Assim ou ...nem tanto 27
O Vazio
“O tambor faz muito barulho mas é vazio por dentro”, escreveu o Barão de Itararé. Escuto, emocionado, os tambores que tocaram na minha vida. De um a muitos os escuto neste tempo de memórias e devo concluir que o vazio que se segue ao som e à marcha, que se arrasta depois da Banda passar, ficava em mim como um infinito interior, uma dor difusa, uma falsa indiferença, algo invisível de que nem era bom falar. Foi assim em muitas situações da minha vida mansa ou aventureira. Do outro lado de mim estavas tu em muitos corpos diferentes. Variava a qualidade dos abraços, a maciez da boca, a ousadia. Garanto que escutava tambores, foguetes, risos, o tropel do coração e que o encantamento se repetia até perceber que não estavas. Como poderias estar em festas profanas, nos bairros escusos, para lá das cortinas de veludo velho que tapavam a nudez da carne sem espírito? Quando pensei ter-te encontrado tinha alguém jovem comigo, a timidez doce em pessoa, a boca mais linda na mudez dos encontros. Pensei que me amava mas não eras tu. A juventude casava comigo, corria riscos para me ver mas amar não amava, de nenhum modo me via como o fim da sua estrada. Seguimos, portanto, cada um a perseguir os sonhos. Os meus estavam na lembrança do que foi bom, justo e verdadeiro enquanto te procurava. E virei a cidade e o mundo, a terra e o céu possíveis. Procurei sempre com a certeza de, um dia, te encontrar. Mal te vi achei que me cabias mas amavas outro. Fui só o lado oposto da tua infidelidade.