Fim de Ano
A decoração da árvore de Natal ficou uma bosta. As luzes do ano passado estavam quase todas queimadas. Não compramos novas. Montamos sem vontade. Apenas porque a mãe insistiu. Apenas para manter as aparências. Quando havia crianças na família todos esforçavam-se mais para fingir que tudo estava bem.
Durante o ano, divórcios, traições, desavenças entre irmãos, morte de parente próximo, gravidez indesejada, falência de órgãos, câncer, sífilis, dívidas. Mas no Natal, os adultos engoliam a raiva, as tristezas e as mágoas para que as crianças não sentissem o clima de merda e tivessem boas lembranças.
Depois que crescemos todos, isso não era mais necessário. Os velhos estão cada ano mais ranzinzas. Deveríamos agradecer a Deus de terem durado tanto e terem saúde suficiente para passar os dias resmungando, retrucando, esfregando porcarias do passado na cara um do outro e nos ligando para se meter em nossas vidas. Porém, agora eles não têm mais por que se conter diante dos filhos e usam as poucas reuniões de família para provocações e para remoer o passado.
A gente não tem mais saco para o Natal. Se algum dos irmãos fizesse um filho, talvez tivéssemos algum motivo para fingir que tudo está bem novamente.