A PRIMEIRA DESPEDIDA
De uma “relação amorosa”, uma “trepada”, um momento de amor com meu pai, eu fui concebida: os espermatozoides de meu pai correram e um deles (apenas um deles) venceu essa corrida, se encontrou com o ovulo de minha mãe que estava lá no momento certo.
Cresci na barriga de minha mãe: como uma sanguessuga, me alimentei dos alimentos que ela ingeriu e fui crescendo, segundo a segundo, minuto a minuto, hora a hora, dia a dia, mês a mês...Dentro do útero de minha mãe, senti as emoções dela (tão minhas!).Ouvi as vozes de meu pai , das pessoas que convivam com ela. Ainda dentro da barriga pude sentir todo o amor que ela já tinha por mim.
Os meses passaram rápidos e chegou o dia. O tempo de viver a vida dela acabou. Eu precisava sair, respirar o ar aqui de fora. Com meus próprios pulmões. Nasci. Separaram-nos e eu chorei a dor de minha primeira separação. Eu me sentia tão segura com ela, não conhecia nada aqui de fora. O mundo me parecia hostil. Tive que chorar para ganhar comida. Ou para que ela percebesse que eu estava molhada, ou então com dor!
Fui crescendo pela vida afora: aprendi rolar na cama, engatinhar... Andar! Veio a segunda separação: o momento de ir para a escola. Ela me deixou lá e saiu com lágrimas nos olhos. Aí vieram os amigos, o primeiro namorado.
A vida passando....
Casei. Deixei minha mãe, mais uma vez, porém ela (como todas as mães) me abençoou.
Lutei. Constitui minha família. Veio o primeiro filho (momento de sentir na pele o que ela sentiu). Só então pude ter argumentos perfeitos e consistentes para falar o que ela havia sentido. Só então senti a dor dela. A alegria dela. A tristeza dela ao deixar meu filho na escola pela primeira vez.
E hoje, quando mais um ano se inicia, penso nela mais uma vez: ela já me deixou. Choro a saudade dela, pois me lembro do cheiro dos doces, da comida que ela fazia nessa época do ano...
Minha mãe carregava nas vestes e na pele um gostoso cheiro de doce de abóbora com coco... Ah! E o cheiro das comidas no forno...?
O riso alto. As gargalhadas de alegria ao ver a família reunida...
Festas me trazem a gostosa e melancólica saudade de minha mãe.