Contraordem Social
“A ausência de um poder central com capacidade para impor a todos uma ordenação social integrada enseja surtos de banditismo de estrada e práticas de saque de que passam a viver multidões de celerados”.
A citação é do livro O Processo Civilizatório, de Darcy Ribeiro, e se refere ao período posterior ao declínio do Império Romano, caracterizado por uma regressão ao feudalismo.
Mas vejamos se, de certo modo, não é o que acontece hoje em bairros próximos a favelas, ou nas próprias favelas, assim como nos subúrbios afastados da ex-Central (atual Supervia) e também em municípios da Baixada Fluminense. Onde, pelo menos nessas regiões, ou em regiões bem próximas, não existe um poder regulador capaz de oferecer serviços públicos de qualidade mínima à população (segurança, saneamento básico, saúde pública, escolas de níveis médio e superior de qualidade, etc.). Evidenciando-se condições em que “a sociedade e a cultura se mediocrizam, tornando-se incapazes de criatividade intelectual e de progresso técnico”. Na caracterização de um ambiente em que “apenas floresce a teologia”.
Não será por isso que nos deparamos com a acentuada proliferação de igrejas evangélicas nos logradouros públicos dessas áreas? Muitas vezes em prédios similares a lojas comerciais, como na extensão, por exemplo, da Estrada do Boqueirão em Maricá? Ou na própria Rodovia Amaral Peixoto? E que nada ficam a dever aos provavelmente numerosos cultos evangélicos em regiões periféricas de Belford Roxo, São João de Meriti, Caxias? Como também Oswaldo Cruz, Ricardo de Albuquerque e Marechal Hermes? Ou Méier?
Claro que “hordas de celerados” eventualmente se deslocam até ao Arpoador, dando origem a “práticas de saque”, os nossos arrastões, que não deixam de ser “surtos de banditismo”. E não existem praticamente igrejas evangélicas ao longo da Vieira Souto ou da Delfim Moreira. A menos que em apartamentos privilegiados. Só que, como é evidente, não é nesses logradouros que tais celerados residem.
Rio, 10/02/2015