comandada pelo seu filho Zito, na loja de Dona Lindaura, quando ela saia para o almoço e eu ficava no comando, a loja de Adão Bodeiro comandada pelo Adenaldo, a loja de Herculano, com seu Filho Leônidas, a loja de Netinho e do maior contador de piadas, o Salvador, e as barracas do Doca que tomavam conta de toda a parte central do mercadão. Eram nestas lojas que se realizavam todas as resenhas de futebol, de cinema, de mulheres, de politica, de música, de piadas etc.

Todas as pessoas que circulavam da rua de baixo para a rua de cima e os da rua de cima para a rua de baixo, e vice versa, passavam por dentro do mercadão para comprar alguma coisa ou botar o papo em dia: Vidigal, Lily, Protógenes, Vavá, Milton Borba, Pedro Almeida, Adão Bodeiro, Antonio de Agostinho, Tutes, Rosi Soldado, Novais, Antonio Rosinha, Zé Leite, o irmão de Chiquinho do Bar, Griga, Bochecha, Cebola, Wanderléia (uma louca) eram algumas das pessoas notáveis que assinavam ponto no Mercadão.

Sonélio, Leônidas, Zito e eu, éramos os personagens principais da ala jovem do mercado, juntamente com Deínha de Cazuza, e o Adenaldo.

Também ao redor do mercado e a parte externa completavam o nicho de encontros se estendendo até o cais, onde havia pontos de venda de arroz, sal, feijão, açúcar e óleo e lá trabalhava um amigo e colega nosso, de nome Pedro, apelidado de Pedrinho do Sal e ali fazíamos roda de prosas, às vezes ele era repreendido pelo seu patrão, o dono das mercadorias.

Zito de Antero, quando não estava atendendo cliente, estudando ou batendo papo, dedilhava o seu violão. Naquela época ele já demonstrava ser um violonista de mão cheia e estudava as notas a fundo e tocava classicamente como o João Gilberto. Tinha uma preferência por músicas de Chico Buarque de Holanda e Milton Nascimento e outros da MPB. Nesta época eu era apaixonado por Ivandi, irmã de Adenaldo e Zito era apaixonado por uma prima de Goiânia.

Muito observador, Zito, certa vez veio conversar comigo.

- Joãozinho, olha aquelas meninas que estão sempre na venda do Adenaldo! Elas pegam produtos e não pagam um tostão a ele. Ai tem sugesta e vou descobri, desafiou Zito.

Zito de fato descobriu que Adenaldo e Djalma de Joel estavam comendo as meninas e pediu para que eles as indicassem para nós, Zito e Eu. As meninas foram apresentadas e combinamos com elas que seria naquele sábado à noite no parque da vaquejada, por ser um lugar afastado da cidade, já no final do riacho e por ser um dos lugares sempre escolhidos para os deleites avulsos.

Naquele sábado à tarde, as professoras Ítala, Arturzita , dona Norma( esposa do Dr. Libório Juiz de direito da comarca) montaram uma peça de teatro onde elas seriam protagonistas e convidaram alguns alunos dentre eles, Zito, Lucival e eu para participarmos da peça. Zito seria fundamental por causa do violão. Participamos do ensaio cuja apresentação seria à noite às vinte horas no próprio sábado.

Zito e eu combinamos que encontraríamos as meninas e depois iríamos para o Centro Educacional Santa-Mariense. Encontramo-nos no Jardim Jacaré e rumamos para o parque da vaquejada. Até havia um casal lá. Inclusive ouvimos o cara dizer para a moça que usava uma saia branca: Quero ver seu pai e sua mãe não aceitar o nosso casamento!

O casal foi embora e Zito e eu ficamos ali à espera das garotas e nada de elas chegarem. Aos poucos a nossa expectativa se transformou em ansiedade e depois em raiva. Desapontados, saímos à caça pelas meninas. Vasculhamos o Bairro do Malvão, o Alto do Cruzeiro, o Alto do Menino Deus, Sambaba, saída de Correntina e nada. Desolados, fomos para o jardim Jacaré e lá encontramos alguns colegas e amigos, dentre eles Ruy de Morais e Lucival.

- Dona Norma está furiosa, com vocês dois. Falou Lucival.

Foi ai que nos demos contas de que no afã da busca das garotas nem nos lembramos da peça e agora estaríamos numa enrascada danada.

- Tamo lascados! Falamos.

