Catalogação

“Em poesia, só o excelente é bom”. Não seria essa a característica de toda obra de arte?

Na verdade, talvez não seja a poesia a responsável por esse tipo de segregação. E sim nós, com a nossa camuflada pretensão de nos situarmos acima dela. Ou, pelo menos, de certa forma alheios à sua contextualização.

Um exemplo disso pode ser retirado do próprio texto de onde pinçamos a frase inicial – o Posfácio dos Organizadores da Nova Antologia Poética de Vinicius de Morais, escrito em 2003. Onde lemos que a fortuna crítica do poeta “sofreu algumas das mais severas vicissitudes da moderna literatura brasileira”. Não sendo hoje “sequer fácil encontrar (...) alguém que se tenha dedicado a estudar a sua obra”. Estabelecendo o texto como “causas decisivas” para essa postura o fato de os católicos atuantes não haverem perdoado Vinicius por ele ter “abandonado publicamente a fé” após ter sido por eles consagrado; ou a desconfiança da esquerda militante do “aparente hedonismo ‘festivo’” do poeta; ou o fato de representantes da geração de 45 abominarem o poeta por ele ter produzido “sonetos infinitamente mais memoráveis que os deles”; ou a repulsa dos vanguardistas pela opção do poeta por formas fixas, como a dos conservadores, quando o poeta mostrou que não precisava se ater a elas; ou a objeção dos elitistas por Vinicius ter se tornado popular; etc.

Por que precisamos dessas classificações todas? Será que a poesia delas precisa para dizer se um poema é excelente ou bom?

Felizmente, mais à frente vemos que os organizadores reconhecem que “um poema experimental já não é tomado nem como destruição da poesia, nem como única maneira de fazê-la”. Assim como a forma fixa tradicional como o soneto, por exemplo, é apenas uma dentre outras modalidades poéticas. Culminando com a observação de que “a obra de arte deve ser julgada pelas suas qualidades individuais”. Que vão sempre prevalecer, a despeito do que pensam os indivíduos.

Salve Vinicius de Morais. Que, é claro, nunca se preocupou em saber, mesmo depois do reconhecimento em vida, se sua obra seria objeto de estudo. Ou em ter a garantia de que o seu Soneto de Fidelidade pudesse ser decorado por tanta gente. Não necessariamente fissurados em poesia.

Rio, 05/09/2015