Os Donos do Rochedo
Foi-se buscar naquela cidade praieira o adolescente que no Forte de S. Mateus afogara: para o ressuscitamento levava na bagagem a memória.
O jovem da década de 70 usava sunga e no pescoço corrente com um crucifixo de ouro que pertencera a... A algum parente que ficou esquecido. Era herança.
Naquele ponto do forte outros jovens mergulhavam. Eles eram febos bronzeados da burguesia que mantinham à distância os desclassificados da ditadura, ditadura elitista militar.
Na enseada, ao lado do rochedo, pescadores embrutecidos e maltratados pela lida jogavam suas redes e tarrafas. Aquilo que não prestava, gente e peixes, era lançado à margem para desidratarem ao sol. O cheiro denunciava as violências.
Agora tudo mudara.
A baía estava povoada por gaivotas, peixes que saltavam e tartarugas que subiam à tona.
O rochedo da fortaleza colonial era frequentado no presente por jovens de classes que conseguiram ascensão. O bronzeado cedera lugar à mestiçagem percebida por traços étnicos, herança da história do país.
A memória salvadora do afogado alimentava-se do álbum pessoal onde se guardavam fotos da antiga “kodac” daquele jovem dos anos setenta. Entre tantas havia aquela tirada atrás da guarita do forte.
O homem de hoje que fora buscar passado queria recapturar aquela época com foto do celular para fazer um “antes e depois”: formas de ressuscitar lembranças através da comparação: o adolescente que fora e o senhor que se é: quantas mortes vividas e quantas vidas afogadas nesta metamorfose de juventude para a senectude?!
Foi-se lá atrás daquele forte.
Encontrou uma coletividade de adolescente que repartiam prazeres. Eram os donos do rochedo.
Eles mergulhavam dos diversos trampolins de pedra esculpidos em diversas alturas da rocha, ou pela natureza ou pela juventude ansiosa de gozar a vida.
Revezavam saltos e nados. Cansados das braçadas voltavam e ajudados por braços, mãos e dedos alheios escalavam os rochedos para novos mergulhos.
Na rocha compartilhavam água mineral, cigarros e isqueiros.
Entre os moleques estava a Dora.
Não eram os “Capitães da Areia” baianos, mas sim os cabofrienses “Donos do Rochedo”.
Chegou-se à beira do trampolim mais alto quando Dora abaixo perguntou:
- O senhor vai saltar daí?
A resposta em riso foi:
- Não! Se eu saltar, eu não volto mais.
Mas ai que vontade que ficou no corpo de realizar aquele mergulho! Iemanjá apelava com braços abertos chamando para o pulo. Iara com ciúmes segurava impedindo e tirando a coragem.
Amadurecer é se encher de autocensuras!
Saiu-se dali.
Em outra área do rochedo o simpático jovem afro-americano sorriu mostrando suas falhas dentárias e dizendo:
- Pode pular sem medo, senhor!
Ele se virou e com o dedo jogou seu coriza ao mar preparando-se para o próximo mergulho – seu nariz era uma fonte.
Com tanto entretenimento e riquezas de comportamento humano o pretendido “selfie” para o antes e depois ficou sem ser registrado.
No dia seguinte, mais à tarde, voltou-se lá. Na ida encontrou os “Donos do Rochedo” que já voltavam cansados das atividades banhistas daquele outro dia. Foi quando outra Dora, cujo corpo adolescente morria permitindo o nascimento do corpo de mulher interpelou:
- Tio, me dá o resto de tua água aí!
Os silêncios continuaram conversas entreolhares!
No Brasil de Jorge Amado morria-se de varíola. No pós-moderno contrai-se doenças do aedes aegypti!
Foi-se buscar naquela cidade praieira o adolescente que no Forte de S. Mateus afogara: para o ressuscitamento levava na bagagem a memória.
O jovem da década de 70 usava sunga e no pescoço corrente com um crucifixo de ouro que pertencera a... A algum parente que ficou esquecido. Era herança.
Naquele ponto do forte outros jovens mergulhavam. Eles eram febos bronzeados da burguesia que mantinham à distância os desclassificados da ditadura, ditadura elitista militar.
Na enseada, ao lado do rochedo, pescadores embrutecidos e maltratados pela lida jogavam suas redes e tarrafas. Aquilo que não prestava, gente e peixes, era lançado à margem para desidratarem ao sol. O cheiro denunciava as violências.
Agora tudo mudara.
A baía estava povoada por gaivotas, peixes que saltavam e tartarugas que subiam à tona.
O rochedo da fortaleza colonial era frequentado no presente por jovens de classes que conseguiram ascensão. O bronzeado cedera lugar à mestiçagem percebida por traços étnicos, herança da história do país.
A memória salvadora do afogado alimentava-se do álbum pessoal onde se guardavam fotos da antiga “kodac” daquele jovem dos anos setenta. Entre tantas havia aquela tirada atrás da guarita do forte.
O homem de hoje que fora buscar passado queria recapturar aquela época com foto do celular para fazer um “antes e depois”: formas de ressuscitar lembranças através da comparação: o adolescente que fora e o senhor que se é: quantas mortes vividas e quantas vidas afogadas nesta metamorfose de juventude para a senectude?!
Foi-se lá atrás daquele forte.
Encontrou uma coletividade de adolescente que repartiam prazeres. Eram os donos do rochedo.
Eles mergulhavam dos diversos trampolins de pedra esculpidos em diversas alturas da rocha, ou pela natureza ou pela juventude ansiosa de gozar a vida.
Revezavam saltos e nados. Cansados das braçadas voltavam e ajudados por braços, mãos e dedos alheios escalavam os rochedos para novos mergulhos.
Na rocha compartilhavam água mineral, cigarros e isqueiros.
Entre os moleques estava a Dora.
Não eram os “Capitães da Areia” baianos, mas sim os cabofrienses “Donos do Rochedo”.
Chegou-se à beira do trampolim mais alto quando Dora abaixo perguntou:
- O senhor vai saltar daí?
A resposta em riso foi:
- Não! Se eu saltar, eu não volto mais.
Mas ai que vontade que ficou no corpo de realizar aquele mergulho! Iemanjá apelava com braços abertos chamando para o pulo. Iara com ciúmes segurava impedindo e tirando a coragem.
Amadurecer é se encher de autocensuras!
Saiu-se dali.
Em outra área do rochedo o simpático jovem afro-americano sorriu mostrando suas falhas dentárias e dizendo:
- Pode pular sem medo, senhor!
Ele se virou e com o dedo jogou seu coriza ao mar preparando-se para o próximo mergulho – seu nariz era uma fonte.
Com tanto entretenimento e riquezas de comportamento humano o pretendido “selfie” para o antes e depois ficou sem ser registrado.
No dia seguinte, mais à tarde, voltou-se lá. Na ida encontrou os “Donos do Rochedo” que já voltavam cansados das atividades banhistas daquele outro dia. Foi quando outra Dora, cujo corpo adolescente morria permitindo o nascimento do corpo de mulher interpelou:
- Tio, me dá o resto de tua água aí!
Os silêncios continuaram conversas entreolhares!
No Brasil de Jorge Amado morria-se de varíola. No pós-moderno contrai-se doenças do aedes aegypti!
Leonardo Lisbôa
Barbacena, 28/12/2015
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