- Dona Norma quer falar com vocês dois na segunda feira! Completou Ruy de Morais.

A segunda feira chegou e para não passar a frente da casa da dona Norma, eu passei pelo beco de João Augusto e pela rua do cais e na rua de acesso do lado da casa de Tenente, fui para o colégio e o Zito fez o mesmo caminho. Até ai tudo ótimo. Sabíamos que não poderíamos fugir de dona Norma pela vida inteira, afinal de contas ela dava aulas no Centro Educacional Santa -Mariense e inevitavelmente ela nos pegaria. Os amigos e colegas já nos passavam este detalhe.

Assistimos às aulas normalmente, Zito na sala dele e eu na minha. No intervalo, distraidamente, saímos normal com todos do colégio e quando estávamos passando à frente da casa da dona Norma , ela, que provavelmente já estava na expectativa da nossa passagem.

- Vocês dois, venham até aqui por favo, quero falar-lhes!

Era dona Norma, que tomava um cafezinho, ou um chazinho, também não nos interessava o que ela tomava naquele momento, pois quem precisava de um chazinho éramos nós.

- Aguardem aqui que já volto. Ela entrou na casa para guardar a xícara e nós ficamos ali em pé ao lado da grade da casa loucos para darmos no pé mas não tivemos a devida coragem.

- E agora? Pergunta Zito

-Vamos dar uma desculpa se colar colou! Falei.

Sei não! Zito estava parecendo um tomate maduro.

Dona Norma retorna, se senta na confortável cadeira de descanso ali na área da casa.

- Que papelão vocês fizeram! Compromisso é compromisso e vocês tinham que honrá-lo.

- Não nos informaram que a peça seria no sábado à noite. Para nós seria no domingo. Ninguém avisou! Menti descaradamente!

-Todos sabiam que era sábado à noite! Só vocês dois?

- Dona Norma, eu adoro tocar violão! Eu jamais deixaria passar uma chance dessa? Mentiu Zito, descaradamente.

-Estão perdoados, sendo assim, mas prestem mais atenção da próxima vez, respondeu dona Norma que aceitou as nossas ponderações mentirosas. Inda bem que não fomos interrogados pelo marido dela que era juiz. Certamente ele saberia que estávamos mentindo.

A nossa história não terminou aqui. Com relação à peça terminou tudo bem.No mercadão Zito encostou o Adenaldo na parede e descobriu que tinha sido ele e Djalma os responsáveis pelo cano das meninas e ameaçou botar a boca no trombone, se eles não deixassem as meninas nos atenderem , e eles tremeram na base.

Era um feriado que caiu no meio da semana. A noite estava quente, céu limpo estrelado e Zito e eu, seguimos para o parque da vaquejada e desta vez as meninas estava lá. Cada casal subiu em uma plataforma, uma espécie de palcos confeccionados de madeira para os locutores e juízes da vaquejada. Foi uma noite maravilhosa para dois adolescentes. Naquela época, em Santa Maria da Vitória, dificilmente se conseguia este tipo de gandaia. Ou era o brega Pingo D’Água ou ...................

Felizes da vida, rindo para o céu, para as ruas, para as pedras, para o rio Corrente, e com a alma e o corpo sorrindo para o mundo, Zito e eu rumamos para o jardim Jacaré e lá, na parte alta do jardim, totalmente lotado de pessoas por causa do feriado e a noite quente, saboreando a brisa que emanava do rio e o barulho das águas, os amigo, que estavam sentados no chão em forma de rodas batendo papos descontraídos, em um dos cantos, eles nos convidaram para fazermos parte da conversa. Maristela Queiroz e Vanda irmã de Adenaldo faziam parte desta roda de conversas.

- Onde vocês estavam meninos que estão todos sujos de areia! Exclamam Maristela e Vanda diante dos olhares de todos ali da roda.

Foi ai que nos demos conta de que estávamos com cotovelos, calças, camisetas todas sujas de poeiras das areias do parque da vaquejada, e sem ter onde enfiar a cara e sem palavras, e, diante das risadas dos amigos nós corremos para o rio para tentar tirar o pó do corpo e da roupa. No meu caso tive que ir para casa tomar banho e trocar de roupa, e não tive coragem de voltar para o jardim. Não sei como Zito ficou se foi embora para casa ou continuou ali com a turma no jardim Jacaré. Só sei que rendeu uma resenha danada!