Síntese dos eventos de 1964
 
Luiz Carlos Pais
 
Os traços coletados nesse retorno ao território distante e íntimo da nossa infância individual e coletiva são de significado muito mais existencial do que histórico. Não tive a pretensão de postular o mérito de um trabalho de natureza histórica, o que não pertence à minha área de atuação acadêmica. Mas penso que os vários documentos indicados no texto, muitos deles disponíveis no site do Arquivo Público Mineiro, podem servir como fonte para a realização de outros trabalhos.

Essa reflexão feita depois dos momentos mais calorosos permite avaliar a importância de preservar e defender valores assumidos em favor de ideais humanos, sociais e democráticos. Assim, é preciso aprender a respeito das consequências dos atos assumidos por cada protagonista da histórica, sem perder de vista os conflitos institucionais envolvidos naquele momento. Por certo, ao fazer esse tipo de avaliação, há um nível muito difícil de detalhar que é a intimidade emocional de cada um que vivenciou e assumiu sua experiência de vida.

Um dos aspectos mais externos dessa questão, no sentido de permitir certa referência objetiva, foi a prática exercida pelos órgãos da repressão política e social de manter uma constante vigilância sobre da vida das pessoas fichadas em seus arquivos. Por vários anos seguidos depois de 1964, alguns paraisenses que vivenciaram essa experiência pessoal tiveram dificuldade em obter documentos públicos devido ao atestado de antecedentes fornecido pela Secretaria de Segurança Pública do Estado.

Esse retorno oportuniza homenagear todos aqueles que viveram os episódios locais ocorridos há meio século, incluindo autoridades, militares e amigos que foram solidários nos momentos mais incertos não somente dos detidos como de seus familiares. Nesse sentido, graças ao empenho solidário do então deputado estadual paraisense Delson Scarano que assinou um termo de custódia, os paraisenses foram liberados, depois de dez, com o compromisso de responderem ao inquérito.

Depois de exercer mandato de Deputado Estadual, Delson Scarano exerceu mandato de Deputado Federal, quando se empenhou para o progresso da cafeicultura. Mesmo sem vínculo partidário com a orientação ideológica de esquerda, sua postura humanitária esteve acima do que qualquer questão de menor importância. Membro de uma grande família de imigrantes, como tantas outras que formam uma base social expressiva de Paraíso, antes de defender relevantes projetos políticos em prol da cidade e região junto à Câmara Federal, foi deputado estadual por Minas Gerais, pelo PSD, na legislatura de 1963 a 1967. Quando seus conterrâneos paraisenses estiveram detidos em diferentes presídios de Belo Horizonte, juntamente com centenas de outros presos políticos mineiros, ele não se omitiu em prestar sua solidariedade pessoal e empenho para tentar a liberação do grupo. Nesse sentido, como a intenção deste livro é registrar uma modesta homenagem a esses personagens recentes da história local, o nome do deputado Delson Scarano não poderiam deixar de ser destacado.

Em termos de ação prática, o deputado deve a coragem de assinar como responsável pela custódia que possibilitou a liberdade provisória de alguns paraisenses que foram submetidos a inquéritos policiais militares, entre os quais estava José Paes, João Eduardo de Vasconcelos e outros. Além desse apoio imprescindível e fundamental para a obtenção da liberdade imediata, ele também colocou sua própria residência para abrigar os paraisenses, assim que foram liberados da prisão, fornecendo-lhes as condições materiais de higiene pessoal e alimentação. Nenhum deles dinheiro para custear o pagamento da viagem de retorno de ônibus a São Sebastião do Paraíso. Mas o deputado Delson Scarano providenciou os valores necessários para custear o sonhado retorno. Esse gesto humanitário não foi nunca esquecido por seus amigos e eternos eleitores.