Ministro Salgado Filho

Luiz Carlos Pais

Dia 2 maio de 1942. Os conflitos da Segunda Guerra Mundial estavam em expansão. O Brasil anunciou que estava ingressando no conflito mundial, com envio de tropas para lutar na Europa, depois que submarinos do Eixo torpedearam mais de trinta navios da Marinha Mercante Brasileira, causando a morte de mais de mil pessoas. Os brasileiros estavam assustados, sem saber o que poderia resultar em consequência da declaração de guerra. Mas naquele dia, aconteceria um episódio bem diferente na vida dos paraisenses. Logo depois do almoço, um avião militar bimotor da Força Aérea Brasileira, modelo C47, decolou do Campo de Marte, em São Paulo, com destino ao campo de aviação de São Sebastião do Paraíso.

Dois jovens oficiais estavam no comando da aeronave que transportava dois ilustres passageiros: um empresário paulista, vice-presidente do Jóquei Clube do Brasil e o outro era nada menos do que o ministro da Aeronáutica, Salgado Filho. Um dia normal na agenda do político gaúcho, de plena confiança do presidente Getúlio Vargas, mas que quebraria a rotina de muitos paraisenses que viram o “enorme avião” sobrevoando a cidade. Alguns pensaram, apressadamente, que poderia ser os alemães que estavam começando a atacar o importante polo da cafeicultura do sudoeste mineiro.

O professor Raymundo Calafiori, detentor de uma didática exemplar, ministrava mais uma de suas memoráveis lições de Ciências Físicas e Biológicas para estudantes do Ginásio Paraisense. A tranquilidade da aula foi interrompida pelo ruído do avião que passou, voando à baixa altitude, sobre o estabelecimento e provocou a curiosidade de todos, professores e alunos, por aquela experiência jamais testemunhada com tanta realidade. Todos tiveram a certeza que o grande avião pousaria no campo de aviação, nas imediações do atual Parque de Exposição. O rigoroso mestre não conseguiu mais conter a agitação dos jovens estudantes, que queriam testemunhar de perto o evento jamais presenciado. Todos saíram correndo, inclusive o zeloso mestre.

O ministro Joaquim Pedro Salgado Filho foi fundador do Correio Aéreo Nacional e um dos fundadores do Partido Trabalhista Brasileiro. Amigo de longa data do presidente Vargas, tinha verdadeira paixão pela aviação. Anos depois morreria num acidente aéreo no Rio Grande do Sul, quanto estava em campanha para o governo do Estado. Seu nome ficou na história como incentivador na construção de muitos aeroportos civis e militares em diferentes cidades do país. Foi um entusiasta que acreditou nos primeiros anos de existência da atual Força Aérea Brasileira.

O objetivo do ministro era inspecionar, pessoalmente, o Aero Clube de São Sebastião do Paraíso, na época, dirigido pelo aviador Armando Marin. Fundado em 1º de abril de 1941, como tanto outros fundados na mesma época, o Aero Clube local formou vários aviadores e chegou a funcionar com três aparelhos novos, doados pelo Aero Clube do Brasil e outras entidades que contribuíam para a expansão da aviação. Foram também seus diretores, Dr. Luiz Pimenta Neves e o professor Carmo Perrone Naves.

Assim que a aeronave da pousou, os estudantes secundaristas chegaram, ofegantes, para observar de perto a “bela máquina voadora” que jamais tinha descido na cidade. Mas, o ritmo tranquilo do interior provocou um “pequeno” desencontro. O aviador responsável pelo Aero Clube não estava na cidade. Providencial foi então a presença do professor Calafiori e dos estudantes que recepcionaram o ilustre visitante. Após “batizar” um avião novo que estava no hangar, o ministro conversou amistosamente com os ginasianos sobre a apaixonante atividade de aviador profissional e mostrar o interior da aeronave para eles. Depois de uma hora, mais ou menos, disse que iria levantar vôo, pois teria outro compromisso naquele mesmo dia.

Como foi anunciado na imprensa nacional, de São Sebastião do Paraíso, o ministro seguiu viagem para a cidade de Pirassununga, SP, onde se encontrou com o interventor do Estado e com o Secretário da Educação. Em companhia dessas autoridades, o ministro fez uma inspeção técnica no campo de aviação da referida cidade, onde estava sendo estudada a possibilidade de instalar uma “Escola de Aeronáutica”. As condições locais foram aprovadas e teve início então a história da atual renomada Academia da Força Aérea de Pirassununga.

Na noite do mesmo dia, o ministro retornou à São Paulo e se hospedou num famoso hotel, onde concedeu entrevista à imprensa. Na oportunidade explicou aos jornalistas que: “Visitei a cidade mineira de São Sebastião do Paraíso, onde presidi o batismo de um avião destinado ao treinamento da mocidade daquela cidade mineira e doado pela Campanha Nacional de Aviação Civil.” Também estava prevista uma rápida cerimônia de entrega de diploma de alguns pilotos que haviam recebido o brevê, o que acabou não acontecendo porque o presidente do aeroclube não estava na cidade. São pequenos e grandes episódios que se entrelaçam para constituir a história local da querida terra natal com a história global do país e mundo. Não é nada conveniente tentar separá-las.

Campo Grande, MS, 22 de Janeiro de 2016