CHUVAS DE VERÃO: QUEDA DE BARREIRAS

Amigos e colegas do Recanto das Letras, estamos no início do verão e o noticiário é farto em más notícias. Chove copiosamente na região Centro Sul, Uruguai, Argentina e Paraguai, nossos vizinhos, com centenas de milhares de pessoas desabrigadas, muitos perderam suas casas, seus bens, seus animais e alguns o bem maior: A vida. Já ouvi que houve soterramentos e espero que fique em pequenas proporções. Ainda não ouvi desgraça por quedas de barreiras, comum em nossas serras nesta estação. Torço para que não haja. Permito-me, então, escrever esta crônica.

O final do ano se aproximava e algumas empresas de economia mista tinham pressa em publicar seus balanços logo no início do ano vindouro. Recebi uma passagem para Curitiba com hora marcada para 7:00 horas da manhã do dia 2 de janeiro. O ano eu não lembro, mas foi por volta de 1972/73. Quando vi a companhia, disse:

- Com essa companhia eu não voo. Esses aviões são canibalizados. A nossa cliente (empresa aérea) já desativou esse equipamento há muito tempo por falta de peças.

- Mas o trabalho tem que começar à 9:00 horas da manhã.

- Eu vou dia 1º no fim da tarde, à noite e se não houver voos, eu vou de carro, disse.

Por sorte havia um voo para Curitiba às 17:00 horas do dia 1º de janeiro.

Eu fora passar o Revellion em Praia Grande, mas logo às 9:00 horas eu estava voltando para tomar aquele avião. Chovia copiosamente, o melhor era voltar logo. Mas assim como eu pensei, acho que todos pensaram e a Pedro Taques estava parada totalmente. Liguei o rádio na Jovem Pan e as notícias eram as piores possíveis: Queda de barreiras na pista ascendente da Anchieta e na estrada velha (a Imigrantes ainda não existia). Não restava alternativa senão voltar via Regis Bittencourt (BR 116) e foi o que fiz. Ia chegar tarde a São Paulo, mas dava tempo para pegar o avião. Era o que eu pensava. O tráfego na estrada da Banana era lento, o da BR mais ainda até que parou de vez e já eram mais de 12:00 horas. A fome chegou e não tinha o que comer. Vez ou outra vinha um carro em sentido contrário. Por volta das 15:00 horas vi o que tinha acontecido: Um caminhão tombado no meio da pista. A passagem era feita pelo acostamento. Cheguei a São Paulo depois das 17:00 horas. Tinha perdido o avião. Então não me restava alternativa senão ir para Curitiba, via Ponta Grossa. Eu dissera que estaria lá às 9:00 horas e era o que eu ia fazer. Liguei para o gerente e lhe contei que tinha perdido o avião e os motivos, mas não disse que faria o trajeto via Ponta Grossa. Por sorte, às 20:00 horas meu irmão chegou e me disse que quando passou no local do acidente na BR 116, estavam removendo o caminhão.

- Que bom, disse eu. Então posso sair lá pelas duas horas da manhã e chegarei a Curitiba com bastante folga para as nove horas. Ledo engano. A chuva não parou, o trafego era lento e perigoso. Todo o pessoal que fora para a baixada estava voltando pela BR. Já estava clareando o dia quando eu comecei a subir a Serra dos Macacos depois de Cajati. Os caminhões me impediam de fazer ultrapassagem e também era muito arriscado por causa da visibilidade. A água escorria das pedras como pequenas cachoeiras sobre o carro. Só me lembro de que quando terminei a subida da serra, lá no topo, olhei para o relógio e vi que eram 6:55 horas. Com chuva copiosa, cheguei a Curitiba às 10:00 horas e fui direto para a empresa. “Tiraria meu atraso à noite, pensava”.

Para minha grande surpresa, a empresa estava fechada e uma folha colada na porta anunciava que o expediente começaria a partir das 13:00 horas. Fiquei ensandecido. Chegando ao hotel, a primeira coisa que fiz, foi telefonar para São Paulo e quando pedi para chamar o gerente, a secretária me disse:

- É você Santo? Que bom, ele já vem.

Não entendi a pergunta e o tom de voz, porque todos conheciam a minha voz inconfundível.

Quando o gerente atendeu ao telefone, eu lhe disse com raiva:

- Porra! Vocês me cobram pressa e chego aqui e a empresa está fechada. Enfrentei uma tremenda chuva para dar no que deu?

- Deixa a bronca prá lá, Graças a Deus você está aí e vivo. Aqui nós todos estávamos preocupados porque soubemos que às 7:00 horas houve uma avalanche na serra dos Macacos que levou muitos ônibus, caminhões e carros para o precipício. Há muita gente soterrada. E quanto ao horário ninguém nos avisou, apenas disseram que tinham pressa, daí a gente ter que começar o trabalho logo cedo.

Fui tomado de muita emoção. Mais uma vez eu tinha escapado de um acidente na estrada da morte. Não quis voar em avião canibalizado e também me arrisquei com o carro. Um mês depois desse acidente de grandes proporções, quando a estrada foi reaberta, eu voltei e vi o que aconteceu no mesmo lugar em que eu tinha olhado para o relógio. Lembrei que, em menos de vinte e quatro horas, tinha havido queda de barreiras na Anchieta, na estrada velha de Santos e naquele trecho da BR 116, todas de grandes proporções. Estimava-se que mais de cinquenta veículos ficaram soterrados

Ainda havia máquinas trabalhando no local. Parei o carro e fiquei olhando para o precipício e vi quanta terra rolou serra abaixo. Esse trauma eu tenho até hoje. Fico apavorado quando estou dirigindo em serras em dias de chuva. Por volta de 1985, voltando de Teresópolis num dia de Páscoa chuvoso, ouvi um estrondo, olhei pelo retrovisor e vi que houve uma ]//queda de barreira de pequenas proporções logo que passei. Não chegou a impedir o tráfego. Só imaginei o estrondo que deve ter ocorrido na serra dos Macacos.

SANTO BRONZATO
Enviado por SANTO BRONZATO em 29/12/2015
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