O ANDARILHO
Há pessoas que se jogam na estrada da vida, saindo de um lugar e buscando plagas desconhecidas, sem amigos ou parentes que os prendam na cidade ou lugar de sua origem. É loucura, é doença, é praga, é sina, que nome dar para esse singular procedimento?
O João é um cara desses, que aparece toda sexta-feira na portaria do meu prédio, toca o interfone e anuncia com voz rouca a sua presença. Pego uma nota de R$2,00 e vou até a portaria atendê-lo. Certa ocasião lhe dei R$5,00 mas ele recusou; só aceita os R$2,00 com os quais paga o rango de um asilo da prefeitura no Ipiranga, um bairro vizinho. Nem mais, nem menos.
Minha mulher, condoída, puxou prosa com ele, arrancando-lhe algumas informações. Soube que ele era colono de família gaúcha, tinha parentes lá e volta e meia os visitava. Era só o tempo de revê-los, cortar cabelo e barba, trocar os molambos por roupa nova e cair na estrada outra vez.
Uma ocasião falou com a Dona Mari que seu sonho era conseguir um tabuleiro para vender balas nos semáforos. Disse-lhe que com R$30,00 ele conseguiria seu intento. Ela, incontinenti, buscou a verba, ele agradeceu muito e partiu, todo sorridente.
Alguns dias se passaram e ele apareceu com o tal “baleiro”. Era agora um “empresário das ruas”. Fez questão de que ela aceitasse um chicletes, como brinde. Ela aceitou e ele partiu feliz.
Sumiu por uns tempos e apareceu de novo, agora todo esfolado, olho roxo, machucado e sem o tabuleiro de balas. Dona Mari quis saber e o João disse-lhe ter sido roubado num sinal de trânsito.
Daí em diante voltou a aparecer uma vez por semana, pedindo apenas os R$2,00 para o almoço no tal asilo do Ipiranga. É mais tranqüilo e muito mais seguro!...
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B.Hte., 21/12/15