Saindo do Palácio Duque de Caxias, onde precisei buscar documentos, um garoto se aproximou de mim hesitante, levantando a camiseta (como se quisesse demonstrar que estava desarmado) e me fez um pedido.

- Padrinho, não sou ladrão. Minha filha e mulher estão ali – apontou para uma moça acompanhada de uma menininha embaixo de uma árvore – elas têm sede e queremos voltar para casa, em Saracuruna. Perdi meu dinheiro, me ajuda, padrinho.

Encarei aquela família vestida com simplicidade e disse que poderia oferecer um lanche e dar as passagens para o trem. O rapaz sorriu acenando para a esposa e ela veio com a filha. Eu os acompanhei até uma lanchonete na Central. Enquanto comiam e bebiam, reparei que ficavam mais alegres, mais falantes e perdiam o ar soturno. Juntos, fomos ao guichê da estação, comprei os tickets e entreguei ao jovem. A mulher me cumprimentou, a garotinha abraçou-me na cabeça com um beijinho molhado no meu rosto e ele agarrou efusivo a minha mão como se tomasse a benção.

 
- O senhor me lembrou meu pai. Obrigado, padrinho – agradeceu-me.

Não saberia identificar a razão do sentimentalismo piegas que me possuiu. Talvez por não ter filhos, aquilo me comoveu com uma brutalidade insuportável. Ainda os observei festejando na plataforma, antes de recuperar o meu rumo. Quem olhasse à distância, talvez confundisse o significado da cena. A verdadeira penúria não estava na família pobre que agora sorria viajando para o lar longínquo; a miséria real se arrastava em sapatos bem cuidados, caminhando sozinha em direção ao metrô, contendo a emoção, com o estômago farto e a alma deserta.
Alexandre Coslei
Enviado por Alexandre Coslei em 31/01/2016
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