Assim ou... nem tanto 22

SE

Os reencontros foram sempre uma versão melhorada da primeira vez. Das paixões que tive, poucas mas avassaladoras, nenhuma chegou em duração a este sentir absorvente que se apoia na emoção para continuar. Chegas sempre tarde cerca de meia hora e o ritual no meu coração é parecido. Antes, bem antes, como bem descreve Antoine de Saint ‘Exupéry no diálogo da raposa e do príncipe, já tudo em mim é ansiedade e inquietação. Mentalmente imagino-te a sair do trabalho, as despedidas, a retirada do carro da garagem. Cronometrei tudo e vejo-te a entrar na autoestrada a tempo de cumprir. Mais um pouco e estarás a meter a chave à porta, passos leves, perfume tão discreto que só beijando-te o sinto. A seguir já estou ávido, palpitante, com roupa larga e aperto-te em abraços sempre parecidos e todas as vezes diferentes. As mãos a investigar tudo, a boca a perder-se em devaneios, a certeza de que, ainda que me desses tudo de ti eu iria querer o outro lado da tua vida, do mar, da vontade. Nunca consigo saciar-me, nunca sei portar-me com serenidade. Tudo é, portanto, forte, paradoxal, emocionado e intenso. Sinto, na pessoa banal que pareces ser, a única maravilha. Sinto, nessa maravilha, o único caminho que, verdadeiramente, me importa. Numa paixão assim não cabe o futuro nem há tempo para falar do que passou. Queremos viver o presente e nada mais nos interessa. Assustei-me quando, um dia, colocaste a morte, a ausência, o nunca mais como hipótese. O que faria? Sobreviveria, por certo, até ao vazio. Sem ti o mundo não vale nem o tempo conta. Ganharia a indiferença das pedras.

Edgardo Xavier
Enviado por Edgardo Xavier em 06/12/2015
Reeditado em 06/12/2015
Código do texto: T5472071
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