Geraldo Borges Campos (Peba) (1964)
Luiz Carlos Pais
Luiz Carlos Pais
Natural de São Sebastião do Paraíso, Estado de Minas Gerais, Geraldo Borges Campos (Peba) nasceu em 1911 e faleceu em 1967. Era barbeiro e líder trabalhista. Filho de João Borges Campos e de Isaura da Silva Campos. Casou-se com a professora e escritora Antonieta Símaro Campos, com quem teve o filho José Francisco Calazans Morato Campos. No início da década de 1960, sua barbearia localizava-se à Avenida Ângelo Calafiori. Lembro-me quando ele cortava meu cabelo. A barbearia estava sempre repleta de clientes. Aos sábados o movimento era bem maior porque os trabalhadores rurais vinham à cidade fazer compras e aproveitavam para cortar o cabelo e se inteirar dos ocorridos políticos. Entre uma tesourada e outra, todos ficavam atentos às suas claras posições políticas em favor dos trabalhadores. Peba era eloquênte e tinha raciocínio rápido.
Atencioso com os mais humildes, o conhecido barbeiro conhecia os direitos trabalhistas. Essa consciência política o levou a fundar um sindicato para defender os trabalhadores rurais. Grande parte destes trabalhadores não sabia ler e nem fazer os cálculos corretos para receber seus salários, por vezes, eram pagos anualmente. Recorriam então ao líder trabalhista para fazer os cálculos. Essa militância trabalhista incomodou os patrões que ainda não pagavam o salário mínimo. Em caso de dúvidas, trabalhadores rurais de Paraíso recorriam ao Peba que os auxiliava a redigir cartas ao promotor local, reivindicando seus direitos trabalhistas. A estratégia funcionava porque a justiça determinava o pagamento dos valores devidos. Por esse motivo foi preso, pela primeira vez, em 1956.
Muitos trabalhadores rurais que não tinha condições de pagar os serviços de um advogado diplomado recorriam a um “advogado prático” ou rábula, como era chamado esse tipo de assistente social naquele tempo. Mesmo não sendo portador de um diploma superior, tinha sabedoria suficiente para reivindicar justiça. Essa atividade era reconhecida pela justiça de outrora, quando a defensoria pública tinha pouca abrangência. Em entrevista recente concedida ao jornalista Leonêncio Nossa, Antonieta destaca esse engajamento de Peba na defesa dos trabalhadores rurais.
Um novo salário mínimo tinha sido aprovado pelo presidente Juscelino e Peba queria esclarecer para os trabalhadores o valor que deveriam receber. Os mais humildes tinham dificuldades em ter informações sobre seus direitos. Este boletim foi usado como pretexto para justificar a sua prisão em novembro do mesmo ano. A divulgação do boletim estava aliada ao projeto de fundar o primeiro sindicato de trabalhadores rurais da cidade. Mas, essa iniciativa pioneira envolvia o desafio de enfrentar a reação da ordem política estabelecida. Uma das consequências dessa reação foi sua primeira detenção, ocorrida em novembro de 1956,
O delegado disse que havia recebido “ordens superiores” para efetuar sua detenção, que gerou o depoimento prestado no dia 10 de novembro de 1956. Como o Partido Comunista tinha longo histórico de períodos alternados de atuação na legalidade e na clandestinidade, tentaram lhe imputar a acusação de ser adepto do “credo vermelho”, mas Peba sempre tinha sido filiado ao PTB e não tinha vínculo partidário com os comunistas. A íntegra do documento esclarece que o principal motivo da sua detenção a distribuição do boletim. Conforme a íntegra do documento, o delegado perguntou se ele havia pertencido às fileiras do partido comunista. Peba respondeu ao delegado que jamais havia pertencido a este partido e que era defensor dos princípios trabalhistas, justificando sua atuação junto às fileiras do Partido Trabalhista Brasileiro.
As perguntas do delegado revelam a preocupação de alguns fazendeiros quanto a sua intenção de Peba de organizar um sindicato. Alguns operários já estavam começando a exigir os seus direitos trabalhistas. Despertar essa consciência, no contexto da época, foi visto como atividade subversiva. Peba escreveu ao presidente Juscelino, em novembro de 1956, agradecendo, em nome dos trabalhadores, o aumento do salário mínimo.
