"Mas só chove, chove..."
Escutou os murmurios por onde passava. Cruzou os braços em uma inútil tentativa de se esconder. Apertou o passo, abaixou a cabeça.
Risos ecoaram em sua mente.
Convenceu a si mesma de olhar para frente sem olhar para trás. O que será que estavam reparando? Seu cabelo que fugia a regra de ser liso, suasunhas descuidadas, seus braços roliços, suas espinhas, a roupa fora de moda, o corpo não malhado... havia tantas coisas que a intimidava no convívio social que acabou desistindo de fazer novas amizades e deixar-se cativar por alguém. Não teriam coragem de amá-la de qualquer forma.
Findou sua vida, transformou-se em adulta. Tudo aquilo que antes a deixava sã foi abandonado, como aquela última boneca deixada no canto de um quartinho qualquer, lembrada apenas por traças e outras pestes urbanas.
Seu coração pulsava apenas a dor e o sofrimento de um cotidiano monótono.
TOC-TOC-TOC - fazia o seu salto na calçada. Tropeçou em uma pedra e foi o suficiente para começar a escutar novamente os risos maldosos. Seus olhos se encheram de lágrimas que instanâneamente embaçaram a sua visão. Atravessou a rua ávida para se libertar; não viu - ou talvez tivesse visto - o carro que vinha em sua direção.