AH, QUE SAUDADES DO VARRE VENTO (homenagem à atriz Marília Pera)
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AH, QUE SAUDADES DO VARRE VENTO! homenagem à atriz Marília Pera)
Ao entrar em um supermercado de Manaus, parei para ouvir notícias sobre a morte da atriz Marília Pera, pela TV. Depois segui e entrei na fila para comprar presunto, queijo e, em outra fila, para comprar um peixe de cativeiro. Olhando-os tão pequenos sobre uma área fria de gelo, senti saudades do meu Varre Vento, que o deixei para estudar em Manaus aos 8 anos de idade. A comunidade ficou gravada em mim como se fosse uma tatuagem. Enquanto esperava para recebê-lo tratado, conversei com uma senhora de idade, que me disse que perdera sua filha para o lupos, professor da Ufam e seria muito inteligente, mas morrera nova, deixando-lhe um neto para criar. Tirou o celular da bolsa o atendeu e me mostrou a foto do neto que sua filha deixara para ser criado por ela. Era fofura” em seus braços.. Fiquei pensando com meus botões: como a vida é uma sucessão de “vida e morte” que nunca vai parar; una morrem; outros nascem e a vida continua. Por isso na aula de filosofia na Ufam, o professor Nélson me disse que o homem era um ser angustiado porque se reconhece mortal e caminha sempre rumo ao encontro da morte. Algumas vezes ela vem cedo demais. Outras, permite que e ultrapassando a casa dos 70 anos, como foi o caso da atriz global, que faleceu de câncer.
A senhora da fila com quem conversava me dizia que os peixes estavam muito pequenos e lembrei do meu Varre Vento. Contei à senhora que meu pai Paulo Costa, pegava tambaqui no lago de mais de 40 quilos de peso, até o final dos anos 70. Imediatamente recordei, também, que a criação de peixe em cativeiro no Amazonas e no Brasil começou com discursos inflamados no Congresso Nacional, do advogado e senador amazonense Evandro Carreira, no final dos anos 70 e início dos anos 80. Ele afirmava época, que a fartura de pescado no Estado desapareceria com a pesca precatória e os conflitos entre armadores com grandes embarcações os moradores das comunidades. Evandro Carreira estava certo, mas foi quase execrado pelos seus pares de outros Estados. “Como o peixe dos rios acabará?” se perguntavam em tom ironia, descrença e um pouco de deboche.
Também recordei de meus 7 anos de idade, caminhando com meu corpo ainda em formação com pai, Paulo Costa, rumo ao lago, para ele revisar espinhéis e malhadeiras colocadas na água no dia anterior. Quando o acompanhava essa tarefa de colocar seus instrumentos de pesca na água, poucas vezes, o vi marcando árvores onde os tinha colocado. O espinhel recebia seringas que eram colhidas quando espocavam e caíam dos das seringueiras, nas suas pontas; as malhadeiras, tinham pedaços de chumbos para afundarem e ficavam retas. Durante as revisões, meu pai, com todo silêncio, passava a pá do remo sobre os locais diferentes, suspendia-os e dizia alegre “aqui tem um peixe grande”; em outros, com tristeza, “nesse não tem nada”. Mesmo onde não existindo nenhum tipo demarcação, sempre acertava todos os lugares. Será que tinha o GPS em sua cabeça, na época em que nem se falava em GPS? Não! Era instinto, conhecimento no que fazia e sabedoria de cabocla mesmo, de quem nasceu e viveu a vida entre a pesca e à lavoura. Na fila, contei à mulher tudo e ela me disse que possuía um sítio e que hoje tudo tem que ser trancado porque existem muitos ladrões, drogas e roubos. “Esse passado era gostoso porque não tinha nada disso”, disse-me com saudosismo em suas palavras.
Vez ou outra, o cachorro “Téu” que sacudia o rabo sempre que meu pai pegava o terçado, colocava o chapéu na cabeça, entrava na canoa se colocava no meio dela, se equilibrando para não cair na água. Eu, na popa servia de compra peso com meu corpo de idade e pouco peso. Fui desfiando histórias e memórias durante a espera até que chegou meu peixe tratado chegou. Ele tinha pouco mais de 2 quilos e não era como os que meu pai pegava feliz na comunidade, em qualidade e peso. A senhora recebeu o peixe dela antes do meu e seguiu para a área da carne. Depois, não a vi mais.
Tristemente fiquei pensando na notícia da morte da atriz Marília Pera e na não morte de minhas saudades sempre que lembro do meu Varre Vento, comunidade no município de Itacoatiara. Será que ainda verei o lugar que me causa tanta recordação? Talvez, mas não tenho certeza porque deixei a comunidade para estudar em Manaus aos 8 anos de idade, mas a comunidade não me deixou e me acompanha até hoje como se fosse uma tatuagem gravada em meu peito. Ah, que saudades sinto do meu Varre Vento que não me abandona. Dizem que nada mais é igual porque também foi atingido pelo fenômeno das terras caídas, mas quero voltar, mesmo que seja para matar em mim essas lembranças e torná-las só mais uma estrela brilhando no céu, como se tornou Marília Pera.