Peba escreveu uma carta, em 10 de novembro de 1956, ao governador Jose Francisco Bias Fortes para esclarecer os motivos pelos quais tinha sido preso pelo delegado de São Sebastião do Paraíso. Nesta carta, o líder sindical relata que fora preso, por distribuir boletins com o esclarecimento aos trabalhadores sobre os valores do novo salário mínimo instituído pelo presidente Juscelino. O delegado teria confiscado dois certificados expedidos pelo PTB, não respeitando tratar-se de uma agremiação política amparada pela legislação da época. Ao livrar-se do incômodo, Peba comunicou o ocorrido ao governador de Minas, solicitando esclarecimentos quanto às supostas ordens superiores.
O líder trabalhista enviou ofício ao Ministério da Justiça, em fevereiro de 1957, solicitando proteção ao Presidente Juscelino, por ocasião de uma visita que ele faria à capital mineira, em razões de ameaças publicadas na imprensa. Este documento chegou ao departamento encarregado e foi enviada solicitação à Secretaria de Segurança Pública de Minas Gerais, em 20 de ofício de 1957.
No relatório elaborado pelo delegado regional de Passos constam os nomes de 17 testemunhas de acusação contra os indiciados. [Documento 68 da pasta 0005 do APM]. Mas, antes de tratar de cada um dos acusados, o delegado descreve aspectos do cenário geográfico e social da cidade de São Sebastião do Paraíso. No entendimento do delegado, a cidade tinha uma sociedade constituída de uma base agrária e que cultivava “um forte sentido de feudalismo”. O relatório destaca outras condições do contexto social nas quais as supostas agitações teriam ocorrido.
Após busca realizada pelos militares nas residências dos presos, nada foi encontrado para justificar algum ato ilícito. Após descrever aspectos sociais da cidade, o delegado passa então a descrever o que chama de “fatos” que levaram à instauração do inquérito. Omitindo o nome do militar que efetuou as prisões, o delegado informa que os paraisenses foram presos por “militares do 12º Batalhão de Infantaria” e levados para Belo Horizonte. Argumenta ainda que os indiciados recambiados para a cidade teriam sido colocados liberdade sob custódia.
Porém, estando os paraisenses em liberdade provisória, com base na custódia assinada pelo deputado Delson Scarano, na fase inicial do inquérito, Geraldo Borges Campos e Braz Alves Vieira voltaram a ser detidos. Quanto ao líder petebista, o delegado destaca que o mesmo era presidente do Partido Trabalhista Brasileiro local e que o mesmo teria sido candidato, por duas vezes, a prefeito da cidade. Era também presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Destaca ainda o seu “temperamento impetuoso” e a qualidade de mesmo não tendo curso superior ser um homem brilhante. Após essas descrições gerais, o delegado apresenta a suas conclusões sobre o indiciado, afirmando que com a sua atuação no sindicato teria criado inimigos na cidade e a situação se agravava com a publicação de um jornaleco. O delegado conclui o relatório, afirmando que o indiciado poderia ser considerado um político trabalhista, mas nunca um comunista.
Quase quatro décadas depois de 1964, o governador de Minas, Itamar Franco, assinou o decreto no 42.401, de 05 de março de 2002, indenizando o primeiro grupo de 53 vítimas de tortura praticada por agentes estaduais. No caso das pessoas falecidas o poder público concedeu reparação às famílias. Entre os indenizados por este decreto está Geraldo Borges Campos, falecido 35 anos antes da reparação oficial. No mesmo documento consta a indenização da economista Dilma Rousseff. [www.conselhos.mg.gov.br] A mais alta corte da justiça militar do país reformulou, por unanimidade de votos, a sentença do Conselho Permanente de Justiça para o Exército, absolvendo os dois das acusações que havia sido intentada. No referido o documento, o juiz relembra que Peba havia sido incurso no artigo 11, letras a e b, parágrafo terceiro e artigo 11 da Lei número 1802 de 1953. Mas, o Juiz Auditor da 4ª Região Militar, em 28 de julho de 1967, comunicou ao Secretário de Segurança Pública que Geraldo Borges Campos e Braz Alves Vieira foram absolvidos pelo STM.
