INTROSPECÇÃO
Há algum tempo busco me conhecer, mas a cada tentativa estranho-me. Há algum tempo busco explicações para meus desejos e meus instintos, mas a cada tentativa complico-me.
Em algum lugar deve haver um espelho que reflita a mim verdadeiramente, mas confesso que tenho medo de encontrar-me e não gostar do que verei. Talvez uma imagem distorcida, talvez um rosto sem face, talvez um sorriso carcomido, sei lá!
Assim levo a vida a fingir que eu sou aquele que se mostra no espelho de meu quarto.
Hoje levantei-me meio que taciturno, com espírito lúgubre, quase que catatônico. O dia também estava um tanto quanto diferente, havia um silêncio sepulcral no ar, o sol apresentava uma luz fosca, o clima era cinzento e pesado como chumbo.
Sair de casa foi uma obrigação. Caminhei por entre gentes sem me dar conta delas. Era gente sem rosto, sem identidade, ambulantes, tal qual eu me encontrava.
Nesses momentos de profunda introspecção, encaro-me e vejo que não gosto desse outro eu que há em mim, que de quando em vez quer olhar o mundo aqui, quer mostrar os olhos e olhar as pessoas sem no entanto vê-las.
Sorrir era um simples, automático e quase imperceptível esticar de lábios, pura polidez de um homem urbano. Olhar nos olhos do outro era um simples bater das pálpebras. Falar com o outro era mera educação, um emitir de sons sem interesse algum.
Assim mergulhei em minhas leituras e meus escritos.