Chegadinho

Acho que hoje ainda há discriminação contra os negros, mas muito menos do que no passado. A cultura incrustrada nas mentes e corações insinuando a inferioridade dos negros está, graças a Deus, desabando. Mas ainda há bolsões desse absurdo que mais cedo do que se pensa vão acabar.

Sobre a cultura discriminatória, que havia no passado, sou testemunha de vários casos. Os negros sempre eram discriminados, vítimas de chacotase grossuras. Quando um errava mesmo algo sem importância, gritavam: "Negro quando não caga na entrada, caga na saída!". E quando o negro era uma pessoa afável, boa demais, fraterno, diziam, psmem: "É negro, mas tem o coração de branco!". Ou a "pérola": "É negromas sabe entrar e sair!". Quando uma moça negra era muito bonita diziam como se fosse um grande elogio: "É muito bonita apesar de ser negra".

Lembro inclusive de uma cena familiar. Não vi, mas quem viu, pessoas de minha família, me contaram rindo como se fosse uma piada. Seguinte: em meados da década de 50, era obrigatório quandoa moça noivava levar o noivo para apresentar a toda a família. Foi o que minha irmã mais velha fez quando noivou com um rapaz morenão, quase negro. Da parte dos pais tudo bem, nada contra, nenhuma censura. Nem da maioria da famaília. Por último ela levou o noivo para ser apresentado a uma tia avó, irmã do nosso saudoso avô. Era uma velha muito religiosa, boníssinma e incapz de ofender quem quer que fosse, mas fazia parte da cultura antiga. Quando minha irmã apresentou o noivo, ela comentou comose fosse um elogio: "Olhe minha filha, apesar dele ser muito chegadinho, tem as feições finas, não tem o beição dos negros e o cabelo não ée pixaim. E é um chegadinho educado. Aprovo".

Chegadinho era o apelido que usavam para designar os morenões quase negros. A tia avó não falou por maldade, elea retratou a cultura discriminatória da época. Era um absurdo. Inté.

Dartagnan Ferraz
Enviado por Dartagnan Ferraz em 13/01/2016
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