Benedito Campos, irmão de Geraldo Borges Campos, embora não tenha sido levado preso para Belo Horizonte, foi molestado pela polícia na cidade, talvez pelo fato de ser filiado ao PTB, legenda pela qual foi candidato a vereador por duas eleições, quando Peba foi candidato a prefeito. Benedito foi impedido por militares de viajar para Ribeirão Preto, SP, sendo obrigado a retirar-se do ônibus no qual estava embarcado. Os militares alegaram que ele estaria tentando fugir da cidade.
Atencioso com os mais humildes, o conhecido barbeiro conhecia os direitos trabalhistas. Essa consciência política o levou a fundar um sindicato para defender os trabalhadores rurais. Grande parte destes trabalhadores não sabia ler e nem fazer os cálculos corretos para receber seus salários, por vezes, eram pagos anualmente. Recorriam então ao líder trabalhista para fazer os cálculos. Essa militância trabalhista incomodou os patrões que ainda não pagavam o salário mínimo. Em caso de dúvidas, trabalhadores rurais de Paraíso recorriam ao Peba que os auxiliava a redigir cartas ao promotor local, reivindicando seus direitos trabalhistas. A estratégia funcionava porque a justiça determinava o pagamento dos valores devidos. Por esse motivo foi preso, pela primeira vez, em 1956.
Muitos trabalhadores rurais que não tinha condições de pagar os serviços de um advogado diplomado recorriam a um “advogado prático” ou rábula, como era chamado esse tipo de assistente social naquele tempo. Mesmo não sendo portador de um diploma superior, tinha sabedoria suficiente para reivindicar justiça. Essa atividade era reconhecida pela justiça de outrora, quando a defensoria pública tinha pouca abrangência. Em entrevista recente concedida ao jornalista Leonêncio Nossa, Antonieta destaca esse engajamento de Peba na defesa dos trabalhadores rurais.
Um novo salário mínimo tinha sido aprovado pelo presidente Juscelino e Peba queria esclarecer para os trabalhadores o valor que deveriam receber. Os mais humildes tinham dificuldades em ter informações sobre seus direitos. Este boletim foi usado como pretexto para justificar a sua prisão em novembro do mesmo ano. A divulgação do boletim estava aliada ao projeto de fundar o primeiro sindicato de trabalhadores rurais da cidade. Mas, essa iniciativa pioneira envolvia o desafio de enfrentar a reação da ordem política estabelecida. Uma das consequências dessa reação foi sua primeira detenção, ocorrida em novembro de 1956,
O delegado disse que havia recebido “ordens superiores” para efetuar sua detenção, que gerou o depoimento prestado no dia 10 de novembro de 1956. Como o Partido Comunista tinha longo histórico de períodos alternados de atuação na legalidade e na clandestinidade, tentaram lhe imputar a acusação de ser adepto do “credo vermelho”, mas Peba sempre tinha sido filiado ao PTB e não tinha vínculo partidário com os comunistas. A íntegra do documento esclarece que o principal motivo da sua detenção a distribuição do boletim. Conforme a íntegra do documento, o delegado perguntou se ele havia pertencido às fileiras do partido comunista. Peba respondeu ao delegado que jamais havia pertencido a este partido e que era defensor dos princípios trabalhistas, justificando sua atuação junto às fileiras do Partido Trabalhista Brasileiro.
As perguntas do delegado revelam a preocupação de alguns fazendeiros quanto a sua intenção de Peba de organizar um sindicato. Alguns operários já estavam começando a exigir os seus direitos trabalhistas. Despertar essa consciência, no contexto da época, foi visto como atividade subversiva. Peba escreveu ao presidente Juscelino, em novembro de 1956, agradecendo, em nome dos trabalhadores, o aumento do salário mínimo.
Peba escreveu uma carta, em 10 de novembro de 1956, ao governador Jose Francisco Bias Fortes para esclarecer os motivos pelos quais tinha sido preso pelo delegado de São Sebastião do Paraíso. Nesta carta, o líder sindical relata que fora preso, por distribuir boletins com o esclarecimento aos trabalhadores sobre os valores do novo salário mínimo instituído pelo presidente Juscelino. O delegado teria confiscado dois certificados expedidos pelo PTB, não respeitando tratar-se de uma agremiação política amparada pela legislação da época. Ao livrar-se do incômodo, Peba comunicou o ocorrido ao governador de Minas, solicitando esclarecimentos quanto às supostas ordens superiores.
