Loja Maçônica
 
Luiz Carlos Pais
 
A Loja Maçônica “Fraternidade Universal” tem uma presença marcante na história de São Sebastião do Paraíso, MG, não somente devidos aos seus vários projetos sociais, mas também pela presença nos momentos mais especiais para a população. Este é o caso do Estado Novo (1937 – 1945), quando duas ideologias radicais, comunismo e integralismo, foram combatidas pelos órgãos de repressão política do governo Vargas. Ao buscar informações no acervo do DOPS, localizei documentos sobre a suspensão temporária das atividades da Loja Maçônica “Fraternidade Universal”, no ano de 1937. No contexto do Estado Novo, não somente as lojas maçônicas foram atingidas pelos decretos do governo Vargas. Várias outras instituições tiveram suas atividades suspensas. Mesmo não sendo este um tema diretamente relacionado aos conflitos de 1964, entendo ser um evento importante para compor a história recente de São Sebastião do Paraíso e por este o motivo resolvi inseri-lo neste livro.

Este episódio pertence aos momentos mais repressivos do governo Vargas e ilustra que a loja maçônica estava incluída na lista de organizações atingidas pela legislação de exceção formulada no período que antecedeu os conflitos da Segunda Guerra Mundial. As medidas de exceção chegaram a Paraíso da década de 1930, intervindo nas atividades dos maçons e de outras instituições. Como a Maçonaria conquistou maioridade institucional e respeito pelos seus serviços sociais, passados os momentos mais repressivos, o grupo de maçons paraisenses reconquistou o direito de reiniciar suas atividades locais. Em vista da tradição secular dessa organização, é importante relembrar dados históricos de sua fundação, ocorrida no final do século XIX.

Em 13 de junho de 1898, um pequeno e entusiasmado grupo de cidadãos, sob a liderança do advogado Luiz Sanches de Lemos, Juiz de Direito da Comarca de São Sebastião do Paraíso, reuniu com o firme propósito de fundar a primeira Loja Maçônica da cidade. Contando com o apoio de outros maçons da região. Passados seis meses da pioneira reunião, tomou posse a primeira diretoria da Loja. Os esforços do Dr. Sanches foram reconhecidos com a escolha de seu nome para ser o Venerável de Honra da primeira diretoria. O Coronel José Luiz Campos do Amaral Junior foi eleito para cargo de Venerável Mestre.

Passadas quatro décadas da fundação da instituição, quando faltavam poucos dias para começar o longo período de oito anos do Estado Novo, em outubro de 1937, vários órgãos da imprensa nacional publicaram nota da comissão, decretando Estado de Guerra, e determinando o fechamento de várias instituições. A execução desse decreto atingiu lojas maçônicas, centros espíritas, sindicatos, entidades dos negros, sociedades constituídas por imigrantes, grupos políticos de esquerda, entre outras. Três dias após a publicação do decreto, em reunião realizada com a participação de oito membros da Loja, os maçons paraisenses decidiram acatar as ordens do governo e foram suspensas as atividades. Naqueles dias, duas forças políticas radicais se confrontavam. De um lado, estavam os comunistas que acabavam de ser derrotados na Intentona Comunista de 1935 e do outro, os integralistas, aliados à coligação que estava sendo estabelecida na Europa entre nazistas e fascistas.

Entre essas duas ideologias radicais, não somente as instituições maçônicas como todos os outros grupos democráticos estavam diante do desafio de posicionarem no conturbado contexto político nacional. Assim, na histórica reunião feita pelos maçons paraisenses que tinha como pauta única a suspensão temporária de suas atividades, o orador solicitou que constasse em ata o protesto contra a vertente radical da ideologia comunista. De fato, predominava naquele momento um clima de instabilidade institucional generalizado. No contexto incerto dos anos que precederam aos conflitos da Segunda Guerra Mundial, havia muita incerteza são somente para a Maçonaria como também para as outras instituições sociais e democráticas.

