GRÃOS DE AREIA
Dia desses acordei com grãos de areia a incomodar-me. Esses sentimentos ruins e indefinidos que se redundam em tristeza e que aprendi a vê-los como sendo grãos de areia.
A tristeza é um dos muitos substantivos abstratos, dizem os gramáticos; aquilo que precisa de um ser concreto para existir. Nenhum sentimento haveria sem algo que lhe desse origem e o mantivesse. Ocorre que muitos desses sentimentos, ao se alojar em nós, podem nos matar ou nos propulsionar a grandes feitos.
Aprendi a comparar qualquer sentimento ruim a grãos de areia e que é preciso fazer deles alguma coisa. Rubem Alves dizia que as ostras, quando nesse estado de infelicidade, fazem deles pérolas.
“Ostra feliz não faz pérola”, dizia ele, a ostra, para fazer uma pérola, precisa ter dentro de si um grão de areia que a faça sofrer. Nesse estado ela diz para si mesma: “Preciso envolver essa areia pontuda que me machuca com uma esfera lisa que lhe tire as pontas…” Ostras felizes não fazem pérolas… Pessoas felizes não sentem a necessidade de criar. A ato criador, seja na ciência ou na arte, surge sempre de uma dor. Não é preciso que seja uma dor doída…Por vezes a dor aparece como aquela coceira que tem o nome de curiosidade"
Quando dia desses acordei-me, lá estava comigo um desses grãozinhos de areia; imediato, invasivo, pressuroso, dando ares de que vinha pra ficar.
Seria ousadia demais da minha parte comparar-me a uma ostra; muitas vezes não sei que destino dar a esses grãozinhos. Mas há momentos que temos de fazer-nos fortes, envolver esses grãos com diversas substâncias como fé, coragem, esperança... e tentar fazer deles pérolas, senão eles nos matam.