O líder trabalhista enviou ofício ao Ministério da Justiça, em fevereiro de 1957, solicitando proteção ao Presidente Juscelino, por ocasião de uma visita que ele faria à capital mineira, em razões de ameaças publicadas na imprensa. Este documento chegou ao departamento encarregado e foi enviada solicitação à Secretaria de Segurança Pública de Minas Gerais, em 20 de ofício de 1957.
No relatório elaborado pelo delegado regional de Passos constam os nomes de 17 testemunhas de acusação contra os indiciados. [Documento 68 da pasta 0005 do APM]. Mas, antes de tratar de cada um dos acusados, o delegado descreve aspectos do cenário geográfico e social da cidade de São Sebastião do Paraíso. No entendimento do delegado, a cidade tinha uma sociedade constituída de uma base agrária e que cultivava “um forte sentido de feudalismo”. O relatório destaca outras condições do contexto social nas quais as supostas agitações teriam ocorrido.
Após busca realizada pelos militares nas residências dos presos, nada foi encontrado para justificar algum ato ilícito. Após descrever aspectos sociais da cidade, o delegado passa então a descrever o que chama de “fatos” que levaram à instauração do inquérito. Omitindo o nome do militar que efetuou as prisões, o delegado informa que os paraisenses foram presos por “militares do 12º Batalhão de Infantaria” e levados para Belo Horizonte. Argumenta ainda que os indiciados recambiados para a cidade teriam sido colocados liberdade sob custódia.
Porém, estando os paraisenses em liberdade provisória, com base na custódia assinada pelo deputado Delson Scarano, na fase inicial do inquérito, Geraldo Borges Campos e Braz Alves Vieira voltaram a ser detidos. Quanto ao líder petebista, o delegado destaca que o mesmo era presidente do Partido Trabalhista Brasileiro local e que o mesmo teria sido candidato, por duas vezes, a prefeito da cidade. Era também presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Destaca ainda o seu “temperamento impetuoso” e a qualidade de mesmo não tendo curso superior ser um homem brilhante. Após essas descrições gerais, o delegado apresenta a suas conclusões sobre o indiciado, afirmando que com a sua atuação no sindicato teria criado inimigos na cidade e a situação se agravava com a publicação de um jornaleco. O delegado conclui o relatório, afirmando que o indiciado poderia ser considerado um político trabalhista, mas nunca um comunista.
Quase quatro décadas depois de 1964, o governador de Minas, Itamar Franco, assinou o decreto no 42.401, de 05 de março de 2002, indenizando o primeiro grupo de 53 vítimas de tortura praticada por agentes estaduais. No caso das pessoas falecidas o poder público concedeu reparação às famílias. Entre os indenizados por este decreto está Geraldo Borges Campos, falecido 35 anos antes da reparação oficial. No mesmo documento consta a indenização da economista Dilma Rousseff. [www.conselhos.mg.gov.br] A mais alta corte da justiça militar do país reformulou, por unanimidade de votos, a sentença do Conselho Permanente de Justiça para o Exército, absolvendo os dois das acusações que havia sido intentada. No referido o documento, o juiz relembra que Peba havia sido incurso no artigo 11, letras a e b, parágrafo terceiro e artigo 11 da Lei número 1802 de 1953. Mas, o Juiz Auditor da 4ª Região Militar, em 28 de julho de 1967, comunicou ao Secretário de Segurança Pública que Geraldo Borges Campos e Braz Alves Vieira foram absolvidos pelo STM.
Benedito Campos, irmão de Geraldo Borges Campos, embora não tenha sido levado preso para Belo Horizonte, foi molestado pela polícia na cidade, talvez pelo fato de ser filiado ao PTB, legenda pela qual foi candidato a vereador por duas eleições, quando Peba foi candidato a prefeito. Benedito foi impedido por militares de viajar para Ribeirão Preto, SP, sendo obrigado a retirar-se do ônibus no qual estava embarcado. Os militares alegaram que ele estaria tentando fugir da cidade.