O sensato orador solicitou então que constasse em ata que a associação hipotecava solidariedade ao governo constituído, destacando este era o objetivo da organização. Além do destaque feito pelo orador, a ata lavrada pelo secretário também deixou registrado para os anais da história que a instituição combatia sem tréguas “todo credo extremista, em todas as suas modalidades, incluindo também o integralismo.” Sábia decisão, pois o posicionamento contrário ao pensamento comunista não poderia ser entendido como aprovação ao extremo oposto que representou o integralismo.
A orientação de não compartilhar de posições políticas extremistas atendia a uma orientação nacional da organização contida em circular de 29 de junho de 1937, assinada pelo secretário da ordem do Rio de Janeiro. Havia uma orientação para que os maçons que ingressassem na Ação Integralista Brasileira fossem excluídos das lojas. Quantos aos comunistas, a orientação esclarecia que o Conselho Geral havia deliberado que a decisão de exclusão deveria distinguir entre os que apenas adotavam o materialismo histórico como método de estudo e os que militavam no partido comunista. A circular destacava que: “Contra estes é que se pode alegar que se organizam para subverter o Estado Burguês, subversão que será realizada pela violência.” A circular complementava as orientações para todas as lojas, reforçando que somente em relação aos membros do partido comunista é que o ingresso ou permanência é vedado pela constituição da sociedade.

O delegado enviou ofício ao DOPS, comunicando o cumprimento das determinações de fechar a Loja. Ele diz ter ido pessoalmente à Loja para constatar o fechamento em consequência do decreto da Junta Executora do Estado de Guerra, referindo-se ao grupo nomeado por Getúlio Vargas para implantar as medidas de exceção do Estado Novo. O delegado informou que loja havia encerrado suas atividades no dia 27 de outubro de 1937, como verificou na ata assinada pelos participantes da última reunião. Uma cópia dessa ata foi transcrita pelo escrivão policial e encaminhada às autoridades policiais da capital, para documentar as informações do delegado. Além de constatar a suspensão das atividades e o fechamento da sede da entidade, havia também a desconfiança de que a mesma mantivesse relações com organizações consideradas, no contexto da época, extremistas como o PC e a Ação Integralista Brasileira.

Três meses depois da suspensão das atividades, chegou uma consulta às autoridades da capital, indagando sobre a possibilidade de obter a permissão para a reabertura da loja. O delegado local justificou essa consulta, dizendo que a normalidade parecia ter retornado e que não haveria mais motivos para a instituição permanecer com suas atividades suspensas. A manifestada pelo delegado permite pressentir o clima de insegurança daquele momento, quando foi determinado o fechamento do congresso, a extinção dos partidos políticos e o combate ferrenho aos comunistas e integralistas.

Em resposta à consulta feita pelo delegado de Paraíso, em 27 de janeiro de 1938, a polícia da capital esclareceu que a reabertura das lojas maçônicas ainda não estava autorizada e que os paraisenses deveriam aguardar as orientações que viriam do Rio de Janeiro. Desse modo, a entidade permaneceu com suas atividades suspensas pelo período aproximado de um ano. Em 13 de junho de 1938, o presidente Antônio de Bello requereu autorização para reiniciar os trabalhos da entidade, pois naquele momento, outras lojas estavam funcionando em outras cidades.

Esse retorno aos tempos incertos do Estado Novo nos permite refletir sobre a importância das instituições democráticas. Somos todos personagens ativos da história que muitas vezes aparece como eventos distantes da nossa realidade local. Passados os momentos difíceis da história institucional, os maçons paraisenses pioneiros retomaram seus trabalhos. Passados 115 anos de sua fundação, a instituição merece o reconhecimento da cidade por contribuir na fundação de hospitais, escolas, faculdades, clubes e outras organizações filantrópicas e sociais.

Campo Grande, MS, 24 de Janeiro de 2016
Esta crônica é um capítulo do livro do autor "História Recente de São Sebastião do Paraíso (1933 - 1964)".